O Globo
Os juros subiram aqui e nos Estados Unidos.
E vão continuar subindo. Nos dois países, as taxas foram elevadas não por causa
da guerra, mas para combater a inflação que já estava alta, antes de o primeiro
tanque russo tomar a estrada para Kiev. Contudo, aqui e lá a pressão
inflacionária e o cenário econômico pioram muito com a guerra. O Fed deixou
claro que este é o início do ciclo que pode incluir mais outras seis elevações
com movimentos mais fortes do que o 0,25 ponto percentual aprovado desta vez. O
Copom subiu a taxa em um ponto percentual, avisou de uma próxima alta da mesma
magnitude e alertou que tudo piorou na economia internacional.
Há diferenças importantes. O Brasil está estagnado, e os Estados Unidos, crescendo. O Brasil tem alto desemprego e os Estados Unidos estão com o mercado de trabalho aquecido. Tanto que esse foi um dos motivos alegados pelo próprio presidente do Fed, Jerome Powell, para elevar os juros. Lá a taxa estava próxima de zero, e aqui já subiu muito e agora foi para 11,75%. Para um país, como o Brasil, cuja previsão de crescimento não passa de meio por cento é uma enormidade.
O Banco Central justificou a alta dos juros
explicando que o ambiente externo “se deteriorou substancialmente”, as
condições financeiras pioraram e aumentou a incerteza. A guerra da Ucrânia,
segundo o BC, produziu um “choque de oferta” que tem “o potencial de exacerbar
as pressões inflacionárias”.
O presidente do Fed, Jerome Powell, disse
que a incerteza geopolítica coloca uma pressão a mais na inflação de curto
prazo. O Fed elevou sua projeção de inflação para 4,1% a 4,7%. Mas no ano
passado foi de 7%. O cenário de juros subindo nos Estados Unidos movimenta todo
o fluxo de capitais e isso pode produzir uma alta do dólar aqui. Os próximos
dias serão fundamentais para se entender a leitura dos mercados sobre a mudança
da política monetária americana, em sua primeira alta desde 2018. O dólar caiu
no começo do ano, mas isso está mudando. Mesmo com a alta dos preços das
commodities, a valorização do real não deve se sustentar nos próximos meses,
porque o ano é de muita instabilidade política e da política econômica.
Os últimos dias foram ilustrativos da
confusão que é o processo decisório na área econômica a partir do reajuste da
gasolina. O presidente Bolsonaro está claramente criando constrangimentos
públicos para que o presidente da Petrobras, general que ele mesmo nomeou,
deixe o cargo. É uma encenação eleitoreira. Com isso Bolsonaro quer dar a
impressão de que está ao lado do consumidor, seja o dono de carro da classe
média, seja o caminhoneiro. E assim tenta se descolar da impopularidade que a
alta dos preços dos combustíveis provoca.
O ministro das Minas e Energia, Bento
Albuquerque, na entrevista que concedeu a Manoel Ventura, foi bem claro ao
explicar a dinâmica dos preços, confirmando o risco de desabastecimento. “Hoje,
41% (dos derivados) são produção de outros ou são importação. Se o indivíduo
comprar por 10 e a Petrobras estiver vendendo por cinco, ele vai trazer para o
mercado aqui? Não. Então é um risco.”
Há um bate cabeça também em torno do
subsídio à gasolina e ao diesel. Já foram dados R$ 20 bilhões na eliminação do
PIS/Cofins do diesel, GLP e querosene de aviação. Bolsonaro quer que seja feito
o mesmo com a gasolina, o que seria outro gasto de R$ 27 bilhões. Para o
governo é uma perda de receita exorbitante, para o consumidor faria pouca
diferença.
A preocupação de Bolsonaro se concentra no
posto de gasolina, mas a do consumidor é também com o supermercado e a padaria.
As cadeias do trigo, do milho e da carne já estão sentindo o efeito da alta das
cotações e a dúvida sobre a oferta dos produtos. O preço dos fertilizantes está
contaminando os custos da safra que nem foi plantada ainda. A energia terá
reajustes fortes este ano, mesmo com o fim da bandeira de escassez hídrica que
derrubará o índice de inflação em maio. O empréstimo que as distribuidoras
estão pegando será pago por todos nós, a partir do ano que vem. E como os juros
estão subindo, o custo será alto.
A situação econômica ficou ainda mais
desfavorável à reeleição do presidente. Bolsonaro fará tudo o que puder para
tentar mudar o jogo. Ele tem a máquina, ele tem o cofre, ele tem uma equipe
econômica submissa. O Banco Central sabe disso. Tanto que alertou contra o
risco fiscal presente e futuro.
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