Pacote de Haddad não resolve questão fiscal
O Globo
Governo mostrou preocupação com déficit,
mas ainda precisa apresentar arcabouço para controle do gasto
O primeiro pacote de ajuste fiscal do
ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve pontos positivos e outros nem tanto.
Ele acerta ao evidenciar que está preocupado com o déficit público, mas erra ao
dar mais ênfase ao aumento de receita do que ao corte de despesas. Em resumo,
não exime o governo de apresentar um robusto arcabouço para controlar o gasto
público.
O governo começa com a difícil tarefa de fazer um ajuste fiscal. As despesas da União têm ficado acima das receitas, e a consequência disso é o aumento do endividamento e a elevação das taxas de juros, o que encarece o crédito e os investimentos do setor privado e segura o crescimento da economia. Reverter essa situação é urgente.
Duas medidas apresentadas por Haddad
merecem destaque positivo por serem duradouras. A primeira é a extinção do
aproveitamento do ICMS nos créditos de impostos federais, uma regra que não
fazia sentido. Em 2023, essa medida deverá render aos cofres públicos uma
receita de aproximadamente R$ 30 bilhões. Num ano cheio, pode chegar a R$ 60
bilhões. A segunda é a promessa de reoneração do PIS/Cofins sobre combustíveis
a partir de março, limitando parcialmente uma isenção descabida. Se confirmada,
a volta da cobrança do PIS/Cofins deverá render R$ 25 bilhões neste ano, valor
que subirá para R$ 32 bilhões em 2024. Tudo somado, o pacote deverá resultar
num ganho perene de receita de R$ 92 bilhões em um ano cheio.
As mudanças no Conselho de Administração de
Recursos Fiscais (Carf), que julga disputas tributárias, estão em outra
categoria. Algumas são questionáveis e outras têm efeito incerto ou temporário.
Foi anunciado o fim do desempate a favor dos contribuintes no Carf. Quando
houver igualdade de votos nas decisões, o Fisco terá sempre razão, uma regra
que deverá gerar contestação na Justiça.
Pelo que foi anunciado na quinta-feira, o
governo também criará o Programa Litígio Zero, numa tentativa de destravar, com
descontos sobre débitos, parte dos cerca de R$ 1 trilhão parados no Carf. É
difícil estimar o grau de adesão ao novo programa. Seus possíveis efeitos
deverão se restringir ao curto prazo.
Nos cálculos mais otimistas do governo, o
pacote levará a um aumento de receita neste ano de R$ 192,7 bilhões. Somando
tímidos planos de cortes de gastos de R$ 50 bilhões, o impacto total, ainda
segundo o governo, poderá ser de R$ 242,7 bilhões. Caso esses números se
confirmem, o déficit de R$ 231,5 bilhões previsto para 2023 se transformará em
superávit de R$ 11 bilhões.
Embora o mercado tenha demonstrado
aprovação ao pacote, poucos acreditam nas previsões mais exuberantes. Um
déficit de R$ 100 bilhões neste ano é uma aposta mais realista. Seria um
avanço, mas continuaria exigindo um ajuste fiscal gigantesco para estabilizar a
dívida pública até o fim de Lula 3.
Ainda se espera que o presidente Luiz
Inácio Lula da Silva apresente uma nova regra para conter o gasto. Quanto antes
seguir por esse caminho, melhor. Sem demonstrações concretas de
responsabilidade fiscal, é pouco provável que os juros entrem em tendência de
queda.
É avanço aumento da fatia de energia
renovável nos EUA
O Globo
Fontes limpas respondem por 22% da
eletricidade no país, o maior responsável pelo aquecimento global
A estimativa do volume de gases do efeito
estufa emitidos pelos Estados Unidos no ano passado, embora tenha indicado um
crescimento (1,3%), mostrou alguns avanços. Pela primeira vez em 60 anos,
fontes limpas e renováveis de energia — solar, eólica e gerada por meio de
hidrelétricas — produziram 22% da eletricidade consumida no país, mais que os
20% fornecidos por usinas de carvão mineral, as mais poluidoras. Como os
Estados Unidos são os maiores responsáveis pela elevação da temperatura média
do planeta, o que acontece lá desperta o interesse planetário.
Ao assumir a Casa Branca, em 2021, Joe
Biden se comprometeu a acelerar a conversão na produção de energia na maior
economia do mundo e estabeleceu como meta para 2030 emissões abaixo dos níveis
de 2005. Para isso enviou ao Congresso um pacote de medidas, entre elas a
destinação de US$ 369 bilhões para projetos que reduzam a contribuição do país
para o efeito estufa. Encontrou resistências no próprio partido, o Democrata,
de políticos eleitos em estados em que há minas de carvão. Depois de intensa
negociação e algumas concessões, o pacote foi aprovado no ano passado.
Apesar do avanço, está claro que os Estados
Unidos terão de fazer muito mais. Nesses dois anos que restam do mandato de
Biden, espera-se uma aproximação entre a Casa Branca e o governo de Luiz Inácio
Lula da Silva, com Marina Silva de volta ao Ministério do Meio Ambiente. Apoio
internacional na área tecnológica e, principalmente, na financeira precisará
estar na agenda bilateral para o enfrentamento da questão do clima.
No Brasil, um dos dez maiores emissores de
carbono, o grande problema está no desmatamento. Por esse motivo, é urgente
combater a ação de madeireiros, grileiros e garimpeiros ilegais, que elevaram o
ritmo da devastação na Amazônia nos últimos quatro anos.
As emissões em todo o planeta são afetadas
pela economia. Quando a renda fica mais alta e há mais consumo e mais carros
nas ruas, elas aumentam. Em tempos mais difíceis, o ritmo de crescimento dos
gases na atmosfera tende a cair. Como a previsão é que parte do mundo entrará
em recessão neste ano, a tendência deveria ser positiva para o meio ambiente.
Mas há outros fatores em ação. A invasão da Ucrânia pela Rússia interrompeu o
fornecimento de gás para a Europa e elevou o uso do carvão em vários países. Independentemente
de questões conjunturais, os desafios para amenizar o aquecimento global são
gigantes.
O período de 2014 a 2022 foi o mais quente da História, de acordo com o Serviço de Aquecimento Global Copernicus, da União Europeia. Em 2022, as temperaturas estiveram 1,2 °C acima da média de 1850 a 1900. A meta acordada em Paris para 2100 é ficar abaixo de 2 °C, de preferência, em 1,5 °C. É preciso fazer muito para atingir esses objetivos.
Golpismo no armário
Folha de S. Paulo
São necessárias mais investigações para
avaliar gravidade de texto bolsonarista
Que Jair Bolsonaro (PL) buscou meios de
atacar as instituições e deslegitimar o processo eleitoral é fato há muito
comprovado por suas incessantes investidas, desprovidas de qualquer fundamento,
contra as urnas eletrônicas.
Ainda assim, não deixa de ser assustador
tomar conhecimento do tipo de ideia alucinada que circulou nos corredores do
bolsonarismo —como se faz agora com a descoberta de uma minuta de decreto
presidencial guardada em um armário da residência de Anderson Torres,
ex-ministro da Justiça de fidelidade canina ao chefe.
O texto de três páginas, de procedência
ainda a ser esclarecida, trata de providências absurdas que,
compreensivelmente, não foram levadas adiante nem consideradas em público.
Trata-se do roteiro de um golpe canhestro, que só poderia prosperar num cenário
de degradação institucional felizmente impensável no Brasil.
Começa-se com
a decretação de estado de defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral,
o que corresponderia a emprego totalmente descabido de um instrumento previsto
na Constituição para situações extremas que ameacem a ordem pública ou a paz
social.
A medida tresloucada teria o propósito de
"garantir a preservação ou o pronto restabelecimento da lisura e correção
do processo eleitoral presidencial do ano de 2022". Uma tal Comissão de
Regularidade Eleitoral, repleta de militares, seria encarregada de apurar a
legalidade do pleito —sabe-se lá com que meios e hipóteses de trabalho.
Como apontam especialistas, restam
elementos a serem reunidos para que se possa avaliar a gravidade jurídica do
achado. Anderson Torres já deu a
entender que a minuta foi apresentada por terceira pessoa e declarou que o
texto seria destruído, o que constitui uma linha de defesa óbvia
para não ser acusado de ter tramado um golpe.
Quem aventou a estultice autoritária e o
quanto ela chegou a ser debatida no governo são questões fundamentais a pôr a
limpo.
Torres, que se tornou secretário de
Segurança Pública do Distrito Federal, foi exonerado e teve a prisão preventiva
decretada, em decisão draconiana e sujeita a questionamentos, sob suspeita de
omissão dolosa no ataque de extremistas às sedes dos três Poderes, no domingo
passado (8).
No curto prazo, sua situação parece
dificílima; ainda é
incerto, porém, o futuro das investigações.
Quanto a Bolsonaro, o que o ex-presidente já fez à vista de todos, como
espalhar lorotas sobre as urnas eletrônicas perante embaixadores, é escandaloso
o bastante para justificar mais averiguação por parte das autoridades.
Americanas em queda
Folha de S. Paulo
Rombo bilionário em uma das maiores varejistas
do país precisa ser esclarecido
Com o comunicado ao mercado de que foram
encontradas inconsistências —palavra que pode se revelar um eufemismo—
contábeis de incríveis R$ 20 bilhões no balanço, as ações da
varejista Americanas caíram 77% em um único dia.
A quantia é assombrosa ante o patrimônio
líquido, de cerca de R$ 14,7 bilhões em setembro. Embora esclarecimentos feitos
até agora indiquem que não haverá impacto relevante do ajuste contábil no fluxo
de caixa, há outros riscos.
Além do dano na imagem, a crise pode levar
ao rompimento de clausulas de endividamento, redução de novos financiamentos
por fornecedores e exigência de ação rápida por parte dos bancos.
Negociar vencimentos com credores,
minimizar a necessidade de recursos de curto prazo e até aumentar o capital
estão no cardápio de medidas de contenção. Em situações desse tipo, sobretudo
quando há viabilidade e solvência da empresa, a tendência dos bancos é rolar os
empréstimos.
O episódio ainda é cercado de sombras. O
CEO da empresa, Sergio Rial, ex-presidente do Santander, que ficou apenas 10
dias no cargo, renunciou no
momento da revelação do rombo. Não se sabe como a nova gestão
identificou em tão pouco tempo o problema, ainda de dimensão imprecisa.
Tampouco está claro desde quando se processa tal conduta contábil —o prazo pode
chegar a anos.
De certo, até agora, apenas o dano para a
companhia, que já vinha sofrendo com alto endividamento e margens apertadas num
setor competitivo e em contexto de juros e inadimplência elevados que limitam o
dinamismo do varejo.
A forma do anúncio e a conferência com
investidores, fechada ao público, suscitaram críticas. Transparência é
requisito básico para restaurar credibilidade. Cabe às autoridades, como a
Comissão de Valores Mobiliários, que regula o mercado de capitais, investigar e
punir eventual má conduta.
Além de compreender como um desvio dessa
dimensão foi possível, é necessário avaliar as responsabilidades do corpo
executivo e dos auditores renomados que tinham o dever de identificar o
problema.
Ademais, a partir das movimentações com o
papel nos dias que antecederam o anúncio, aventa-se o uso de informações
privilegiadas —o que suscita análises da CVM.
Pode ser difícil reunir evidências claras
nesse caso, mas é fundamental que haja amplo escrutínio das transações e, se
necessário, punições firmes que não se limitem apenas a multas simbólicas.
Um plano tímido e frágil
O Estado de S. Paulo
A economia de gastos do pacote de Haddad é
tímida, diante do tamanho do rombo, e fantasiosa, diante das dificuldades de um
corte tão significativo em despesas discricionárias
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad,
lançou nesta semana o primeiro pacote de medidas de ajuste fiscal do mandato de
Luiz Inácio Lula da Silva. Para reduzir o rombo de R$ 231,55 bilhões projetado
para este ano, ele aposta em um conjunto de ações que incluem a reversão de
desonerações, medidas extraordinárias que podem impulsionar a arrecadação,
reestimativa de receitas, renegociação de dívidas tributárias e revisão de
gastos públicos. Se cada ação anunciada funcionar plenamente, o governo teria
condições de encerrar 2023 com um superávit de R$ 11,13 bilhões, feito muito
improvável, como reconhecido até mesmo por Haddad. “Sabemos que a meta de cada
ação não será atingida”, disse o ministro, citando que seu objetivo é reduzir o
déficit para até R$ 100 bilhões.
Ao admitir publicamente que não acredita no
resultado prometido, Haddad contrasta com seu antecessor no cargo. A trajetória
de Paulo Guedes foi a contínua reverberação de projeções macroeconômicas
completamente descoladas da realidade. Realismo nunca é negativo. No entanto,
ao reconhecer que seus números são muito otimistas, Haddad só destaca a
ausência de medidas de impacto em seu primeiro pacote, notadamente a âncora
fiscal que deverá substituir o teto de gastos.
Era nítida a intenção do ministro ao apresentar
um plano antes mesmo de o governo completar duas semanas. Ele foi vencido no
primeiro embate envolvendo responsabilidade fiscal, tendo de engolir a
prorrogação da desoneração dos combustíveis. Ao fazer o anúncio ao lado das
ministras do Planejamento, Simone Tebet, e da Gestão, Esther Dweck, Haddad
tenta demonstrar força e coesão na ala econômica. A entrega formal do conjunto
de medidas a Lula e ao ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, não deixa de
ser emblemática, sobretudo quando se considera que a Esplanada dos Ministérios
e as sedes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário foram atacadas por
golpistas dias antes.
Mas é preciso ir além de gestos simbólicos
e mostrar compromisso firme com a responsabilidade fiscal. E isso,
lamentavelmente, não foi devidamente contemplado no plano de Haddad. No lado
das receitas, há inúmeros obstáculos: questões burocráticas envolvendo
anterioridade e noventena para alguns impostos; muito lobby contrário no
Congresso, que precisa dar aval a algumas das medidas; e preocupações a
respeito do impacto da reoneração da gasolina na popularidade do governo.
Sob Bolsonaro, especialmente nos últimos
meses, o País abriu mão de receitas relevantes, que precisam ser resgatadas, e
ampliou gastos eleitoreiros, que devem ser cortados, mas o buraco do Orçamento
precede a campanha de 2022. A despeito de um superávit pontual no ano passado,
proporcionado pelo calote nos precatórios, o Brasil registra déficits primários
desde 2014, fruto do desequilíbrio estrutural entre receitas e despesas – daí a
importância do teto de gastos, não como mecanismo de reversão imediata desse
resultado, mas pelas expectativas que a âncora fiscal sinalizava sobre o
futuro.
É evidente que o governo precisa recuperar
receitas, mas o verdadeiro ajuste de que o País necessita está no lado das
despesas. Nesse sentido, a projeção de corte de gastos do pacote de Haddad, de
R$ 50 bilhões, consegue, ao mesmo tempo, ser tímida, para quem vê de fora e
considera o tamanho do buraco, e fantasiosa, para quem vê de dentro e sabe que
um corte tão significativo quanto este nas despesas discricionárias não é nem
um pouco crível. Tal meta não será alcançada sem que haja aprovação de reformas
e revisão de gastos obrigatórios.
Aproveitando a carta que o Banco Central
(BC) enviou ao Ministério da Fazenda justificando o estouro da meta de inflação
de 2022, Haddad disse que seu plano deveria ser encarado da mesma forma: como
uma carta ao Banco Central mostrando a disposição do Executivo em alinhar
política fiscal e monetária. Mas, se deseja conquistar a confiança dos
investidores no governo e encorajar o BC a começar a cortar a taxa básica de
juros, o ministro terá de se esforçar bem mais.l
A universidade a serviço do País
O Estado de S. Paulo.
Criação de instituto de pesquisas para
combater a fome, sob coordenação da USP e com financiamento do CNPQ, mostra que
a academia tem muito a contribuir para desafios nacionais
Há quem acuse as universidades brasileiras
de certo alheamento em relação aos problemas nacionais, como se a academia,
apesar de reunir pessoal especializado e capaz de oferecer soluções, ficasse
confinada em seu próprio mundo e, portanto, estivesse desvinculada das questões
que mais afligem o País. Certamente tal percepção pode encontrar, na vasta e diversificada
rede de ensino superior espalhada por todo o território nacional, exemplos aqui
e ali que a confirmem. No entanto, basta um olhar atento para reparar uma
incrível quantidade de pesquisadores dedicados a buscar e fornecer respostas
para alguns dos principais desafios do Brasil.
Uma firme demonstração desse compromisso
está para ganhar corpo na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São
Paulo (USP). Como noticiou o Jornal da USP, a faculdade vai coordenar um novo
Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) concebido para conduzir
pesquisas sobre o combate à fome. A iniciativa não poderia ser mais oportuna,
considerando o agravamento da tragédia da fome nos últimos anos − no rastro não
só da pandemia de covid-19 e da guerra na Ucrânia, mas da inoperância do
governo Jair Bolsonaro, que desmontou a rede de segurança alimentar.
Como destacado neste espaço, o Brasil
voltou a integrar o mapa da fome da Organização das Nações Unidas (ONU), uma
situação vergonhosa e inaceitável para um país que é líder na produção
agropecuária (País decente não tem fome, 8/7/2022). Do desespero de quem não
tem o que comer, recentemente simbolizado pelo menino de 10 anos que ligou para
a Polícia Militar em razão da falta de alimentos em casa, ao aumento da hospitalização
de bebês com desnutrição, a fome é um desafio complexo e multifacetado, cuja
devida compreensão só tem a colaborar para o desenho de políticas públicas.
A iniciativa coordenada pela USP terá
caráter interdisciplinar e reunirá pesquisadores de pelo menos outras 15
universidades brasileiras e estrangeiras. Entre elas, a Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp), a Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) e a
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), além da Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (Embrapa). A participação de universidades da China,
Canadá, Reino Unido e Portugal agrega novos olhares. “Há um aumento global da
fome e da desnutrição”, disse a professora Dirce Maria Lobo Marchioni,
coordenadora do instituto.
O direito humano à alimentação requer a
articulação de atores diversos em frentes variadas. Ao provocar o fechamento de
escolas, por exemplo, a pandemia escancarou a relevância da merenda escolar
para a segurança alimentar. De fato, a merenda constitui a principal ou mesmo a
única refeição do dia de muitas crianças. Uma das promessas de campanha do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi reajustar o valor dos repasses
federais. A comida servida aos alunos é também fator de estímulo à produção
rural, ainda mais com a exigência de que parte dos alimentos seja adquirida de
pequenos agricultores.
O novo INCT de Combate à Fome foi um dos 58
institutos contemplados em dezembro pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPQ), que planeja investir cerca de R$ 324 milhões
nessa rede de pesquisa de excelência. O foco dela será estudar “grandes
desafios nacionais”, como agricultura de baixo carbono, saúde, desigualdades e
violência de gênero e inteligência artificial. Espalhados por todo o País, os
novos institutos têm como objetivo fomentar a inovação e a pesquisa científica
e tecnológica nas cinco grandes regiões brasileiras.
Não há desenvolvimento sem investimento na
ciência e no trabalho de pesquisadores. O Brasil tem larga experiência dessa
realidade; por exemplo, no agronegócio, com a contribuição decisiva da Embrapa;
na exploração de petróleo, com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ);
e na indústria aeronáutica, com o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). É
um jogo de ganha-ganha: sempre que o País e a academia andam juntos, a
sociedade avança.
O mapa do ódio à imprensa
O Estado de S. Paulo.
Site reúne informações sobre agressões a
jornalistas no Brasil, retrato da crise democrática
Em boa hora, o Brasil acaba de ganhar um
site que mapeia informações sobre casos de violência contra profissionais da imprensa
no País. A nova plataforma (obcom.net.br) dá acesso a dados publicados
anualmente pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Até o momento, são
926 casos documentados desde 1982, com os nomes das vítimas e dos agressores
(quando identificados), a data, o local, o veículo de comunicação e um resumo
da agressão.
Resultado de parceria entre a Fenaj, o
grupo de pesquisa Com+ e o Observatório de Comunicação, Liberdade de Expressão
e Censura (Obcom) da Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo
(USP), o novo site chama a atenção para um tipo de violência que não se limita
a causar sofrimento e dor aos profissionais atacados. Quem agride jornalistas,
seja por meio da intimidação, de ofensas ou da força bruta, tenta privar a
sociedade do direito fundamental à informação. É disso que se trata, sobretudo
nestes tempos de desinformação desenfreada, quando a imprensa profissional, com
o rigor da sua apuração, representa uma barreira à propagação de mentiras.
Governos e grupos autoritários têm horror à
imprensa livre e se empenham em criar um ambiente hostil que abre caminho para
agressões. Não é de estranhar, portanto, que os casos de violência tenham
aumentado no recém-encerrado governo de Jair Bolsonaro. Como informou o Jornal
da USP, em 2018, último ano do governo de Michel Temer, foram 100 registros,
número que subiu para 183 em 2019 e para 302 em 2020 (em 2021, foram 150, queda
que os autores creditam à subnotificação). Vale lembrar que o próprio Bolsonaro
ameaçou dar uma “porrada” num jornalista, ofendeu uma repórter com insinuação
de caráter sexual e se esforçou para ampliar a hostilidade dos seus seguidores
em relação à imprensa. Foi nesse clima que o fotógrafo Dida Sampaio, do
Estadão, foi agredido por bolsonaristas enquanto registrava uma manifestação
diante do Palácio do Planalto.
Mas a violência contra profissionais da
imprensa não é exclusividade da extrema direita. Como informa o Jornal da USP,
o número de casos aumentou em 2013, em meio aos protestos contra o aumento das
passagens de ônibus. Em 2018, profissionais que cobriam a prisão do petista
Luiz Inácio Lula da Silva foram agredidos ou ameaçados por seus apoiadores na
frente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
O mapeamento revelou ainda uma proporção
maior de relatos de violência nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, além
do Distrito Federal, onde atuam profissionais dos principais grupos de
comunicação do País. Para a professora Elizabeth Saad, uma das responsáveis
pela nova plataforma, esse dado reflete a realidade de quem trabalha longe dos
grandes centros urbanos − e teme as consequências de denunciar uma agressão.
Uma lástima.
Que a imprensa desperte contrariedades e
desagrade aos mais variados lados é natural − sinal de que está cumprindo sua
primordial tarefa de ser fiel aos fatos. Críticas, claro, fazem parte e dão
vida à democracia. Agressões não.
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