Valor Econômico
Cargo de articulador político do Planalto
está longe de ser um emprego confortável
Vem do processo cinematográfico a frase
segundo a qual uma foto não representa o todo do filme. Afinal, o cérebro
humano é incapaz de processar várias imagens como fotografias independentes,
quando elas são transmitidas em alta velocidade. Sequenciados, os quadros, ou
“frames”, provocam uma sensação de movimento. Ao fixar-se apenas em um dos
fotogramas, o público pode ser levado a um erro de avaliação.
É o que ocorre quando se analisa,
individualmente, as fotografias divulgadas nas redes sociais na quinta-feira
(22) à noite pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) após encontro com
líderes partidários e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Lula aparece ladeado por Lira e pelo ministro
de Relações Institucionais, Alexandre Padilha. Fernando Haddad, ministro da
Fazenda, também ocupa o primeiro plano. Mais distante, aparece o ministro da
Casa Civil, Rui Costa.
Mas são as fotos, não o filme. Hoje, Rui Costa é o interlocutor preferencial de Lira. E o sucesso da agenda do governo depende dessa relação, embora a função estivesse fora dos planos do ministro.
Antes mesmo de tomar posse, Costa chamava
atenção quando participava de eventos públicos ao adotar uma postura muito mais
de gestor do que de articulador político. À época, ainda se especulava se o
baiano iria para a Casa Civil ou outra pasta na área de infraestrutura.
Já era dado como certo que ele tentaria
implementar na administração federal algumas das iniciativas que desenvolveu
quando governou o Estado da Bahia, como parcerias público-privadas (PPPs). Ele
demonstrava convicção que a Casa Civil, centro gestor do governo, desenvolveria
melhor seu trabalho se não entrasse diretamente na articulação política.
Dificuldades no diálogo entre Lira e Padilha
forçaram uma calibragem na rota. Na segunda-feira (26), por exemplo, Costa
anunciou que o Executivo ainda estava dialogando para encontrar “alternativas”
sobre como recompor os R$ 5,6 bilhões que foram reduzidos das emendas de
comissão quando Lula vetou trechos da Lei Orçamentária Anual (LOA). O corte era
um dos focos de insatisfação da Câmara com os articuladores políticos do
governo.
Alegava-se, no Congresso, que o titular da
SRI não estaria cumprindo acordos. De fato, mudanças no primeiro escalão do
governo levaram mais tempo do que integrantes do Centrão esperavam. O mesmo
ocorreu com nomeações para a cúpula da Caixa Econômica Federal e acontece,
ainda, com a ocupação de postos na Fundação Nacional da Saúde (Funasa). No
entanto, o ritmo de atendimento dessas demandas sempre depende sobretudo do
sinal verde do próprio chefe do Executivo, e não apenas de um ou outro
ministro. Pode-se concluir que o desgaste de Padilha ocorria à medida que ele
cumpria missões para as quais fora designado pelo presidente.
Em seu livro “O pior emprego do mundo”, o
jornalista Thomas Traumann intitula o cargo de ministro da Fazenda do Brasil
como o mais encrencado ofício do planeta. Isso porque o chefe da equipe
econômica é alvo de muita pressão e se ocupa de dezenas de indicadores,
enquanto seu superior, o presidente da República, está preocupado apenas com o
índice de sua própria popularidade. Diz o livro que “o nível de intrigas,
conspirações e invejas que cerca o ministro da Fazenda é insuperável”.
É bem possível, mas o cargo de articulador
político do Planalto está longe de ser o emprego mais confortável de Brasília.
Um antecessor de Padilha era chamado de
“garçom” no Congresso, pois só anotava os pedidos e não contribuía para aplacar
a crise que atingia o governo Dilma Rousseff (PT). Outro ex-ministro da área
relata que na sua época havia filas de deputados em seu gabinete para tentar
acelerar a liberação de emendas ao Orçamento. A crescente impositividade das
emendas mudou completamente essa dinâmica, pondera.
Diante dessas dificuldades, muitos apostavam
no fim do ano passado que haveria uma troca na Secretaria de Relações
Institucionais. Esse cargo é visto como um fusível do Palácio do Planalto que é
feito para queimar. Ou seja, o titular da pasta é alvo das críticas que aliados
gostariam de fazer diretamente ao presidente da República. Está no
contracheque.
Por outro lado, sua substituição sem um fato
gerador muito robusto sempre pode ser vista como rendição e fragilidade
política. Sobretudo se não ocorre em meio a uma ampla reforma ministerial.
Nas mesmas fotografias divulgadas por Lula na
semana passada, há outra mensagem subliminar. Ao lado do presidente, Padilha
também tem seu prestígio mantido. Tanto que ele permanece participando de
outras articulações estratégicas.
Naquela mesma quinta-feira, por exemplo,
horas antes do coquetel oferecido por Lula a aliados, o governo concordou em
cumprir o calendário de pagamento de emendas que estava previsto na Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2024 e também havia sido vetado. O acordo foi
fechado por Padilha.
Com mais protagonismo nas tratativas sobre o
Orçamento, pano de fundo dos embates do governo com o Congresso, o ministro da
Casa Civil passa a também correr o risco de tornar-se alvo de críticas. O final
desse filme ainda é desconhecido. O que se pode dizer, porém, é que a
fotografia exibe um novo momento na articulação política do Planalto.
*Fernando Exman é chefe da redação, em
Brasília.
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