Valor Econômico
Ao listar projetos cruciais ao governo que
pautou e aprovou, Lira passou recibo de um poder de barganha hoje esvaziado
Quando um integrante da linha sucessória da
Presidência da República despreza encontros com os demais presidentes de
Poderes e opta por um discurso em tom descalibrado para a plateia, é
fragilidade que exibe.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL),
ainda passou recibo. Ao recitar tudo que a Câmara havia entregue para
viabilizar o primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PEC da
Transição, mudança no Carf, reforma tributária e redução na dedução do ICMS),
Lira mostrou a pouca tinta de sua caneta.
Noves fora a regulamentação da reforma tributária, não tem mais em suas mãos projetos fundamentais para as contas do governo. O poder de barganha se esvazia num ano em que tem pressa para arrancar suas demandas. Seja porque, em função das eleições municipais, se aproxima o prazo (abril) de vedação das transferências voluntárias da União, prejudicando a liberação de emendas, seja porque já foi dada a contagem regressiva para sua permanência na mesa diretora.
O presidente da Câmara teve seus movimentos
limitados pela aliança do governo com o Supremo Tribunal Federal. É uma equação
inversa daquela que viveu no governo Jair Bolsonaro. Custa a encontrar um meio
de driblá-la. Como Lira depende da Corte para sua sobrevivência na política,
não pode se valer da PEC das decisões monocráticas para confrontar esta
aliança.
Apelou à gratidão quando sabe que é a
correlação de forças o lubrificante das engrenagens em Brasília. Ao verbalizar
ameaças contra o Executivo sobre o que é capaz de fazer, suscita a dúvida de
que tenha assim tanta bala na agulha. Já deixou sua retórica nos anais: “Deixo,
humildemente, um importante recado: não subestimem esta mesa diretora”.
Como a segunda parte de seu discurso tratou
de desdizer a primeira (“não aprovaremos retrocessos de qualquer natureza”), o
mais provável é que Lira esteja apenas dando início à sua campanha pela
renovação da mesa diretora e pela vaga ao Senado em 2026. Mostrou-se apto a
liderar prefeitos e deputados ávidos pela liberação de suas emendas porque
precisa de ambos mas o papel amesquinha o cargo que ocupa.
O governo pouco avançou além do seu
eleitorado de outubro de 2022, melhorou a economia mas enfrenta problemas em
setores, como a segurança pública, que adubam o bolsonarismo. O Congresso, com
a quantidade de recursos públicos destinados aos fundos eleitoral e partidário
e emendas parlamentares, virou um poder concorrente na execução orçamentária.
Só parece difícil que Lira possa rivalizar com um presidente palanqueiro como
Lula num ano eleitoral.
O nó que Lula deu no governador de São Paulo,
neste fim de semana, é um exemplo. Tarcísio de Freitas, assim como Lira, deve
seu poder ao bolsonarismo, mas seu futuro político estará garantido se for
capaz de superá-lo. O riso involuntário que o governador não foi capaz de
conter ao ser cortejado pelo presidente da República no palanque de Santos é a
rendição ao poder de sedução da política.
A investida do presidente da República para
corroer o bolsonarismo pelas bases nessas eleições municipais não tem garantia
alguma de sucesso, mas Lula mostra foco e estratégia. A perseguir na costura
pelos bastidores, campo que já mostrou dominar com rara habilidade, o
presidente da Câmara preferiu subir no palanque. Hesitante entre a ameaça e a
humildade, vai ser difícil seduzir.
3 comentários:
Muito bom!
Muito bom!
Muito bom copiar comentário,rs.
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