Folha de S. Paulo
Se Bolsonaro provocou a
própria prisão, sacrifica seus interesses de longo prazo por ganho político
efêmero
Não foram poucos os que
escreveram que Jair
Bolsonaro provocou a própria prisão para extrair dividendos políticos.
Faz sentido, mas, como não sei o que vai na cabeça do ex-presidente, não
descarto a possibilidade de a domiciliar ter
vindo por mais um erro de cálculo do clã. Como Eduardo já
demonstrou, eles não excelem em matemática política.
A ordem exarada por Alexandre de Moraes está dentro das quatro linhas do Código de Processo Penal, mas o conteúdo da declaração de Jair levada aos comícios era tão pífio —basicamente um "boa tarde"— que o ministro poderia ter deixado passar sem maiores prejuízos à autoridade do STF.
Ao lançar-se no papel de
vítima, Bolsonaro teria dois ganhos principais. Reforçaria a narrativa de que
sofre perseguição política —uma ideia que, pelas pesquisas, a população está
inclinada a comprar— e atiçaria Donald Trump a
ampliar as sanções contra o Brasil.
O problema dessa visão é que
ela é míope. Não vai muito além do mês que vem. A pressão dos EUA até poderá
fazer com que o Brasil abra mais sua economia a produtos americanos, mas, a
menos que Trump despache tropas para cá, invada o Brasil e ocupe Brasília, é
perto de zero a chance de o STF não condenar Bolsonaro a uma longa pena de
prisão.
Também parece remota a
possibilidade de o Congresso aprovar uma anistia. O centrão pode ser muitas
coisas, mas não é contra a democracia, da qual tira seu sustento. E os
Bolsonaros vão deixando claro quão tóxicos eles podem ser até para aliados.
Outro risco que o capitão
reformado corre é o de esgarçar ainda mais sua relação com os ministros do STF.
A melhor saída jurídica para Jair são os médicos. Um bom relatório sugerindo
que os cuidados com saúde de que ele precisa são incompatíveis com o regime
fechado poderia fazer com que sua prisão pós-condenação fosse convertida em
domiciliar. Collor
conseguiu.
É claro que, para que isso
ocorra, ele precisará da boa vontade da corte. Estamos falando de décadas de
xilindró, não de anos. Aí, conforto faz toda a diferença.
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