quarta-feira, 25 de abril de 2012

Mais herança maldita::Eduardo Graeff


Oito anos de corporativismo triunfante e prodigalidade do governo Lula em relação aos servidores públicos acumularam tensões que ameaçam explodir no colo de Dilma Rousseff, governadores e prefeitos. As greves de policiais no Nordeste foram um sinal de alerta. A mobilização dos professores pelo piso salarial em vários estados é outro. A grita dos juízes por aumentos salariais perdeu algum fôlego por causa dos pagamentos extraordinários expostos pelo Conselho Nacional de Justiça, mas não demora a subir de tom.
Com a arrecadação de impostos correndo na frente do PIB, Lula teve folga para trocar a faixa de presidente pelo boné de líder sindical sempre que achou conveniente. O que foi o tempo todo na campanha para eleger a sucessora. No fim de 2009, ao assinar um aumento de 68% para os policiais militares de Brasília, pagos pela União, ele os estimulou a avisar os colegas de outros estados: “Olha, aqui nós conseguimos pô, vamos em frente”. Dilma faturou eleitoralmente. Mas, um ano depois, teve que botar o Exército nas ruas do Recife e Salvador para controlar policiais amotinados.
Equilibrar demandas salariais do funcionalismo e prioridades de investimento é difícil para qualquer governo. Para um governo assentado na aliança do sindicalismo estatal com a nata do atraso político, é quase impossível. Com dinheiro curto, Dilma parece condenada a tentar, em todo caso. Governadores e prefeitos fariam melhor de não esperar sentados pela próxima onda de greves dos funcionários em geral e ameaças de motim da polícia. Aqui vão três ideias para eles tentarem sair do corner.
Primeiro, parem de tratar as demandas pontualmente. Caso a caso, todas elas têm seu mérito. Quem discorda que policiais, professores, médicos etc. precisam ganhar mais? Olhando em conjunto, todas as demandas podem ter mérito, mas não necessariamente a mesma prioridade. Os altos salários de juízes e promotores podem ser merecidos, mas estão descolados da base do funcionalismo. Faz sentido subir mais o teto antes da base? O piso salarial dos policiais da maioria dos estados é baixo. Mas deve ser mais alto que o piso dos professores? Já o teto dos policiais em geral não é tão baixo. Mas por que deve ser mais alto que o das Forças Armadas? Ignorar essas perguntas deixa rolar a gangorra ascendente das isonomias e equiparações ad hoc.
Segundo, pensem menos em federalização e mais em cooperação federativa. O piso nacional dos professores é um meio errado para um fim certo. Se quisessem beneficiar realmente os professores, o Congresso Nacional e a presidente da República deveriam aumentar os repasses do Fundeb. Darem aumento de salário e mandarem a conta para os estados e municípios é uma receita de impasse ou/e um atalho para revogar a Lei de Responsabilidade Fiscal. O primeiro passo para uma verdadeira cooperação seria criar algo como um conselho nacional de política salarial, onde representantes dos três níveis de governo compartilhem informação e discutam como os problemas e iniciativas de cada um repercutem sobre os outros.
Terceiro, abram os números. Sem comparar a remuneração (“cheia”, bem entendido) das várias carreiras públicas entre si e com o setor privado, é arbitrário dizer quem está ganhando pouco, muito ou na justa medida. A Lei de Acesso à Informação está aí para ser usada. Publiquem em formato aberto os dados de salários do setor público como um todo. Um órgão como o IPEA pode fazer isso em parceria com estados e municípios.
Duvido que a base política da presidente goste destas sugestões. Mas governadores e prefeitos – e os contribuintes – precisam nadar para não se afogar na onda de demandas levantada por Lula e seus companheiros sindicalistas.

FONTE: Blog eagora.com.br

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