Desavenças entre aliados e ameaça de divisão na aliança governista fazem a presidente deixar de lado a postura de não interferência no pleito municipal e negociar diretamente com os partidos
Juliana Braga
Virou quase um mantra de interlocutores da presidente Dilma Rousseff a frase de que ela não se envolverá diretamente na campanha municipal de outubro, pelo menos até o segundo turno. A realidade, no entanto, tem sido bem diferente. Tanto nos bastidores quanto abertamente, ela se movimenta para privilegiar aliados e interesses do PT nas eleições. Além de ter mantido conversas com dirigentes de partidos da base como PMDB e PSB, Dilma inaugurou obras em cidades-chaves, como São Bernardo do Campo (SP) e Rio de Janeiro. A campanha não declarada de Dilma tem dado resultados e já conseguiu reverter, por exemplo, o impasse que o PT enfrentava em Belo Horizonte.
A preocupação em não parecer estar em campanha fez com que Dilma convocasse os ministros do Planalto e pedisse que orientassem todos os funcionários a serem cautelosos com e-mails, santinhos, qualquer manifestação que pudesse parecer militância durante o expediente. Até os ministros, que foram liberados para fazer campanha em suas regiões de interesse, só terão autorização em horário fora do trabalho.
Todo esse cuidado se deve à situação delicada de alianças com siglas importantes para a base do governo que, no âmbito municipal, não conseguiram chegar a um consenso com o PT. PMDB e PSB já brigam para garantir a vaga de parceiro preferencial em 2014 e o medo da presidente é, caso não haja acordo, que a situação de agora se repita nas eleições majoritárias e os partidos decidam lançar candidaturas próprias. Apesar de ter afirmado na última segunda-feira, após jantar no Alvorada, que trabalha para a reeleição de Dilma, Eduardo Campos (PSB) não descarta pleitear o cargo máximo do Executivo. Como a posição das peças do tabuleiro e poder de barganha dependem do resultado das urnas em outubro, Dilma mantém o discurso de que estará fora da briga até o segundo turno.
Foco nas capitais
Na prática, entretanto, a presidente tem interferido nos municípios mais estratégicos e tentado agradar aliados. Ela tem acompanhado em especial a situação de São Paulo e de Belo Horizonte. As duas cidades, a maior e a sexta do país em população, estão nas mãos de políticos não alinhados com o Planalto. Embora foque nos mineiros e cariocas, ela não se esqueceu de outras cidades.
O primeiro ato em favor de um candidato do PT foi a despedida do ex-ministro da Educação Fernando Haddad da pasta que comandava. A solenidade, no Salão Nobre do Palácio do Planalto, contou com a participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros da Esplanada — exigência da própria Dilma. Foi a primeira vez que Lula pisou no Palácio do Planalto desde que havia começado o tratamento contra o câncer na laringe. Na data da cerimônia, fez as sessões de radioterapia antes de vir a Brasília e voltou no mesmo dia para prosseguir o tratamento. Tudo para prestigiar Haddad.
Em seu discurso, a presidente esqueceu das cobranças que fez a Haddad pelas falhas do Enem e elogiou o então pré-candidato. "Nenhum de nós pode ficar onde está, tem de ir além do seu momento. Então, cumprimento Fernando Haddad, fico feliz por ele e, ao mesmo tempo, fico infeliz porque se trata de um excepcional gestor público, de um grande educador e, além disso, de um amigo querido", fez questão de destacar.
O apoio não parou aí. Dilma ofereceu o Ministério da Pesca a Marcelo Crivella (PRB), partido de Celso Russomano que, a época, liderava as pesquisas à capital paulistana. Recentemente, ela visitou uma exposição em São Paulo ao lado do ex-ministro e de Lula.
Inauguração de obras
Outro artifício utilizado por Dilma foi a inauguração de obras em municípios aliados. Nos últimos dois dias permitidos pela legislação eleitoral, a presidente correu para inaugurar obras em São Bernardo do Campo, comandada pelo petista Luiz Marinho, e no Rio de Janeiro, do aliado peemedebista Eduardo Paes. Marinho é tido como uma possibilidade para o governo de São Paulo em 2014.
Em Belo Horizonte, Dilma inaugurou obras do Anel Viário e de creches na região metropolitana. Lá, a interferência da presidente foi mais dura e contou com um pedido pessoal ao vice Michel Temer para que fosse retirada a candidatura do deputado federal Leonardo Quintão. No lugar, o partido indicou Aloísio Vasconcelos, ex-presidente da Eletrobras, para vice na chapa com o ex-ministro Patrus Ananias (PT).
Os últimos movimentos da presidente foram os dois jantares, um na segunda-feira com Eduardo Campos e Cid Gomes, do PSB, e outro na terça-feira, com petistas na residência oficial do presidente da Câmara, Marco Maia. Nos dois encontros, Dilma reforçou que não quer disputas municipais prejudicando alianças nacionais.
Campanha não declarada
Apesar de afirmar por meio de interlocutores que não participará de campanha, a presidente tem se movimentado para garantir seus interesses e os do PT
Despedida de Haddad
O evento no Palácio do Planalto em que o candidato à prefeitura de São Paulo deixou o Ministério da Educação contou com a participção de Lula e com um discurso de Dilma recheado de elogios.
Ministério para o PRB
Também na tentativa de favorecer Haddad, Dilma nomeou Marcelo Crivella (PRB) ministro da Pesca. Seu correligionário Celso Russomano era apontado como o primeiro nas pesquisas em São Paulo.
Inauguração de obras
Enquanto as conversas ainda não eram definitivas, Dilma inaugurou obras no Recife e em Fortaleza para tentar criar consenso entre PT e PSB locais. A presidente também inaugurou obras em cidades comandadas por aliados candidatos à reeleição para prestigiá-los, como São Bernardo do Campo e Rio de Janeiro.
Articulação
Nos bastidores, Dilma tem mantido conversas com aliados para costurar apoios e alianças. Nessa semana, recebeu no Alvorada o presidente nacional do
PSB, Eduardo Campos.
Passe eleitoral restrito
Os ministros da Esplanada receberam sinal positivo da presidente Dilma Rousseff para fazerem campanha em seus estados, desde que fora do horário de expediente. No mesmo estilo de campanha velada, sem pedir votos diretamente, alguns ministros também aproveitaram inaugurações de obras para se projetarem e aparecerem junto a aliados.
O único que fez campanha abertamente até agora foi o ministro do Trabalho e Emprego, Brizola Neto, na última segunda-feira. Em São Paulo para participar do Congresso Nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Brizola Neto defendeu a candidatura do deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT), o Paulinho da Força, à prefeitura da cidade. "Como a presidente Dilma liberou os ministros para trabalharem em campanhas fora do horário comercial, estou aqui, deixando de ser um pouco ministro nessa hora de almoço, para ser o vice-presidente do PDT nacional e o cabo eleitoral do Paulinho da Força Sindical", afirmou.
O deputado se licenciou da Presidência da Força Sindical e tem se dedicado à campanha. "Aqui em São Paulo existe um preconceito de que trabalhador não ganha eleição. Tenho certeza de que o Paulinho vai vencer esse preconceito", defendeu Brizola Neto.
Outros ministros aproveitaram a agenda de inaugurações para se cacifarem na eleições. O titular da Saúde, Alexandre Padilha, de olho em uma possível candidatura ao governo de São Paulo em 2014, acompanhou a presidente Dilma Rousseff nas duas últimas inaugurações de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) que foram feitas nos últimos dias permitidos pela legislação eleitoral, em São Bernardo do Campo (SP) e no Rio de Janeiro.
Em Santa Catarina, reduto eleitoral da ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, a presidente Dilma Rousseff deu início à construção da ponte da Cabeçuda para a travessia entre os lagos Imaruí e Santo Antônio dos Anjos, em Laguna. A obra, orçada em R$ 597 milhões, já havia sido questionada pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Também estavam no evento parlamentares do estado e o ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos. (JB)
Em São Paulo, existe um preconceito de que trabalhador não ganha eleição. Tenho certeza de que o Paulinho vai vencer esse preconceito" Brizola Neto, ministro do Trabalho
FONTE: CORREIO BRAZILIENSE
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