O governo desistiu da sua meta de crescimento de 4,5% para este ano. A série de pacotes de estímulos não surtiu o efeito desejado, o Banco Central reduziu a previsão de 3,5% para 2,5%, a indústria recua, o varejo fraqueja e a arrecadação federal cresce abaixo da previsão oficial.
Algumas análises culpam a insuficiência dos investimentos, que no primeiro trimestre foi de 18,7% do PIB, quando deveria ser de 25% (!). Mas reconhecem que, para atingir isso, vai levar tempo e o que se deseja é uma recuperação mais rápida da letargia econômica.
Há consenso ao reconhecer que a crise internacional vem derrubando o crescimento em todos os países, e, nesse ambiente, investir é arriscado para as empresas.
Há os que apostam que na insuficiência do investimento privado a solução é o governo federal investir mais, mas é apostar numa eficiência de gestão com sérias dificuldades para conseguir tirar as obras do papel.
Há também consenso de que o crescimento não virá pela via das exportações, pois o mercado externo está saturado e fortemente vendedor. A não ser em algumas commodities, na agricultura e pecuária é possível algum resultado, mas, mesmo assim, sem expansão significativa sobre o ano anterior. O consumo das famílias, segundo essas análises, atingiu seu limite devido ao que consideram ser excessivo o endividamento, com um quarto do orçamento doméstico comprometido com o pagamento de prestações.
Interessante notar que, sobre os juros embutidos nessas prestações, há omissão. Segundo a Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), os juros médios em abril (antes da ação do governo) foram de 107% ao ano, em maio recuaram para 105% (!) e em junho subiram para 106% (!). Bela redução. Metade das prestações são juros. Eis a razão da inadimplência e o principal freio ao crescimento.
O que fazer? A primeira coisa a reconhecer é que a economia está emperrada devido ao potente conjunto de freios que o governo ainda não removeu por medo do fantasma da inflação. São eles: Selic, juros bancários e carga tributária sobre o consumo, dos mais altos do mundo, e liquidez das mais baixas do mundo. Para remover esses freios, são necessárias medidas de curto e longo prazo.
Curto prazo. A redução dos juros (básico e bancário) e da carga tributária vai aliviar a o orçamento doméstico, bem como o custo de produção e o capital de giro da empresa. Mas isso é factível? Sim, e rápido. Se o governo decidir reduzir a Selic para 5% (não se justificam 8%) vai economizar os recursos necessários à desoneração sensível na carga tributária. Além disso, a queda da Selic reduz os ganhos de tesouraria dos bancos e, se tabelar, reduzindo as tarifas bancárias (não sei porque ainda não foi feito), vai empurrar os bancos privados na ampliação da oferta dos empréstimos, gerando a necessária concorrência bancária com, aí sim, a redução dos juros.
Não basta o Banco do Brasil e a Caixa reduzirem seus juros. É necessário seguir o conselho do economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban): "Você pode levar um cavalo até a beira do rio, mas não conseguirá obrigá-lo a beber água". Sem querer, ensinou o caminho das pedras: aperte o lucro dos bancos. Isso é que vai levar o cavalo ao rio. É bom o governo ouvir quem é do ramo.
Para ativar exportações, a medida de maior eficácia é a desvalorização cambial que pode ser alcançada sem ônus via ampliação da liquidez, à semelhança do que vêm fazendo os países desenvolvidos, que desvalorizaram suas moedas para elevar suas exportações. O câmbio, para isso, deve ser ligeiramente acima de R$ 3,00, que é o nível necessário para permitir o equilíbrio nas contas externas. Para isso, é necessário elevar a liquidez (6% do PIB) no País, que é metade da praticada na Argentina e México.
Longo prazo. Emplacar a reforma tributária, mas não nos moldes de mera simplificação do ICMS - como tem sido até hoje, e que pouco efeito teria sobre a carga tributária -, mas sim desonerar o consumo, que é supertributado, reduzindo o poder aquisitivo da população.
Isso é que faz com que quem ganha até dois salários mínimos (SM) pague 49% do que ganha em tributos e quem ganha cima de 30 SM, 26%. Essa é a trava mais difícil de ser removida, pois é secular.
Isso ocorre, principalmente, devido ao ICMS, que onera cerca da metade da tributação sobre o consumo. O ICMS é um imposto estadual e o que mais pesa na carga tributária. Para reduzi-lo, é necessário estabelecer alíquotas inferiores às atuais, especialmente para as que gravam os bens e serviços de consumo popular. É aqui que entra, especialmente, a redução nas elevadas alíquotas que incidem sobre as contas de energia elétrica e telefone.
Os Estados sempre barraram a aprovação da reforma tributária temendo perder arrecadação do ICMS, que seria alterado para ser cobrado no destino onde a mercadoria é consumida ou usada. O governo federal já informou que garantirá a compensação integral e de forma automática aos oito Estados que poderão perder com a alteração no ICMS. O governo federal deu, assim, o sinal verde. É preciso mudar o sinal vermelho dos Estados. Não há outra saída senão forte e persistente pressão da mídia sobre os governadores e o Congresso, para o processo de aprovação dessa reforma ter chance de ocorrer.
Para as empresas retomarem o poder competitivo, além da desoneração tributária e da queda dos juros (medidas de curto prazo), é fundamental a redução dos custos externos à sua porta: logística, infraestrutura e burocracia. Os dois primeiros podem melhorar em função do lento crescimento do PAC e da ação das empresas, que investem por não poder esperar pela ação governamental.
Quanto à burocracia, é possível descomplicar exigências de controle inerentes ao preenchimento e apresentação de documentação se o princípio a ser adotado na desburocratização for o de que as empresas procuram agir corretamente segundo as normas em vigor. A verificação desse cumprimento deve ser feita a posteriori, via fiscalização seletiva, que pode ser suficiente para coibir os que querem delinquir. A própria simplificação dessas normas irá facilitar seu cumprimento.
Mas se o governo continuar acreditando nos pacotes de estímulo e não remover os freios que ele próprio impôs ao desenvolvimento, dificilmente irá conseguir ultrapassar o crescimento de 2,7% registrado no ano passado. É hora, pois, de tirar o pé no freio (juros e carga tributária elevada e liquidez baixa) e deixar o País crescer. A bola está só com o governo.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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