Delação premiada de Valério gera bate-boca e punição de operador acaba
aumentando
BRASÍLIA - Os ministros do STF continuaram não se entendendo sobre o cálculo
das penas, e os bate-bocas voltaram a tomar conta do plenário ontem. A promessa
de que a dosimetria seria decidida mais rapidamente do que antes da interrupção
do julgamento não foi cumprida. A confusão foi tão grande que os ministros não
conseguiram sequer fechar o cálculo da pena de Ramon Hollerbach, ex-sócio de
Marcos Valério, o que só deverá ocorrer hoje. Com isso, terão sido necessárias
três sessões para debater as penas de um único acusado. Ainda precisam ser
calculadas a pena de outros 23 réus.
No meio da confusão, o plenário elevou ontem a pena de Valério. Antes da suspensão
do julgamento, em 25 de outubro, o operador do mensalão tinha sido condenado,
pelo relator, a sete anos e oito meses por corrupção ativa. Ontem, essa
condenação subiu para sete anos e 11 meses. Por outro lado, a pena de um dos
peculatos caiu de cinco anos, sete meses e seis dias para cinco anos, cinco
meses e dez dias. Com isso, a pena total de Valério, antes em 40 anos, um mês e
seis dias, ficou em 40 anos, dois meses e dez dias.
A mudança ocorreu por sugestão de Celso de Mello. Como a corrupção ativa foi
praticada várias vezes, o STF aplicou a regra de adotar a pena mais severa e
aumentá-la em um percentual.
Marco Aurélio Mello e o relator Joaquim Barbosa se desentenderam numa
discussão em torno da dosimetria de Valério. Marco Aurélio reagiu a uma
colocação e a risos de Barbosa.
- Cuide das palavras quando eu estiver votando. Use bem o vernáculo. Não
sorria não. A coisa é muito séria. O deboche não cabe e as adjetivações são
traiçoeiras - disse Marco Aurélio.
- Sei usar bem o vernáculo. Nada fiz além de traduzir a realidade dos autos.
Se foi condenado a 40 anos é porque se trata de um réu que cometeu sete, oito
crimes graves - reagiu o relator.
O embate continuou:
- Escute para depois retrucar. Não insinue, ministro - reagiu Marco Aurélio.
- Estou dizendo-o - prosseguiu Barbosa.
- Não admito que Vossa Excelência suponha que todos sejam salafrários e que
só Vossa Excelência seja uma vestal - disse Marco Aurélio.
Foi preciso a intervenção de Ayres Britto, para a discussão terminar. Ainda
assim, Marco Aurélio afirmou, num recado a Barbosa, ser preciso admitir a
dissidência. Pouco antes do intervalo, os dois ministros voltaram a divergir,
mas dessa vez estavam mais calmos.
No intervalo da sessão, Marco Aurélio criticou o comportamento de Barbosa:
- A beleza do colegiado é a diversidade. Não estamos aqui para ser vaquinhas
de presépio do relator: falou o relator e dizemos amém, amém, amém. A viagem à
Alemanha não fez bem a ele.
Barbosa se envolveu em outro embate, desta vez com o revisor, Ricardo
Lewandowski, ao discutir a pena de Ramon Hollerbach.
- Não me impressiona terem sido corrompidos parlamentares, um magistrado, um
policial, ou um agente público. É igualmente grave - disse o revisor.
- É o mesmo que corromper o guarda da esquina?! - perguntou, rindo, Joaquim
Barbosa.
- Não vou discutir - reagiu Lewandowski.
E voltaram a se desentender:
- O meu voto escrito tem servido para que dele se tire elementos para
rebatê-lo. Como fez o ministro Lewandowski - disse Barbosa.
- Recebi esse voto agora, há 30 minutos. Não tive nem tempo de ler.
- Vossa Excelência nunca distribuiu nada aqui.
- É inadmissível criar frases de efeito na suprema Corte. Não admito que
Vossa Excelência faça frases de efeito em detrimento da minha pessoa - retrucou
Lewandowski.
Na tentativa de acelerar o julgamento, Ayres Britto sugeriu que Barbosa
fosse breve na hora de recapitular os crimes pelos quais os réus foram
condenados. Mas Celso de Mello divergiu e sustentou que os réus têm o direito
de saber os fatores usados para calcular as penas.
- Os fatos estão tão sobejamente conhecidos que faço a sugestão da não
repetição deste fato para a dosimetria. Vossa Excelência pode se referir às
circunstâncias, mas sem minudência, detalhe, que parece repetitivo. Sabemos o
que aconteceu tintim por tintim - disse Ayres Britto.
Fonte: O Globo
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