"O
dinheiro do governo federal acabou." Essa frase, pronunciada em 1979 pelo
então ministro do Planejamento, Mário Henrique Simonsen, visando a conter a
avalanche de demandas para novos programas e projetos vindos dos ministérios
setoriais, Estados e municípios, mostra três dimensões da responsabilidade
profissional e ética de quem conduzia a política econômica do País. Não se pode
iludir a população e seduzir a classe política quanto à capacidade do governo
em financiar ilimitadamente grandes projetos de investimentos na infraestrutura
econômica e social de regiões, Estados e municípios. Não se pode ir expandindo
o endividamento público para defender os níveis de renda e de emprego sob o
risco de comprometer a confiança que os agentes econômicos depositam na gestão
macroeconômica do País. E não se pode vender ilusões à opinião pública sobre as
perspectivas de crescimento de uma nação, quando os instrumentos de intervenção
do governo se encontram sob fortes restrições operacionais internas e externas.
Na
verdade, se o governo federal mantiver a atual estrutura da política econômica,
a presidente da República colherá, como resultados do segundo biênio de seu
mandato, uma economia com inflação sob controle, embora relativamente alta para
quem aspira a um regime de estabilidade; uma taxa de crescimento inexpressiva
quando comparada aos demais países emergentes, todos submetidos à mesma
conjuntura internacional adversa; e uma população insatisfeita com a qualidade
dos serviços públicos essenciais num contexto em que os indicadores de pobreza
melhoram, ao mesmo tempo que os indicadores das desigualdades sociais se
ampliam.
Dizer
que se trabalha atualmente com um modelo de crescimento baseado na dinâmica do
mercado interno é muito controverso. No curto prazo, o mercado interno pode se
expandir pelo acesso dos mais pobres ao consumo de bens duráveis, favorecido
pelas condições de financiamento e pelas políticas sociais compensatórias. Mas,
no médio prazo, o dinamismo do mercado interno depende fundamentalmente do
tamanho da população, da produtividade total dos fatores de produção e da
distribuição da renda e da riqueza nacional. São fatores estruturais de
transformação lenta (ganhos de produtividade) ou que se esgotam depois de
eliminados obstáculos político-institucionais (exaustão do ciclo distributivo
da implantação das políticas sociais compensatórias da Constituição de 1988).
É
preciso, pois, construir um novo ciclo de expansão da economia brasileira a
partir dos fundamentos conceituais e ideológicos de uma nova política
econômica. Do ponto de vista conceitual, trata-se de encontrar o caminho de um
novo paradigma para a dinâmica de desenvolvimento sustentável da economia
brasileira, o qual, em princípio, deve estar associado à concepção e
implementação de nova onda de inovações tecnológicas e institucionais. Nesse
sentido, deve-se privilegiar o potencial de crescimento dos segmentos
produtivos que utilizam direta e indiretamente a nossa base de recursos
naturais (o complexo do agronegócio, o minero-metalúrgico-mecânico, etc.) e que
se têm destacado no cenário global pela sua inequívoca capacidade de inovar
para competir.
Do
ponto de vista ideológico, a atual administração do governo federal precisa se
conscientizar de que a economia de mercado tem seus imperativos e sua lógica
interna de acumulação e que convive adequadamente com regulamentações
localizadas setorialmente, desde que estas sejam consistentes tecnicamente,
politicamente negociadas e institucionalmente legalizadas.
Não
há como a intervenção governamental ampliar o grau de incertezas dos
empreendedores para além daquelas que são típicas da dinâmica dos próprios
mercados. O governo não pode se transformar num multiplicador de incertezas
pelo fato de não dispor de determinação política para induzir que os interesses
do velho paradigma se desestruturem a fim de que o novo paradigma possa nascer.
Professor do IBMEC/MG. Foi ministro do Planejamento,
da Fazenda no governo Itamar Franco
Nenhum comentário:
Postar um comentário