STF
derruba proposta para reduzir penas
Marco Aurélio defendeu que prisão de Valério
caísse de 40 para 11 anos; só Lewandowski o acompanhou
André de Souza, Carolina Brígido
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF)
rejeitou ontem, por sete votos a dois, uma proposta do ministro Marco Aurélio
Mello que, na prática, significaria a redução das penas aplicadas a 16 dos 25
réus condenados no processo do mensalão. Caso a tese de Marco Aurélio fosse
aceita, a pena do operador do mensalão, Marcos Valério, passaria de 40 para
menos de 11 anos de reclusão. Apenas o revisor da ação, ministro Ricardo
Lewandowski, o acompanhou. O relator e presidente da Corte, Joaquim Barbosa, e
os demais ministros preferiram manter as penas anteriormente definidas.
Na sessão de hoje, os ministros do STF devem
analisar a correção de multas aplicadas. Ainda poderão discutir se cabe ao
Supremo ou à Câmara a decisão sobre a cassação dos três parlamentares condenados
e, eventualmente, o pedido de prisão imediata.
Marco Aurélio queria que, para os crimes de
evasão de divisas, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, peculato, corrupção
ativa e corrupção passiva fosse aplicado o princípio da continuidade delitiva.
Na avaliação do ministro, com exceção do delito de formação de quadrilha, todos
os outros crimes eram da mesma espécie, uma vez que atentavam contra a
administração pública e foram cometidos com a mesma intenção, viabilizar o
esquema de corrupção levado a cabo pela quadrilha.
O propósito era pegar a pena maior imposta a
um réu e aumentá-la em uma fração, que poderia variar de um sexto até dois
terços. A forma de calcular levaria a penas mais brandas do que a soma das
punições aplicadas a cada crime.
O ministro criticou o tamanho da punição
aplicada a Valério, superior a 40 anos:
- O instituto do crime continuado foi criado
para mitigar os efeitos exagerados da aplicação das penas previstas para os
crimes concorrentes quando não há limitação da acumulação material. Por isso é
que na acumulação material Marcos Valério está com uma pena que se situa na
estratosfera, uma pena no campo dos crimes patrimoniais de 40 anos.
Penas desproporcionais
Em entrevista no intervalo da sessão, o
ministro afirmou que as penas aplicadas ao ex-ministro José Dirceu, chefe da
quadrilha, e ao operador do esquema, Marcos Valério, estavam desproporcionais.
- Há um princípio muito caro em toda
sociedade que se diga democrática, que é o princípio do tratamento igualitário.
O meu voto pelo menos tem uma virtude: nivela, afastando essa discrepância de
ter-se o autor intelectual (José Dirceu) condenado a 11 anos, e o instrumento
(Marcos Valério) condenado a 40 - disse.
A contabilidade de Marco Aurélio não mudaria
a situação de Dirceu, condenado por corrupção ativa e quadrilha. Como o delito
de quadrilha não foi levado em conta pelo ministro na continuidade delitiva, as
penas dos dois crimes continuaram a ser contadas separadamente.
Barbosa: crimes distintos
O relator do mensalão discordou. Joaquim
citou a jurisprudência da Corte, com decisões que vão em sentido contrário.
- Não é possível considerar que a corrupção
do diretor de marketing do Banco do Brasil para renovar contrato da DNA
Propaganda com a entidade pública seja uma mera continuação da corrupção do
presidente da Câmara dos Deputados. As corrupções ativas de parlamentares são
também inteiramente diferentes dessas duas outras corrupções ativas.
Segundo ele, são crimes distintos:
- Não se pode confundir o fato de os acusados
terem praticado vários crimes ao longo de dois anos em quadrilha com
continuidade delitiva. Seria um benefício indevido a réus que fazem da prática
criminosa uma rotina.
Joaquim comparou a situação a uma quadrilha
em que um de seus membros é condenado por tráfico de drogas, lavagem de
dinheiro, porte ilegal de armas e outros crimes da mesma espécie. Caso
prevalecesse o entendimento de Marco Aurélio, disse Joaquim, os juízes de todo
o Brasil, ao seguir a orientação do Supremo, ficariam obrigados aplicar nesses
casos apenas o crime de tráfico e ignorar os demais.
Lewandowski seguiu Marco Aurélio na íntegra,
destacando que, por ser um caso extraordinário, o Supremo não pode ficar
limitado a sua jurisprudência.
- Eu acredito que nós não estamos jungidos
(limitados) aos precedentes firmados por esta Suprema Corte, a partir de crimes
comuns, conforme Vossa Excelência (Joaquim) veiculou, porque nós estamos
julgando uma situação extraordinária - disse o revisor.
Em seguida, votaram os ministros Rosa Weber,
Luiz Fux e Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Celso de Melo, que
acompanharam Joaquim.
- Passa-se a privilegiar o delinquente que
planeja racionalmente, em especial a criminalidade organizada, às custas do
delinquente de instante ou oportunidade, aquele que é submetido por seu impulso
- disse Fux, criticando aplicação da continuidade delitiva no processo.
Fonte: O Globo
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