O PMDB não é pior nem melhor que os demais partidos no plano fisiológico em que se consolidou o sistema político brasileiro. É apenas o maior, o que o torna credor de um espaço proporcional ao seu tamanho na estrutura de governo que vier a apoiar.
Ocupação proporcional de espaços na estrutura de poder é inerente a qualquer processo político em qualquer sistema democrático. O sistema representativo assim o impõe, admitido que os eleitos representam uma parcela maior ou menor dos cidadãos que neles votaram.
O problema não está na distribuição dos cargos, mas o que se faz com eles, para que fim servem os meios que propiciam aos seus ocupantes. O que insere o país como carente de uma reforma menos técnica do que de costumes.
Essa reforma de costumes depende necessariamente da participação da sociedade no processo político, em que o poder maior está no voto criterioso dado com base no acompanhamento da rotina política e na fiscalização dos eleitos.
Os tempos recentes mostraram claramente que a participação dos segmentos de interesse que formam a chamada sociedade organizada impõe as mudanças saudáveis que os políticos adiam enquanto podem em benefício do usufruto das benesses do poder de que foram investidos pelos cidadãos.
No Brasil, embora crescente, essa participação ainda é incipiente e pouco organizada. Quando se articulou com foco, como no caso da lei da Ficha Limpa, impôs a sua vontade. A primeira fase dos protestos de junho do ano passado foi a mobilização mais expressiva e direcionada da população pela reciprocidade de serviços de qualidade em relação à carga tributária vertiginosa.
Do que se conclui com relativa facilidade que a crise entre o PMDB e o governo não tem raiz numa suposta postura ética do Executivo, mas na falta de fórmula conciliatória que pacifique os ânimos de dois partidos em luta pela ampliação de sua presença no mapa eleitoral brasileiro.
O governo que na fase Lula compôs com o PMDB para sobreviver ao escândalo do mensalão, afirma-se nesse momento como o partido no governo e se vale do relativo favoritismo de sua candidata à reeleição, para mudar os termos de convivência com o aliado, movido pela meta de hegemonia que já custou ao partido a condenação de seus principais – e mais históricos – dirigentes.
A decisão da presidente Dilma de investir na divisão do partido representa a escolha do PMDB com o qual pretende governar se reeleita para um segundo mandato. Um PMDB preferencialmente menor em 2015, e menos influente numericamente no Congresso, o que resultará das urnas se o plano concebido pelo PT der certo.
Para compensar a perda relativa da parcela peemedebista excluída pelas urnas, o governo conta com o PSD, do ex-prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, desde sua criação uma linha auxiliar à espera da reeleição da presidente Dilma para de seu governo fazer parte.
É esse quadro que explica a corda esticada pelo líder do partido na Câmara, Eduardo Cunha (RJ), estrategicamente demonizado pelo Planalto, porém respaldado pela bancada da Câmara, por sua vez motivada pelo que é mais caro ao político: a ameaça de não renovar o mandato, que é a materialização da perda de poder.
A bancada do senado, à qual recorre Dilma para administrar a crise com o partido, não é menos sensível a essa realidade. Apenas a renovação dos mandatos naquela Casa não coincide, em sua totalidade, com o mesmo período dos deputados, o que a torna menos inflamada.
Mas a ameaça concreta do PT à perda de capilaridade do partido envolve a todos porque está em jogo a força política da legenda que, maior ou menor, afeta cada um individualmente. O processo já está em curso com a versão eleitoral do governo de que resiste à pressão de um aliado voraz e insaciável, cujos integrantes só pensam em cargos e negócios.
A estratégia de desgastar o PMDB não autoriza ingenuidades por parte do partido: está posta, é escancarada e é nesse contexto que se tenta antecipar a convenção nacional, em que a liderança do vice-presidente Michel Temer não se impõe ao instinto de sobrevivência de um número crescente de parlamentares, governadores e prefeitos que vão às urnas em outubro.
No projeto hegemônico do PT, o PMDB é a primeira pedra a ser removida, o que já foi tentado por Lula no seu primeiro mandato, quando trocou a parceria com o partido de Temer pela cooptação de legendas menores, útero do mensalão.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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