Emparedada, Dilma quer isolar Eduardo Cunha no PMDB
De tanto ouvir o PMDB reclamar da falta de apoio do PT a seus candidatos nos Estados, o presidente petista Rui Falcão perguntou ao vice-presidente Michel Temer, no fim do ano passado, onde o PMDB apoiava o PT. Temer engoliu em seco. Talvez apenas em Minas Gerais, se der certo a aliança em negociação entre os dois partidos em torno da candidatura ao governo do ex-ministro do Desenvolvimento Fernando Pimentel.
Na noite de domingo, numa conversa entre pemedebistas, o presidente do Senado, Renan Calheiros, resumiu em duas frases o que considera um dos motivos para a exacerbação da atual crise entre PT e PMDB: "A presidente Dilma Rousseff está confundindo o Eduardo Cunha com o PMDB nacional. O PMDB nacional não é o deputado Eduardo Cunha". Renan referia-se ao líder do partido na Câmara, parlamentar controverso e afeito à política de confrontação, uma característica mais próxima do PT que do pessedismo do PMDB.
Tanto uma quanto outra explicação não bastam para esclarecer a crise entre a presidente Dilma Rousseff e o PMDB. O que está em jogo, de fato, é o apoio pemedebista à reeleição da presidente Dilma. O "PMDB nacional" quer manter a aliança ficaria mais feliz ainda se Lula fosse o candidato; algumas seções regionais preferem ficar "soltas" e negociar mais adiante num quadro em que o cenário estiver mais bem definido. O Rio de Janeiro, apesar das declarações em contrário do governador Sérgio Cabral e de seu candidato Luiz Fernando Pezão, que também têm saudades de Lula, hoje é do PMDB do Eduardo Cunha.
Falcão tem razão ao cobrar do PMDB uma solidariedade equivalente nas eleições regionais. Mas não só Dilma, como o PT de um modo geral, parecem de fato confundir o PMDB. Cunha cometeu um erro grave ao emparedar a presidente da República na reforma ministerial. Se alguém agora deve recuar é o deputado. À presidente, por seu turno, não é permitido se trocar com um deputado federal, mesmo sendo ele o líder da segunda maior bancada da Câmara.
A crise Dilma X PMDB parece uma comédia de inabilidades inadmissíveis em políticos com a experiência de seus protagonistas. O PMDB reconhece como verdadeira a versão de que a conduta do Palácio do Planalto é orientada pelo marketing do jornalista João Santana, o publicitário do PT e da campanha de Dilma à reeleição. As pesquisas em poder de Santana informariam que é positivo, para a imagem da presidente, as críticas a tudo o que o Congresso representa em termos de atraso - fisiologismo, nepotismo, clientelismo. Algo como aconteceu no início do governo, quando Dilma deflagrou a chamada "faxina ética", com a limpeza do governo de ministros identificados com o "malfeito". Essa estratégia chegou ao paroxismo - no entendimento do PMDB - quando o principal alvo dos disparos da presidente virou seu parceiro de chapa.
Cunha já está há algum tempo na alça de mira do Palácio do Planalto e de uma dezena adversários internos do PMDB. Desde o governo Lula da Silva, para ser mais preciso. Sua primeira eleição para líder do PMDB foi complicada: teve votos de 40 deputados, em uma bancada de 79. Mas já neste ano foi reeleito sem contestação. Ajudou muito a postura de independência do deputado em relação ao Planalto.
É um osso duro de roer. Em 2007, ainda na condição de vice-líder, Cunha segurou por cerca de 90 dias o projeto de reedição da CPMF, o imposto do cheque, até que Lula nomeasse um seu afilhado político para Furnas. Resultado, o projeto atrasou, chegou ao Senado a poucos dias do final do ano e findou que o governo perdeu qualquer coisa em torno de R$ 40 bilhões anuais de receita. Na época, Cunha era o relator de um projeto; hoje, como líder, tem influência sobre toda a pauta da Câmara.
O desconforto e inapetência de Dilma em relação à coisa congressual só ajudaram o fortalecimento de Cunha na bancada do PMDB e entre outros aliados insatisfeitos com o tratamento recebido do governo. A cronologia dos fatos demonstra que Dilma levou as bancadas do PMDB à exaustão. No final de 2013, a exasperação era com a falta da liberação de verbas prometidas do Orçamento. Na mesma época, presidente Dilma sinalizou para o PMDB que o partido poderia sair da reforma com mais um ministério. Temer sugeriu que a reforma fosse feita em janeiro, antes da volta do Congresso das férias, segundo alegou, para evitar a mistura do debate legislativo com o da reforma.
Dilma primeiro resolveu a questão dos ministérios do PT. Quando chamou o PMDB, deixou claro que não haveria mais ministérios para o PMDB e informou que nomearia um senador para o Ministério do Turismo, cargo ocupado por um deputado. Reviveu com isso a antiga divisão entre o PMDB da Câmara e o PMDB do Senado, mantida sob um frágil equilíbrio com uma partilha equânime dos cargos. O erro de Eduardo Cunha ocorreu neste momento, quando a bancada, por meio de nota oficial, devolveu a indicação para a presidente. Dilma foi levada ao canto do ringue. Não tem outra saída, sob pena de ficar desmoralizada, a não ser nomear quem bem entender para as vagas da Câmara.
O empenho da cúpula pemedebista é para encontrar uma saída que salve as aparências. Não será fácil para Dilma isolar Eduardo Cunha, muito embora seja certo que a bancada do PMDB na Câmara não esteja em condições de segurar o atual nível de radicalização. Bem ou mal o partido é governo e não tem muito para onde correr.
Resta saber qual a extensão do interesse do governo na divisão da bancada do PMDB. Dirigentes petistas dizem que o problema é o parceiro: se o partido quer ter dois ministros do Senado e outros dois da Câmara, indique. O PT observa no parceiro um partido tão rachado, que talvez precise intervir para ajudar o vice-presidente Michel Temer a manter, na convenção, sua indicação à capa de Dilma Rousseff. Se for necessário, o PT promete ajudar. Mas a responsabilidade pela indicação de Temer - adverte - é do PMDB.
Fonte: Valor Econômico
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