• PT copia PSDB e usa discurso do medo para socorrer Dilma
• Comercial do partido cita ‘fantasmas do passado’ e diz que ‘não podemos voltar atrás’
Aécio afirma que propaganda é ‘espelho do fracasso’ do governo, Campos fala em ‘tiro no pé’ e Rui Falcão, que ‘nada ali é irreal’. Em 2002, Regina Duarte apareceu em programa de Serra dizendo temer volta da inflação caso Lula fosse eleito
Com a presidente Dilma Rousseff em queda nas pesquisas, o PT decidiu repetir estratégia usada pelo PSDB em 2002 na campanha de José Serra e apostar na tática do medo para tentar reverter o desejo de mudança no país, declarado por 74% dos eleitores na última pesquisa do Datafolha. Ontem, começaram a ser veiculados comerciais do PT na TV em que os atores interpretam famílias hoje com acesso a remédios, escolas e emprego sendo confrontadas com suas próprias imagens, em situações degradantes. Ao fim, o locutor diz que “não podemos deixar que os fantasmas do passado voltem e levem tudo o que conseguimos com tanto esforço”.
Os pré-candidatos da oposição reagiram. Para Aécio Neves (PSDB), o comercial espelha “um governo que só tem a oferecer medo e insegurança”. Já Eduardo Campos (PSB) chamou de tiro no pé: “Vão encorajar o povo a tirar a presidente Dilma inclusive do segundo turno.”
Rui Falcão, presidente do PT, defendeu o programa: “Nada do que se diz ali é irreal. As pessoas efetivamente mudaram de vida.”
Medo ressurge na TV
Maria Lima – O Globo
• Como PSDB em 2002, programa do PT alerta sobre risco às conquistas e ‘fantasmas do passado
BRASÍLIA - Em uma investida que surpreendeu adversários e cientistas políticos, o PT apresentou ontem na TV um programa, produzido pelo marqueteiro João Santana, adotando estratégia semelhante ao polêmico e criticado vídeo usado pelo PSDB em 2002, na campanha de Lula contra o tucano José Serra, que teve como protagonista a atriz Regina Duarte falando do medo da vitória do petista.
Diante do índice de 74% dos brasileiros desejando mudanças, conforme retratado na última pesquisa Datafolha, o vídeo de um minuto tenta vender a mensagem de que “não podemos voltar atrás”. Com locução do ator Antônio Grassi, o filmete mostra famílias sendo expulsas do campo, famílias sem acesso a remédios, trabalhadores perdendo o emprego, e crianças, sem escola, lavando carros em sinais fechados.
— Quando a gente dá um passo pra frente na vida, precisa saber preservar o que conquistou. Não podemos deixar que os fantasmas do passado voltem e levem tudo que conseguimos com tanto esforço.
Nosso emprego de hoje não pode voltar a ser o desemprego de ontem. Não podemos dar ouvidos a falsas promessas. O Brasil não quer voltar atrás — diz o locutor, numa referência ao discurso dos adversários Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB), que falam em medidas impopulares.
Dilma tem batido forte nessas promessas, insinuando que vão trazer desemprego e arrocho salarial.
Em 2002, a atriz Regina Duarte, com semblante crispado, gravou um vídeo para a campanha de José Serra, no qual dizia que o Brasil corria o risco de perder a estabilidade conquistada e não dava para “ir tudo para a lata do lixo”. Em outro trecho, ela dizia que havia dois candidatos:
Serra, ela conhecia como “o homem dos genéricos” e da política de combate a AIDS, o outro, Lula, ela conhecia, mas não conhece mais: “Tudo o que ele dizia mudou muito. Isso dá medo na gente. Outra coisa que dá medo é a volta da inflação desenfreada. Eu voto em Serra, voto sem medo.”
Com mensagem subliminar parecida, o filme do PT mostra o que seriam conquistas do governo petista: mães com filhos com acesso a escola e a remédios, em oposição a imagens de desempregados, com olhares tristes e assustados, e crianças passando fome nas ruas. Essas imagens são associadas aos “fantasmas do passado” que não poderiam retornar.
O presidente do PT, Rui Falcão, negou que esteja sendo feito terrorismo:
— Estamos mostrando o risco que é você apostar em determinadas alternativas, cujas propostas remetem ao passado.
Uma delas, inclusive, traz um ex-presidente.
Nada do que se diz ali é irreal. As pessoas efetivamente mudaram de vida, ascenderam socialmente, tiveram acesso ao mercado, melhoria de salário, mais educação, mais emprego e não querem perder isso. Terrorismo quem está fazendo são eles. Nós estamos alertando que as mudanças não podem ser uma volta ao passado nem um salto no escuro.
Segundo o presidente do partido, o programa de dez minutos que o PT exibirá amanhã será “impactante no sentido de polarização política e confronto de ideias” e contará com a presença do expresidente Lula e da presidente Dilma Rousseff. Os candidatos da oposição reagiram duramente contra a peça.
— Este vídeo, para ser visto, tem que tirar as crianças da sala. Como fazem uma coisa dessas agora, sem a campanha nem ter começado? Eles estão muito assutados antes da hora — disse Aécio Neves, à noite.
Mais cedo, ele já havia criticado a peça em nota: — É triste ver um partido que não se envergonha de assustar e ameaçar a população para tentar se manter no poder. Esse comercial é o retrato do que o PT se transformou e o espelho do fracasso de um governo que, após 12 anos de mandato, só tem a oferecer medo e insegurança, porque perdeu a capacidade de gerar confiança e esperança.
Os brasileiros não merecem isso. É um ato de um governo que vive seus estertores.
Ex-aliado do PT, Eduardo Campos (PSB) criticou repetição de discurso usado contra Lula.
— É uma atitude completamente equivocada do ponto de vista político e histórico. O mesmo discurso foi muito utilizado contra Lula e o PT no passado. Lamento que se parta para esse tipo de argumentação. Vejo um certo tipo de desespero. Acho que aquilo vai ser um grande tiro no pé. Com esse tipo de campanha, os que acham que vão colocar medo, vão encorajar o povo a tirar a presidente Dilma inclusive do segundo turno — atacou Campos, que antes de ver a propagando ironizou em referência à publicidade tucana de 2002:
— Quem é a atriz do filme do PT?
De acordo com interlocutores da presidente Dilma, a propaganda coroa a estratégia de embate aberto com os tucanos que teve início no pronunciamento em cadeia nacional no Dia do Trabalho.
— É eles lá e nós cá. A decisão do partido foi de colocar a oposição no córner, jogando para eles a responsabilidade por medidas impopulares, ou seja, recessão.
A Casa das Garças (centro de estudos que abriga os principais formuladores do programa econômico de Aécio), com proposta de inflação a 3%, esquece que tem povo
aqui embaixo. A gente passou pela crise com desemprego mínimo - disse o interlocutor de Dilma.
Cientistas políticos avaliam que o vídeo do PT se vale de um tom radical, pela primeira vez nessa pré-campanha, para estancar quedas de popularidade de Dilma e iniciar de vez uma campanha dura.
— É mais ou menos (a estratégia) de mostrar como a não reeleição da Dilma traria
más conseqüências para o povo brasileiro.
Só que nós sabemos que com a Dilma também tem coisa negativa.
Os fantasmas do passado fazem referência ao governo (Fernando Henrique) Cardoso.
Já é um radicalismo que pode dar o tom a partir de agora — disse David Fleischer, professor de ciência política da Universidade de Brasília (UnB). Para o cientista político João Paulo Peixoto, também da UnB, o governo visou conter as quedas nas pesquisas:
— A presidente Dilma tem enfrentado sucessivas quedas de popularidades e o PT tem que, digamos, apelar. É um sinal de fraqueza, quase desespero. (Colaboraram Catarina Alencastro, Eduardo Barretto e Luiza Damé)
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