• Brasil tem excesso de gasto de 2,5% do PIB com pensão por morte
- Valor Econômico
Aos poucos, de forma um tanto envergonhada, o governo vai dando sinais de que fará de 2015 um ano de ajuste da economia. Algumas medidas de controle de gastos públicos e expansão das receitas já estão prontas. Obedecendo à lógica político-eleitoral, ficaram à espera do pleito de outubro. Outras, como mudanças nas regras de concessão de pensão por morte, seguro-desemprego e abono salarial, dependem da aprovação do Congresso.
Na entrevista que concedeu semana passada, a presidente Dilma Rousseff indicou que vai mesmo mexer no seguro-desemprego e na pensão por morte. No primeiro caso, trata-se de "um grande patrocinador de fraudes", segundo suas próprias palavras. De fato, causa espanto o fato de a despesa não parar de crescer, mesmo com a economia próxima do pleno emprego.
No ano passado, o seguro-desemprego, incluindo o gasto com abono salarial, consumiu R$ 44,2 bilhões do orçamento federal, uma alta de 13,8% em relação ao ano anterior. De janeiro a setembro deste ano, foram R$ 39,9 bilhões, um avanço de 14,8% quando a comparação é feita com o mesmo período de 2013.
O governo não reconhece publicamente, mas a principal razão para a forte elevação do gasto com seguro-desemprego é a política de correção do salário mínimo acima dos índices de produtividade da economia. Como o benefício não pode ser inferior a um salário mínimo, os aumentos reais do mínimo representam um estímulo à rotatividade dos trabalhadores no emprego, situação que se agrava num mercado de trabalho apertado. Os valores mais altos também atraem a ocorrência de fraudes.
A pensão por morte é outra despesa espantosa do orçamento público. Consome o equivalente a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) - cerca de R$ 140 bilhões - em gastos da União, Estados e municípios. Corresponde a cerca de 25% do gasto previdenciário federal e é 3,5 vezes superior à média despendida pelos países da OCDE e 4,5 vezes pelas economias da América Latina.
O que torna a despesa salgada por aqui são as regras de concessão do benefício. No sistema brasileiro, não há exigência de tempo mínimo de contribuição do segurado falecido, ao contrário do que ocorre na maioria das nações. Em geral, os países exigem que o segurado tenha contribuído, para a previdência social, por um período mínimo de tempo para que seus familiares tenham direito ao benefício.
Na Espanha, o caso mais extremo entre os analisados por dois pesquisadores brasileiros - Marcelo Abi-Ramia Caetano, do Ipea, e Roberto de Rezende Rocha, do Banco Mundial -, a carência exigida é de 15 anos ou de pelo menos 500 dias nos cinco anos anteriores ao falecimento. A carência só não é exigida se o motivo do falecimento do segurado estiver relacionado ao seu trabalho.
No Brasil, não se exige que o candidato à pensão por morte seja casado. Não há, também, limite de idade, enquanto muitos países restringem a concessão desse tipo de pensão a pessoas jovens, especialmente viúvos ou viúvas com menos de 45 anos. No sistema brasileiro, a pensão por morte se mantém inalterada em caso de novo matrimônio. Lá fora, em muitos casos, ela é extinta quando o pensionista se casa novamente.
A forma de cálculo do benefício também contribui para o fato de o Brasil ser recordista nesse tipo de despesa. O valor da pensão corresponde a 100% da aposentadoria que o segurado recebia ou à qual teria direito a receber, em caso de aposentadoria por invalidez. O benefício é dividido em partes iguais entre os dependentes. No resto do mundo, geralmente a chamada taxa de reposição se restringe a 70% do valor da aposentadoria, com possível acréscimo de 10% por beneficiário.
Nos casos em que o pensionista já receba salário ou um outro benefício previdenciário, o valor da pensão não é reduzido. Em muitos países, os pagamentos são diminuídos e, em outros, é proibida a acumulação com benefícios previdenciários e mesmo com salários. O Brasil também não estabelece relação entre idade do pensionista e valor da pensão. No exterior, pensionistas mais jovens recebem benefícios menores.
O amplo diagnóstico de Abi-Ramia e Rezende sobre a sangria de recursos públicos representada pela pensão por morte no país foi feito há mais de quatro anos. Apesar disso, nada foi feito para mudar esse quadro. O economista Samuel Pessôa, do Ibre-FGV, calcula que países com pirâmide etária equivalente à brasileira gastam, em média, o equivalente a 0,5% do PIB com pensão por morte.
A ideia de que promover um ajuste fiscal neste momento significaria reduzir benefícios de programas sociais como o Bolsa Família é falsa como uma nota de três reais. Há espaço para corte de despesas em vários itens do gasto público. Mas não se tenham ilusões: mexer em despesas como pensão por morte e seguro-desemprego exige vontade política. A presidente Dilma parece disposta a fazer isso.
Ruim na foto
É verdade que, no pós-crise (2011-2014), o Brasil certamente cresceria menos que no período anterior. No entanto, numa comparação com emergentes do G-20, que reúne as maiores economias do mundo, o país só se sai melhor neste ano que a Argentina, embora, na média dos quatro anos, ainda fique em desvantagem (ver quadro ao lado). Em outros indicadores, como dívida pública bruta e inflação, a comparação também é desfavorável ao Brasil.
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