Andrea Jubé e Rosângela Bittar – Valor Econômico
BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff montou ontem uma ofensiva de guerra para conter a escalada dos rumores de que o PMDB se alinharia à oposição num movimento para afastá-la do cargo. Após reunião da coordenação política, o vice-presidente Michel Temer, dois ministros e um líder governista classificaram o ato de "impensável" e exaltaram a democracia. Dilma também convocou às pressas o conselho político, incluiu de última hora na agenda o lançamento do Plano de Proteção ao Emprego e concedeu entrevista ao jornal "Folha de S. Paulo", numa tentativa de sair do isolamento. À noite, após a última reunião com o Conselho, ainda reteve no Alvorada o vice-presidente e os presidentes do Senado, Renan Calheiros, e da Câmara, Eduardo Cunha, para que ouvissem exposição do advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e do ministro Nelson Barbosa sobre a legalidade das pedaladas fiscais.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva será procurado hoje por emissários de Dilma Rousseff para juntar-se à operação de resgate do governo e da imagem da presidente de forma mais efetiva e combinada, embora ontem ele já tenha iniciado uma campanha de divulgação dos números da economia dos governos petistas para confrontar as críticas da oposição.
Lula e o PT devem assumir a linha de frente de defesa do governo a partir de agora, seguidos dos demais partidos da base, seus líderes, ministros e governadores. Farão, porém, uma ação mais objetiva, que vá além das acusações à oposição de tentativa de golpe de Estado, como se deu no início da reação. As principais lideranças do PMDB estão sendo procuradas desde o fim de semana, também para retomar o eixo da aliança e reassumir seu papel. Enquanto o vice-presidente Michel Temer voltava a falar ontem explicitamente contra o impeachment, lideranças do seu partido ainda insistiam que essa era a melhor solução, mas espera-se um acerto do passo a partir de hoje.
De certa forma o tom radical do discurso do PSDB, na convenção do fim de semana, ajudou a presidente a retomar o controle da situação e reunir as forças governistas em torno de si. Foi um fato decisivo também para mostrar a Lula que suas críticas ao governo e ao PT, além de a ele próprio, abriram a avenida da contestação pela qual entrou a oposição e podem entrar os movimentos populares contra o governo.
Pelo lado do PT, os ministros Jaques Wagner e Aloizio Mercadante, acusados o primeiro de esconder-se dos problemas, o segundo de provocá-los, se reajustaram à estratégia do governo e passarão a tentar atuar a favor da reaglutinação dos partidos aliados.
Também ontem o marqueteiro João Santana desembarcou em Brasília. Ele retornou à capital federal em meio ao acirramento da crise e uma semana após reunião com Lula e o presidente do PT, Rui Falcão. Santana sustenta que seu compromisso, no momento, é com o programa partidário do PT. Mas ele se tornou amigo da presidente e tem sido ouvido como conselheiro informal.
No Twitter, Falcão, disse que a oposição é "golpista" e quer "ganhar no tapetão". "Perderam no voto e agora querem ganhar no tapetão. Fora golpistas! Democracia neles!", escreveu Falcão.
Em meio à turbulência, Dilma viaja hoje para a Rússia, onde participa da cúpula dos Brics, de onde segue para a Itália. No fim da semana, visita a ExpoMilão. O cancelamento dessa viagem jamais foi cogitado, segundo assessor de Dilma, mas sua confirmação, ontem, levou alívio ao PT: se a presidente vai à Rússia é porque o impasse imediato foi superado, argumentam.
Se não retornar a tempo, enviará Michel Temer para representá-la na missa do Papa Francisco no sábado em Assunção, no Paraguai. Nessa hipótese, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), assumiria a Presidência da República.
Cunha tem sido apontado, em conversas reservadas, como um dos adversários mais ferrenhos do governo. Por isso, essa hipótese, se confirmada, seria um afago num momento em que auxiliares da presidente defendem mais diálogo com Cunha e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) para reduzir a temperatura política. "Eu sempre dialogo, independente de apoio ou não do governo, mas não deixarei de expor minha opinião e nem de votar as pautas da sociedade", reagiu Cunha em conversa com o Valor.
Um interlocutor da presidente admite que o cerco está se fechando. "Todos estão contra ela", resumiu. "O Tribunal de Contas da União (TCU), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a Câmara dos Deputados, o Senado, e até o PMDB", enumerou.
No Planalto, é real o temor de que o TCU rejeite as contas relativas ao ano passado devido às "pedaladas fiscais", o que remonta o caso ao Congresso, que é controlado pelo PMDB. Os pemedebistas estão insatisfeitos e acusam o governo e o PT de descumprirem acordos firmados com Temer. Em outra frente, assessores palacianos igualmente temem os desdobramentos do processo em tramitação no TSE, em que o PSDB pede a cassação da chapa encabeçada por Dilma e Temer por irregularidade nas contas de campanha.
A crise política agravou-se após a veiculação de notícias de que lideranças do PMDB teriam procurado o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para sondá-lo sobre eventual apoio do PSDB a Michel Temer na hipótese de impedimento da presidente. A afirmação dos tucanos de que estão "prontos" para voltar ao governo foi interpretada no PT como um aviso de golpe em marcha.
Duas teses eram ventiladas ontem no Planalto. Uma de que o PSDB só subiu o tom porque teria respaldo de lideranças do Congresso. Nesse caso, dilmistas defendem mais diálogo, liberação de emendas e cumprimento de acordos relativos a cargos. Outra tese é de que há uma disputa de forças internas no PMDB, e que é mais vantajoso aos oposicionistas manter Dilma "sangrando" no cargo. No PT, a avaliação é de que o golpe que preveem só prospera se PMDB e PSDB unirem-se internamente e chegarem ao consenso, um cenário remoto por enquanto. Michel Temer disse em entrevista coletiva que o impedimento de Dilma é "impensável". (Colaborou Cristiane Agostine, de São Paulo)
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