- Correio Braziliense
• O povo assiste “bestificado” à alta da inflação, ao desemprego e ao escândalo da Petrobras. Mas há uma grande manifestação “Fora, Dilma!” convocada pelas redes sociais
A presidente Dilma Rousseff convocou ontem uma reunião de líderes e presidentes de partidos da base aliada para uma demonstração de que não existe uma crise política, muito menos a sua iminente deposição por uma conspiração envolvendo líderes da base aliada e da oposição, como foi amplamente especulado no fim de semana.
Pela manhã, reuniu a coordenação de governo e escalou o vice-presidente Michel Temer para dar uma inédita entrevista coletiva no Palácio do Planalto, cuja principal afirmação foi a seguinte: “Não temos crise política, porque significaria o fato de o governo não ter apoio do Congresso Nacional. (…) Vocês veem que temos tido apoio do Congresso”, disse. “Brincadeira!”, diria o falecido Bussunda.
Segundo Temer, tanto a Câmara quanto o Senado aprovaram as medidas provisórias que compõem o ajuste fiscal, proposto pelo Executivo para reduzir gastos e reequilibrar as contas da União. “Eu faço distinção do interior da palavra crise, que é usada muito genericamente, quando tem crise econômica, crise política. O que não se quer é crise institucional”, disse o vice-presidente.
Nada disso impediu que, nos bastidores do Congresso, circulasse a estória de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria se preparando para assumir a Casa Civil e Temer, a pasta da Justiça, no lugar do petista José Eduardo Cardozo. Boatos são cada vez mais frequentes em Brasília.
Políticos do primeiro time costumam ser ardilosos, estrategistas, dissimulados e frios. Michel Temer encabeça a lista de caciques do PMDB com esse perfil. Não costuma cair com o barulho das balas, nem dá ponto sem nó. Hoje, é o principal fiador do que ainda resta de governabilidade para Dilma Rousseff.
Não foi muito diferente o comportamento de outros vices que assumiram a Presidência, como Café Filho (PSP), após o suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954, e Itamar Franco, com a renúncia de Fernando Collor de Mello, em 2 de outubro de 1992, antes de o Congresso aprovar seu impeachment. Em ambos os casos, houve muito povo na rua.
Duas táticas
Por enquanto, apesar das manifestações de junho de 2013 e de 15 de março deste ano, o povo assiste “bestificado” à alta da inflação, ao desemprego e ao escândalo da Petrobras. Mas há uma grande manifestação “Fora, Dilma!” convocada pelas redes sociais para 16 de agosto, que pode ser engrossada pelos partidos de oposição. E existe, de fato, uma ampla articulação política para que o vice Michel Temer assuma o poder, no lugar de Dilma Rousseff, que já conta com a simpatia de setores importantes do empresariado e do Congresso.
Os líderes do PMDB tentam convencer Temer de que não há outra alternativa, porque a petista não teria mais condições políticas de liderar o país. Argumentam que a presidente chegou a um ponto sem retorno em termos de desaprovação popular e perda de credibilidade. O impeachment de Dilma pelo Congresso dependeria da rejeição de suas contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e de uma condenação das “pedaladas fiscais” no atual mandato, o que configuraria crime de responsabilidade.
A oposição ganhou força porque o PT se opõe cada vez mais ao ajuste do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o PMDB resolveu mitigar as medidas do arrocho fiscal. Com isso, a situação da economia se agravou. Além disso, as investigações da Lava-Jato atingiram o Palácio do Planalto, abalando ainda mais a imagem da presidente da República. Não há, porém, unanimidade quanto ao impeachment.
O PSDB aposta na impugnação da eleição de Dilma Rousseff por abuso de poder econômico e financiamento ilegal de campanha, uma vez que as contas de campanha de Dilma Rousseff ainda não foram aprovadas e serão julgadas brevemente, em meio às denúncias de que teria recebido dinheiro sujo da corrupção na Petrobras. Nesse caso, novas eleições teriam que ser convocadas, no prazo de 60 dias, com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), assumindo o governo provisoriamente.
Essa proposta é criticada por setores do establishment, que temem as incertezas de uma eleição disputada a toque de caixa por Aécio Neves (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Marina Silva (Rede). Preferem que Temer assuma e forme um governo de salvação nacional, sem os petistas, para enfrentar a crise e conduzir o país até as eleições presidenciais de 2018.
Diante dessas articulações, a presidente Dilma Rousseff resolveu reforçar a articulação política com os ministros Gilberto Kassab (Cidades), do PSD; Aldo Rebelo (Ciência e Tecnologia), do PCdoB; e Jaques Wagner (Defesa), do PT; além do líder do governo no Senado, o senador Delcídio Amaral (PT). Só falta mesmo convocar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que também ficaria blindado em relação ao juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, o ferrabrás da Operação Lava-Jato.
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