- O Estado de S. Paulo
Além da apresentação da denúncia do procurador-geral, Rodrigo Janot, contra o deputado Eduardo Cunha ao Supremo Tribunal Federal para os próximos dias, Brasília vive a expectativa de qual será a reação do presidente da Câmara, se vier mesmo a ser denunciado.
Da última vez que seu nome ganhou destaque no âmbito das investigações da Operação Lava Jato – quando o delator Júlio Camargo disse ter pagado a ele US$ 5 milhões em propina – Cunha rompeu com o governo, alegando que havia um conluio entre o Palácio do Planalto e a Procuradoria-Geral para prejudicá-lo.
Pois desta vez, no que depender dele, não haverá desdobramentos políticos. “Já fiz o que tinha de ser feito”, diz o presidente da Câmara, explicando que o gesto do rompimento formal com quem já estava rompido de fato foi decorrente de puro cálculo: “Quando vi que havia armação, procurei logo me posicionar. Do contrário, não poderia contra-atacar, pois ainda estaria atrelado ao governo”.
O deputado busca transparecer absoluta tranquilidade. Tanto no tocante à denúncia em si quanto à reação dos colegas. “Não vou me sentir constrangido. A denúncia não significa condenação e, mesmo sendo aceita, no caso de me tornar réu não serei o único”, afirma, lembrando que há na Câmara 166 deputados alvo de inquéritos e 36 réus em processos que tramitam no STF.
Nesse raciocínio, o colegiado não teria autoridade moral para contestar sua permanência na presidência. Já o governo e o PT, na visão dele, não vão arrefecer a pressão. “Não me suportam nem se conformam com o fato de eu tê-los derrotado na disputa pelo comando da Casa. Além disso, puseram na cabeça que eu estou querendo provocar o impeachment para o Michel (Temer) assumir o lugar da Dilma.”
Segundo Eduardo Cunha, essa convicção ficou mais forte depois da já notória declaração do vice-presidente sobre a necessidade de que “alguém” reunificasse o País. “Aquilo causou um desconforto enorme, tanto que já vieram (petistas) aqui me falar que eu estou no golpe com o Michel.” Na opinião dele, conclusão risível e míope.
“O governo me superestima, não enxerga as coisas como elas são. Acha que eu comando a Casa quando, na verdade, eu faço é a vontade da Casa. O governo não tem maioria e, portanto, perde. Se tivesse ganharia. Simples assim.”
Quanto à aproximação do Planalto com o presidente do Senado, Renan Calheiros, e o acordo firmado em torno da chamada “Agenda Brasil”, o deputado não só reafirma a interpretação de que não passa de espuma, como não vislumbra a menor possibilidade de resolver a crise.
Por dois motivos. Renan não é exatamente o aliado mais confiável. “Foi o maior opositor do governo no Congresso. Devolveu medida provisória, obstruiu votações de interesse do Planalto, chegou a se referir à presidente de modo desrespeitoso e foi fragorosamente derrotado na indicação do (Luiz Edson) Fachin para o Supremo.”
A mudança de atitude – de parte a parte – deu-se por interesse circunstancial mútuo. A Renan interessaria buscar respaldo numa eventual influência do governo sobre a decisão do procurador recentemente indicado para novo mandato em possível denúncia da Lava Jato. Ao Palácio, abrir diálogo com outro interlocutor no PMDB, a fim de reduzir o protagonismo do vice, alvo de desconfiança.
A segunda razão apresentada por Eduardo Cunha sobre a fragilidade do acerto diz respeito à opinião do público. “Acordo só dá certo se for feito com a sociedade e, para isso, a presidente precisa ‘zerar’ o governo, mudar tudo e recomeçar em novas bases.”
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