sábado, 22 de agosto de 2015

Temer deixará a articulação política

Por Andrea Jubé - Valor Econômico

BRASÍLIA - O vice-presidente Michel Temer devolve a articulação política do governo no fim do mês, ampliando o isolamento político da presidente Dilma Rousseff. Por meio de interlocutores, Temer avisou o Palácio do Planalto que "o cristal trincado, agora quebrou", sobre sua relação com o governo.

O desembarque de Temer e a denúncia contra o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no âmbito da Lava-Jato, acirram a crise. Isso porque a avaliação interna no Planalto é que Cunha intensificará a artilharia contra a presidente, o governo e o PT, enquanto o afastamento do vice-presidente implica a debandada do PMDB do governo. Apesar de uma minoria dissidente, as bancadas pemedebistas, especialmente no Senado, têm mostrado fidelidade ao governo nas votações. A expectativa de governistas é que a contundência das denúncias contra Cunha o fragilizem adiante, mas ninguém acredita que ele perca fôlego, automaticamente, no cargo.

Nos últimos dias, aumentou a pressão no PMDB para que Temer deixe a articulação, antes um movimento restrito a uma minoria. Um dos motivos é o reiterado descumprimento por ministros petistas dos acordos firmados pelo vice com a base aliada.

Outro motivo remonta ao "cristal trincado". A relação de Temer com o Planalto esmoreceu depois que ele fez um apelo pela reunificação nacional. Em uma entrevista coletiva, o vice declarou que era preciso "alguém" capaz de reunificar o país. Mas a leitura de auxiliares presidenciais foi de que Temer teria se colocado como alternativa a Dilma. Fizeram chegar ao vice o aviso de que "o cristal trincou" sobre a relação de confiança dele com Dilma e o governo.

Mas um dirigente do PMDB rebate: "se para eles o cristal trincou, para o Michel quebrou de vez". Questionado se é possível reverter este sentimento, o pemedebista, um dos mais próximos ao vice, reforça: "nunca vi soldar cristal quebrado". Do time dos que defendem a saída de Temer, este pemedebista afirma que o vice "já dedicou tempo demais a isso".

A oportunidade para Temer devolver o cargo surge no fim de agosto, quando dois de seus principais auxiliares deixam os postos: Mozart Vianna, que monitora as votações no Congresso Nacional, e seu braço-direito na articulação, o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Eliseu Padilha, que volta a se dedicar exclusivamente à pasta. Padilha avisou que voltaria a se ocupar exclusivamente dos aeroportos em entrevista exclusiva ao Valor, há um mês.

Um interlocutor de Temer afirma que o vice vivencia um dilema entre o senso de responsabilidade com o governo num momento de crise aguda e o respeito à sua biografia. Nos últimos 15 dias, em mais de uma circunstância, Temer mostrou indignação com a insinuação de que fez um gesto para atropelar Dilma.

Em conversa reservada com a presidente, colocou o cargo à disposição. Em reunião da coordenação política num domingo no Palácio da Alvorada, Temer disse que não era homem "de agir à sorrelfa", ou seja, sorrateiramente.

Dias depois, no café da manhã no Palácio do Jaburu da cúpula do PMDB com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Temer bateu com as mãos sobre a mesa e afirmou que não retirava nenhuma palavra de seu apelo à unificação nacional. Naquele encontro, o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) havia elogiado a fala de Temer, mas ressalvado que o termo "alguém" suscitava dúvidas.

A mágoa de Temer fez soar o alarme entre os petistas, que se movimentam para dissuadi-lo. Os ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, da Defesa, Jaques Wagner, e da Secretaria de Comunicação Social, Edinho Silva, conversaram com ele nos últimos dias. Mas não há aceno concreto do governo, por enquanto, quanto à remoção dos obstáculos impostos, na maior parte das vezes pela Casa Civil e pelo Ministério da Fazenda no cumprimento dos acordos firmados pelo vice. Sem isso, com o "cristal quebrado" e sob pressão do PMDB, Temer desembarca.

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