Por Raphael Di Cunto – Valor Econômico
BRASÍLIA - Em nome de partidos da base aliada do governo, o deputado Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio, apresentou ontem recurso contra a resposta do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), à questão de ordem da oposição sobre o rito de tramitação do impeachment.
Após discordar de parte das decisões do pemedebista e na tentativa de postergar a análise dos pedidos de impedimento, o PT questionou pontos da resposta de Cunha em plenário. A estratégia do partido, acertada com parte da base, era apresentar recurso para que a decisão ficasse com a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e aprovar um efeito suspensivo até lá, mas a legenda aceitou acordo proposto pelo presidente da Casa para transformar os questionamentos em nova questão de ordem.
Segundo o líder do PT, Sibá Machado (AC), o partido preferiu o caminho do diálogo ao enfrentamento e, se as respostas não forem satisfatórias, pode recorrer da nova decisão à CCJ. O Valor apurou que também pesou a decisão de não expor o impeachment a uma votação tão cedo, ainda mais em uma sessão na quinta-feira à tarde, quando o quórum era de menos de 300 deputados, o que tornava incerto o resultado.
Cunha disse que não alterará o cronograma por causa do questionamento do PT. "Não teve questão de ordem, teve argumentação em sentindo contrário [a pontos da decisão]", afirmou. "Não tem nem inovação, o rito já está mais ou menos definido, até porque é baseado em vários pontos já conhecidos, decididos por outros presidentes da Câmara", completou.
Na questão de ordem, Damous questiona seis pontos da decisão de Cunha, em especial os que a oposição pretende usar para dar andamento ao pedido de impeachment de Dilma. O petista defende que, se o presidente da Câmara negar a justa causa, o recurso ao plenário precisa dos mesmos 342 votos necessários para a Câmara aprovar o impeachment e o quórum tem que ser respeitado também na comissão especial.
"A Constituição, ao tratar de matéria que importa em afastamento de presidente da República, consagrou o quórum qualificado de dois terços. As referidas disposições constitucionais visam proteger a democracia e a soberania do voto popular, devendo referido quórum ser respeitado em todas as votações relacionadas a esta matéria", disse Damous.
Em um dos cenários traçados, o presidente da Câmara rejeitaria o pedido de impeachment protocolado pelo jurista Hélio Bicudo, um ex-petista histórico, e a oposição recorreria ao plenário. Para Cunha e a oposição, o recurso precisaria de apenas maioria simples (metade dos presentes mais um) para ser aprovado - mesmo quórum usado em 1999 em um pedido do PT para afastar o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
O PT também questiona outra resposta do pemedebista, que sinalizou que deixará para a comissão especial e o plenário a decisão sobre a possibilidade de Dilma ser responsabilizado por crimes anteriores ao seu mandato, desde que relacionados ao exercício da função. A Constituição, disse Damous, garante que o presidente da República só pode ser afastado por atos ocorridos no atual mandato.
"Não se pode admitir a interpretação que não seja a mais estrita dos dispositivos contidos na Constituição, configurando grave violação à democracia qualquer interpretação diversa e que busque elementos para punição de presidente da República que não estejam expressos de forma clara em seu texto", afirmou.
Na questão de ordem, Cunha, que até então defendia que o presidente da República não poderia ser processado por fatos anteriores ao mandato, disse que não responderia sobre o tema por não se tratar de questão regimental, mas sim do "cerne da decisão do plenário, a partir do trabalho da comissão especial". "Não cabe ao presidente da Câmara [...] substituir-se às instâncias competentes para tomar essa decisão."
Se Cunha deixar a decisão sobre a temporalidade para a comissão especial, esta avaliação só ocorreria depois de iniciado o processo de impeachment de Dilma e abriria espaço para que ela fosse afastada pelos supostos crimes que Bicudo lhe acusa: doações de campanha irregulares, fruto de propina da Lava-Jato, ou as "pedaladas fiscais".
Já o líder do DEM, deputado Mendonça Filho (PE), que elaborou as perguntas assinadas pela oposição, disse ver outro ponto importante na resposta do pemedebista: a possibilidade de convocar, por meio da aprovação de requerimento, sessão extraordinária em 24 horas para deliberar sobre o recurso contra a rejeição de um pedido de impeachment. "Isso dilui um poder que era muito discricionário do presidente da Câmara", disse.
Cunha leu ontem em plenário a resposta aos questionamentos dos líderes de oposição sobre quais procedimentos seriam adotados na análise de um pedido de afastamento da presidente Dilma Rousseff, como os prazos a serem cumpridos e composição da comissão especial que daria parecer sobre a admissibilidade ou não dos pedidos. A resposta serve como norma a ser seguida.
A partir de agora Cunha disse que se debruçará sobre os mais de 10 pedidos já protocolados e na próxima semana já terá posição sobre alguns - cabe ao presidente da Câmara determinar se há justa causa para dar início a um processo de impeachment, com a instalação da comissão especial que dará parecer sobre a admissibilidade e depois encaminhará o relatório para o plenário. Pelo menos 342 deputados precisam aprovar o afastamento do presidente da República e, então o Senado Federal decide se aprova o impeachment ou não.
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