• É evidente que o presidente da Câmara tudo fará para que seu processo na Comissão de Ética só seja decidido no ano que vem. Enquanto isso, a crise se agravará
A foto estampada nos jornais de ontem, em que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), olha, assustado, para uma chuva de notas falsas de dólares, tem lugar certo na galeria de imagens nas retrospectivas do ano a serem feitas pela imprensa no final de dezembro. Jogadas por um militante, as cédulas compuseram uma cena sugestiva em torno do político, acusado, com provas contundentes, de manter no exterior contas e dinheiro não declarados à Receita. Além disso, há relatos precisos, no processo da Lava-Jato, sobre como parte dos dólares se originou no esquema edificado pelo lulopetismo na Petrobras.
A questão é que a crise em torno de Eduardo Cunha ameaça também vir a fazer parte das retrospectivas do noticiário de 2016. Coerente com o perfil de político calejado em escândalos, desde que assumiu a estatal de telefonia do Rio de Janeiro (Telerj), no governo Collor, Cunha segue impávido no principal lugar da Mesa da Câmara, mesmo que dados e valores de contas suas e da família na Suíça já sejam de conhecimento geral. Não renunciará, tudo indica.
No momento daquela revelação, pensou-se que o presidente da Câmara fraquejaria. Se isso ocorreu, não demonstrou. E não se tem mais dúvida de que fará tudo para que qualquer decisão do Conselho de Ética da Câmara sobre as denúncias apresentadas contra ele pelo PSOL e pela Rede só ocorra no ano que vem, na volta do recesso. Eduardo Cunha aspira a escapar pelo esquecimento. Difícil, admita-se.
O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo, escolheu ontem para ser relator do processo de Cunha o deputado Fausto Pinato (PRB-SP), liderado de Celso Russomanno, do mesmo partido e estado. Aliás, Pinato entrou na Câmara com sobras de votos de Russomanno.
O relator pode simplesmente propor o arquivamento do caso. Garante-se que Pinato não tomará esta decisão. Há especulações, ainda, sobre o risco de um ato impopular do relator — pró-Cunha, portanto — atingir seu padrinho Russomanno, mais uma vez candidato à prefeitura de São Paulo.
O presidente da Câmara já provou que não tem limites. Configura-se um quadro ruim, em que uma certa catatonia do Planalto diante do mau momento do país e do governo se soma ao travamento da Câmara, sob as rédeas de Cunha, para tratar de projetos-chave no enfrentamento da crise econômica.
Na quarta, afinal a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou a emenda constitucional que prorroga a DRU (Desvinculação de Recursos da União) até 2023, com a desvinculação de 30% do Orçamento, em vez dos 20% da que expira agora. Como é emenda, há um longo rito até ela ser aprovada em dois turnos no Senado. E quanto mais rapidamente isso ocorrer, melhor para o ajuste fiscal. Mas tudo fica na dependência do plano de Cunha de se agarrar no posto, apesar de todas as provas contra ele. Salvo alguma interferência do Ministério Público ou do Supremo.
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