quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Eliane Cantanhêde: Partido decidiu ir para o tudo ou nada, ou vai ou racha

- O Estado de S. Paulo

Ao concluir que o governo, a presidente da República, o ex-presidente Lula e o próprio partido estavam fadados a ser reféns de um chantagista infinitamente, o PT decidiu partir para o tudo ou nada, o vai ou racha. Chantagens nunca têm fim, mas a votação de um impeachment tem um fim – para o bem ou para o mal.

Foi um movimento calculado, apesar de o Planalto ter trabalhado a favor de Eduardo Cunha, Lula ter cabalado votos para ele e o PT ter se dividido ao longo desses meses de pesadelo e chantagem. Todos eles sabiam que, anunciado o voto da bancada petista contra Cunha, ato contínuo ele abriria o processo de impeachment.

Mas era preciso furar o tumor.

Agora, é cada um por si. Eduardo Cunha vai continuar se debatendo, mentindo e inventando carnes enlatadas para fugir do seu destino praticamente selado, mas ele tem pouco a perder daqui em diante. Dilma Rousseff, ao contrário, está com a cabeça a prêmio e vai ter de lutar com todas as suas forças para evitar ser cassada pelo Congresso. Ou melhor, vai ter de contar com um Lula enfraquecido, um PT dividido e uma base aliada que, de confiável, não tem nada.

Aliás, esse é um dos grandes problemas do governo: boa parte da base aliada de Dilma se confunde com “o partido do Cunha”. São deputados de partidos à direita, capazes de qualquer coisa – inclusive de trair a presidente de quem se dizem aliados. É aí que mora o perigo.

Além disso, o pedido de impeachment foi assinado por dois pesos pesados, os juristas Hélio Bicudo, um dos fundadores do PT, e Miguel Reale Júnior, que mobiliza a oposição, sobretudo os tucanos. E o pior para Dilma: o momento não poderia ser pior: crise política, desastre econômico, altíssima rejeição nas pesquisas, Lava Jato a mil por hora e sociedade mobilizada como poucas vezes se viu.

Bater de frente com Cunha reencontra o PT com a bandeira histórica da ética, já tão esfarrapada por mensalão e petrolão, mas pode custar um alto preço. O partido já mira horizontes sombrios para 2018, com Lula cada dia mais desgastado e nenhum nome alternativo à vista. E a debacle pode vir ainda mais cedo, com o impeachment.

De todo modo, nunca é demais lembrar que governos têm suas armas, Lula está fraco, mas não está morto e o PT não é o PRN de Fernando Collor: tem militância e movimentos sociais capazes de qualquer coisa.

Assim como os três petistas do Conselho de Ética da Câmara ficaram no meio do fogo cruzado do Planalto, de Lula, do PT, de suas bases e de suas próprias consciências, todos os 513 deputados e os 81 senadores estarão igualmente assim diante da possibilidade de impeachment. Bem, se é que todos eles têm base, partido e consciência...

O governo Dilma Rousseff, que começou melancolicamente há menos de um ano, entra agora numa luta de foice no escuro. O desfecho é imprevisível, mas é melhor abrir o processo de impeachment e se livrar da chantagem. Ela pode ou não sobreviver. Se sobreviver, terá uma nova chance, uma espécie de recomeço. Se não, vem aí Michel Temer, sob a inspiração de Itamar Franco.

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