Em questão de dias, as crises política e econômica se agravaram. A prisão do senador petista Delcídio Amaral, acompanhada pela do banqueiro André Esteves, rompeu uma trégua que parecia certa no calendário das possibilidades de impeachment da presidente Dilma Rousseff, que cessaria em março de 2016. As dificuldades para impedir que o déficit fiscal crescesse, e ao mesmo tempo, o cuidado em evitar novos problemas com o Tribunal de Contas da União, levaram à paralisia geral da maior parte das despesas da União. Ontem, foi a vez da economia revelar que seu estado é pior até do que os mais pessimistas imaginavam. O Produto Interno Bruto recuou, no ano até setembro, 3,2%, e 4,5% no terceiro trimestre de 2015 em relação ao mesmo período do ano passado. O consumo das famílias, os investimentos e o PIB tiveram o pior desempenho desde 1996.
Enquanto o governo foi surpreso pela prisão de Delcídio e teme pelo pior, isto é, que eventuais depoimentos do senador aproximem a Operação Lava-Jato do Planalto, a presidente e seus conselheiros apostam fichas na manutenção de Eduardo Cunha na presidência da Câmara, embora ele, metido até o pescoço em suspeitas de corrupção, só tenha serventia hoje para uma coisa: impedir o pedido de impeachment da presidente. O governo passou todo o ano tentando apaziguar sem sucesso um rival perigoso e continua refém dele, em um abraço mortal para o prestígio de ambos.
Prossegue assim o jogo que condena o país a uma recessão dura e prolongada e à descrença política. O mergulho da economia rouba a base na qual o Executivo pode se apoiar para tentar recuperar aos poucos o apoio político, sem o qual move-se pouco e mais devagar do que a situação exige, para debelar a espiral recessiva. A falta desse apoio, por seu lado, é nociva à economia.
O que é pior, a economia ainda não encontrou o fundo do poço: quase todos os componentes do PIB, pela ótica da demanda ou da oferta, estão com variações negativas crescentes na série de quatro trimestres em relação aos quatro anteriores. O destaque é a queda violenta do consumo das famílias. Do último trimestre de 2014 até o terceiro deste ano, ele recuou 5,7%, algo sem precedentes na série histórica desde 1996.
Embora a queda dos investimentos chame atenção pela sua magnitude (12,7% no ano) e por sinalizar que a recuperação produtiva está longe de acontecer, é a derrocada do consumo o fator determinante da recessão, já que seu peso (em torno de 62,5%) é superior ao da formação bruta de capital fixo, de cerca de 18%, no cálculo do PIB. Não há sinais de que o consumo possa se reanimar logo, diante de alto endividamento, juros elevados, crédito apertado e aumento do desemprego. Em relação ao consumo do governo, o ajuste fiscal começou agora a fazer efeito, com a primeira queda (0,4%), em quatro trimestres.
O desempenho piorou e com ele as expectativas para o fechamento do ano, que se deslocaram de 3% para perto de 4% em 2015, contaminando as perspectivas para 2016, outro ano recessivo. Se a atividade econômica parar de piorar e se mantiver estável até o fim do ano que vem, o PIB de 2016 encolherá de 1,5% a 2%. Há quem vislumbre queda na casa dos 3%.
Há poucos fatores contracíclicos em ação, já que o governo perdeu capacidade de realizar uma política imediata nessa direção. O setor externo começou a reagir, depois de 56% de desvalorização do real desde o terceiro trimestre de 2014. A absorção doméstica (consumo das famílias e do governo, mais investimentos) caiu mais de 7% entre o terceiro trimestre de 2014 e o deste ano, enquanto o setor externo contribuiu para que essa queda não fosse significativamente pior. Em outras crises, a reação da balança comercial, via exportações, conseguiu sinalizar e puxar a retomada.
Sem uma alavanca interna, porém, as exportações têm limites. Há uma enorme crise de confiança reprimindo os investimentos e ações para resgatar a credibilidade podem influir positivamente no ritmo da economia. Persistência na arrumação das contas públicas e uma agenda de mudanças que a solidifique no longo prazo, e medidas que abram caminho em todas as áreas para os investimentos privados, em especial na infraestrutura, podem ajudar a reverter o ciclo autoalimentado de pessimismo, que a realidade vem ratificando. O governo deveria tentar de novo sair do isolamento e acenar com rumos claros de reformas, ou as duas crises se aprofundarão.
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