Por Raymundo Costa e Thiago Resende – Valor Econômico
BRASÍLIA - Em negociação na qual a moeda de troca foi a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma, o Conselho de Ética da Câmara adiou a votação do relatório sobre a cassação do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A decisão foi resultado de um impasse: pressionados pela opinião pública, os três representantes do PT no Conselho queriam votar a favor da abertura do processo. De outro lado, ameaçado por Cunha com o impeachment, o Planalto pressionava os deputados a votar contra. No fim do dia, um dos três deputados, Zé Geraldo (PT-PA), desabafou: "A metralhadora está na mão do Cunha
PT negocia para salvar Cunha de cassação
PT negocia para salvar Cunha de cassação
Em negociação na qual a moeda de troca foi a abertura do processo de impeachment do mandato da presidente Dilma Rousseff, o Conselho de Ética da Câmara decidiu adiar a votação do o relatório que recomenda a cassação do presidente da Casa, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), por supostamente mentir à CPI da Petrobras sobre contas bancárias que manteria no exterior.
O adiamento foi resultado de um impasse: pressionados pela opinião pública de seus Estados, os três representantes do PT no Conselho queriam votar favoravelmente à abertura do processo de cassação de Cunha; de outro lado, ameaçado por Cunha com a abertura do impeachment contra Dilma, o Palácio do Planalto pressionava os deputados a votar contra a abertura do processo.
No fim do dia, um dos três deputados, Zé Geraldo (PT-PA), tornou público o que desde cedo se discutia nos bastidores: "A metralhadora está na mão do Cunha", disse, numa referência à faculdade que o presidente da Câmara para decidir monocraticamente sobre a abertura do processo de impeachment da presidente da República.
"PT é PT e governo é governo. Nós somos PT e somos governo. Esta é a crise. [...] Se acontecer de ele [Cunha] 'estartar' e nós sermos os culpados de ter acontecido o impeachment no Brasil? Esta é a reflexão que estamos fazendo. Não é uma decisão fácil porque ela tem que ser nossa. Se você for aceitar a opinião externa da sociedade e do PT, temos que votar pela admissibilidade do relatório", declarou.
O PT receia que, aberto o procedimento, a saída de Dilma torne-se irreversível. "Nós não confiamos no Cunha", acrescentou o deputado. Durante o dia, o presidente do partido, Rui Falcão, tentou conciliar o inconciliável: defender publicamente o voto contra Cunha, enquanto o Planalto nos bastidores atuava a seu favor. A explicação é simples: Falcão acha que Cunha vai autorizar a abertura do processo contra Dilma seja qual for a decisão do Conselho de Ética sobre seu caso.
Um aliado de Cunha disse ao Valor que, se o PT votar pela rejeição do relatório de Pinato, o pemedebista deve decidir pelo arquivamento do pedido de impeachment. Pelo menos o PSD substituiu um integrante do Conselho que pensava em votar contra Cunha. O PT poderia fazer o mesmo em relação a seus deputados, mas prefere não se expor.
Os três deputados - Zé Geraldo (PA), Leo de Brito (AC), Valmir Prascidelli (SP) - reuniram-se e conversaram durante todo o dia. Os votos do PT são decisivos para a abertura ou não do processo. Quase cinco horas depois de sessão no Conselho, a pressão do Palácio do Planalto parecia exercer efeito: Zé Geraldo chamou os jornalistas e disse que o grupo decidira por uma posição "prudente", a fim de evitar qualquer pauta que venha desestabilizar inclusive a democracia do país. "Precisamos ter o cuidado de repensar o nosso voto e até pensar em não admitir o voto do relator", afirmou. O voto do relator Pinato (PRB-SP) é pela cassação de Cunha.
A nova votação pode ocorrer amanhã, mas ainda não tem data marcada. De qualquer forma, já há uma saída honrosa para o recuo ensaiado pelos três deputados do PT: eles votariam um relatório paralelo que prevê uma punição mais branda a Cunha, algo como uma de "censura pública".
A decisão dos três deputados contrariava a recomendação do presidente do PT, Rui Falcão, e até mesmo a maioria da bancada de deputados. Ainda de manhã, 31 dos 60 deputados que integram a bancada petista assinaram uma nota defendendo a abertura do processo contra Cunha no Conselho de Ética - nenhum dos petistas membros do colegiado autografaram o abaixo-assinado.
Antes mesmo de ser aberta a sessão do Conselho de Ética, os deputados discutiam os termos da negociação: Cunha, segundo apurou o Valor, teria ameaçado autorizar a abertura do processo de impeachment de Dilma, caso perdesse no Conselho. O Planalto, então, passou a pressionar os deputados, que, por sua vez, sentem-se pressionados pelos eleitores, depois que pesquisas de opinião apontaram que cerca de 80% da população quer a punição do presidente da Câmara..
Na discussão com os ministros do Palácio do Planalto encarregados da negociação, os três deputados mencionaram o caso do senador Delcídio Amaral (PT-MS), preso na semana passada sob a acusação de obstruir as investigações da Operação Lava-Jato. Os deputados lembraram que o partido foi ágil ao "entregar a cabeça" de um colega líder do governo contra o qual nada havia até agora. Era no mínimo incoerente agora pedir o voto para salvar "o pescoço" de Cunha.
Foram os aliados de Cunha que costuraram o Plano B, o que prevê a "pena mais branda". A ideia era que o relatório de Fausto Pinato (PRB-SP), que opinou pela abertura de processo contra Cunha, fosse rejeitado ontem. A partir daí, segundo apurou o Valor PRO, o deputado Wellington Roberto (PR-PB) apresentaria um novo parecer ao Conselho de Ética sugerindo uma "pena mais branda", que ainda está sendo "construída " mas afastaria a cassação de mandato de Cunha.
A estratégia é usada como argumento para convencer governistas a votar contra o relatório de Pinato sem passar a impressão de que o Congresso fez uma pizza. A decisão agora depende das negociações entre Palácio do Planalto, Eduardo Cunha e o PT. O PMDB comemorou o adiamento como uma vitória. A drástica mudança no discurso dos três petistas do Conselho de Ética indica que eles estão receptivos aos argumentos do Palácio do Planalto. No governo, a ordem é evitar a todo custo a abertura do processo de impeachment.
O advogado do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Marcelo Nobre, apresentou a defesa do deputado durante a sessão do Conselho de Ética.
"Não podemos politizar a Justiça usando uma denúncia que não faz absolutamente prova de nada como base para algo que venha a ser imputado a alguém, principalmente, para alguém em relação a perda de mandato", afirmou Nobre.
Nobre discursou por cerca de 20 minutos. Negou que Cunha tenha mentido à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras, quando afirmou não ter conta no exterior.
O advogado também alegou que não há lei brasileira que obrigasse Cunha a declarar no Imposto de Renda os recursos que tem no exterior, mas são administrados por truste. "Estão querendo e exigindo que meu cliente faça algo que a lei não obriga. Não existe essa possibilidade", completou.
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