• Para a ex-senadora, eventual impeachment de Dilma não inviabiliza as ações no TSE que pedem a cassação da chapa da petista e do vice-presidente Michel Temer por abuso do poder econômico
Cristina Padiglione - O Estado de S. Paulo
A ex-ministra Marina Silva, principal líder da Rede Sustentabilidade, afirmou nesta segunda-feira, 28, ao Estado que "uma nova eleição possibilitaria um julgamento político, ético e moral dos partido". Segundo ela, o eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff não inviabiliza as ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que pedem a cassação da petista e do vice-presidente Michel Temer (PMDB) por abuso do poder econômico na campanha eleitoral de 2014. Marina conversou com o Estado após a gravação do Programa do Jô (TV Globo), em São Paulo. A seguir trechos da entrevista:
Impeachment
O que eu tenho dito é que, primeiro, o impeachment não é golpe, está previsto na Constituição. A Constituição acolhe o pedido de impeachment de qualquer cidadão. Obviamente que vai ser analisada a admissibilidade ou não do pedido que está sendo feito. O presidente Cunha, por razões conhecidas, subtraiu toda a parte que tinha a ver com a corrupção da Lava Jato e ficou só com as pedaladas fiscais.
Obviamente que, como ele é indiretamente implicado, talvez por isso ele tenha subtraído a parte da Lava Jato, mas o processo está em tramitação. Os dados trazidos pela Lava Jato têm reforçado politicamente a tese do impeachment, que está em tramitação dentro do Congresso, porque o impeachment é um processo jurídico, mas também é um processo político. Há uma retroalimentação entre as duas coisas. E, no meu entendimento, quanto mais o lado político é reforçado pelo que está sendo comprovado no âmbito da Lava Jato, mais se impõe a tese de que a saída deve ser pelo TSE. Porque os dois partidos ficaram 20 anos no poder praticando juntos essas irregularidades. As diretorias da Petrobrás foram distribuídas entre o PT e o PMDB, havia uma coordenação entre PT e PMDB para o gerenciamento da propina. Como é que agora a gente pode acreditar que uma parte é punida e a outra parte é ungida ao bastião da salvação dos problemas que eles mesmos criaram?
No meu entendimento, o imperativo ético de que, sem querer pressionar obviamente a Justiça, o TSE, com seus sete ministros, analisando os fatos comprovadamente estabelecidos de que o dinheiro do petróleo foi usado para as eleições, devolva a 200 milhões de brasileiros a possibilidade da escolha de um novo presidente para essa transição de dois anos, com base no debate que dê saídas para um repactuamento da crise que estamos vivendo.
Posição da Rede
A Rede, desde o princípio, colocou a seguinte questão: uma vez aberto o processo, nós iríamos firmar nossa posição no debate. Hoje, a maioria dos parlamentares da Rede tem uma posição de votar favoravelmente ao impeachment. Publicamente, o deputado (Alessandro) Molon tem afirmado a posição dele, contrária a essa tese, mas a maioria tem defendido que irão provavelmente votar com o impeachment. Independentemente disso, é fundamental que a gente busque não a saída mais rápida, mas a saída mais efetiva.
E eu tenho insistido na tese, que ainda que haja uma aparente diferença ou contradição entre as duas forças que hoje estão em disputa, tem um ponto em que elas estão convergindo. De um lado você tem o campo tentando estabilizar a crise, o PT, puxando o PMDB, do outro lado você tem um grupo tentando estabilizar a crise com PSDB puxando PMDB, mas, a maioria dos membros dos dois campos, no meu entendimento, tem um ponto de convergência, que é o arrefecimento das investigações. O que, no meu entendimento, assegura uma saída, com maior efetividade, é o processo no TSE, até porque os cidadãos brasileiros querem resolver a crise, mas querem que a Lava Jato dê continuidade ao seu trabalho de passar o Brasil a limpo.
Acho que uma boa parte de pessoas começa a perceber também a importância desse processo via TSE e a gente não tem que ficar preocupado com o que é mais rápido, a gente tem que se preocupar com o que é mais efetivo. Não são sete juízes, sete ministros passando por cima de uma eleição. São sete ministros, juízes do Tribunal Superior Eleitoral, se comprovado que houve de fato dinheiro da corrupção para a campanha, porque a prática, dentro do governo já foi feita pelos dois partidos e isso está nos autos da Lava Jato. Então, que seja cassada a chapa e que se faça uma nova eleição.
Tribunal Superior Eleitoral
Uma coisa não inviabiliza a outra, no meu entendimento. A saída via TSE tem uma diferença em relação ao impeachment. Numa situação como essa, há três possibilidades: a renúncia, o impeachment ou a cassação, se houver comprovação de fraude. A renúncia tem a legalidade, mas não tem a razoabilidade porque a presidente insiste que ela entende até o ato de renúncia como se fosse fraqueza e o processo do impeachment cumpre com a formalidade, mas não cumpre com a finalidade. Se a finalidade é passar o Brasil a limpo, por que se tira de um partido que é igualmente implicado e entrega-se a outra que é igualmente implicado para que ele agora produza o resultado de corrigir o erro que os dois juntos praticaram? O PMDB e o PT praticaram juntos os mesmos crimes.
O processo no TSE cumpre com a formalidade e cumpre com a finalidade porque devolve a 200 milhões de brasileiros a possibilidade de fazer uma outra eleição e com base em um programa, em um debate em cima da realidade, da forma como ela está posta nua e crua, porque agora não há mais como esconder, como foi escondido, em 2014, eleger quem a sociedade eleger quem a sociedade quer eleger.
A estrutura está pronta, que é a estrutura das eleições municipais. E mais: todos os partidos terão a oportunidade de se reapresentar. E mais: todos os partidos terão a oportunidade de se apresentar. Num momento em que há um descolamento tão grande da sociedade, em relação aos partidos, às lideranças políticas, por razões mais que merecidas desse afastamento, ter a possibilidade de se recolocar, fazendo inclusive autocrítica, apresentando um programa, falando a verdade pra população, talvez seja a grande oportunidade de fato haver um aprendizado com todos os erros que foram cometidos durante todos esses anos, todas essas décadas.
Costumo dizer que a Lava Jato está fazendo o julgamento criminal dos que cometeram crimes e uma nova eleição possibilitaria um julgamento político, ético e moral dos partidos políticos, obrigando-os talvez a terem que fazer uma espécie de ajustamento de conduta. As empresas não estão fazendo acordo de leniência? Por que os partidos não se reapresentam para a sociedade, debatendo condutas, fugindo da mentira, do ataque violento que foi feito em 2014? Para agora de fato reconhecer que numa eleição, a partir das ideias que são expostas e das críticas que são feitas, obviamente , quem escolhe é o cidadão. A alternância de poder não é nem um problema. Não se pode ter um projeto maravilhoso de País que só funciona com um grupo. A alternância de poder é a garantia de que a democracia está funcionando.
Num processo de um novo pacto, estabelecido pelo voto do cidadão, com certeza você teria muito mais sustentabilidade para as medidas que precisam ser tomadas nessa transição. O vice-presidente tem apenas 16 ou 17% de crença do cidadão de que fará um bom ou ótimo governo (segundo pesquisa do Datafolha).
Lava Jato
O que eu acho é que tudo o que está sendo trazido pela Lava Jato deve continuar. Em numa campanha, a sociedade poderá ouvir de fato qual é o compromisso que, de fato, dá suporte à Lava Jato. É isso que a população quer. A população não quer construir a casa em cima da areia da corrupção
Nenhum comentário:
Postar um comentário