O PSD do ministro das Cidades, Gilberto Kassab, liberou a bancada de 31 deputados para votar como quiser no processo de impeachment.
Começa o desembarque
- PMDB formaliza hoje saída do governo; Henrique Alves entrega cargo, e Kassab libera bancada do PSD
Silvia Amorim, Isabel Braga, Simone Iglesias, Catarina Alencastro – O Globo
SÃO PAULO E BRASÍLIA- Às vésperas do rompimento do PMDB, marcado para hoje, o governo sofreu ontem dois novos golpes que revelam o agravamento da crise política: o ministro Gilberto Kassab ( Cidades) admitiu publicamente ter liberado a bancada do PSD para votar livremente sobre o impeachment; e o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, entregou no fim da tarde sua carta de demissão, justamente quando o Planalto fazia esforço para manter a fidelidade dos sete ministros peemedebistas em defesa do mandato da presidente Dilma Rousseff.
Apesar dos esforços do Planalto e até de uma conversa do ex- presidente Lula com o vice- presidente Michel Temer, o PMDB formaliza hoje, em reunião do Diretório Nacional, o fim da aliança com o governo. Henrique Alves foi o primeiro ministro do partido a entregar o cargo, e, em carta à presidente Dilma, disse que o diálogo entre a legenda e o governo “se exauriu”.
Com 31 deputados, o PSD também começou a dar os primeiros passos para se afastar do PT e da presidente às voltas com um processo de impeachment. Esse movimento envolveu ações costuradas em Brasília e São Paulo, que ganharam corpo nos últimos dias. Em São Paulo, onde ontem à noite participou de um evento na Assembleia Legislativa, Kassab admitiu que os deputados de sua bancada votarão como quiserem, mas negou a existência de um racha na legenda quando indagado qual seria a voz majoritária no partido, se a favor ou contra o governo.
— Não existe racha. Em partido que libera não existe racha. O PSD é um partido unido em cima de propostas claras para o país. Em algumas circunstâncias, entende que, até pela razão de ser partido novo, precisa da liberação ( da bancada) para que cada um tenha o conforto de votar de acordo com a sua história — disse Kassab.
A decisão foi tomada semana passada, logo depois que o partido permitiu que um de seus parlamentares, Rogério Rosso (PSD- DF), assumisse a presidência da comissão especial do impeachment na Câmara.
O partido ocupa desde dezembro de 2014 o Ministério das Cidades, um dos mais cobiçados da Esplanada. Mas lideranças do PSD dizem que não há condições políticas para o partido impor uma postura favorável ao governo a seus parlamentares. Nas contas de dirigentes da sigla, ao menos metade da bancada apoia hoje o impeachment de Dilma.
— Os parlamentares estão sofrendo uma pressão muito grande de suas bases. Eles sabem que dependem dessas bases nas eleições, e neste momento fica difícil ir contra o que elas pedem — explicou uma liderança do PSD sobre o movialega mento pró- impeachment.
Diferentemente do PMDB, que marcou para hoje uma reunião para anunciar o afastamento do governo, o PSD não tem reuniões marcadas para isso. O ministro das Cidades, Gilberto Kassab, fundador do PSD, vinha evitando falar publicamente sobre o futuro da sigla. Por isso, o desembarque oficial do governo ainda é considerado algo remoto por lideranças da legenda.
Em São Paulo, uma outra frente do PSD que converge para o descolamento gradual do governo Dilma e do PT deverá ser oficializada nos próximos dias. O PSD terá uma candidatura a prefeito de São Paulo de oposição ao PT. Até pouco tempo atrás, Kassab costuravam uma candidatura neutra na maior cidade do país com o candidato Ricardo Patah. Nos últimos dias, o ministro acertou com o ex-tucano Andrea Matarazzo os detalhes finais da filiação dele ao PSD para sair candidato a prefeito de São Paulo.
— É tudo uma coisa só. São movimentos que indicam a forte tendência de afastamento do PSD do PT — afirmou uma liderança paulista do PSD.
No PMDB, o apoio ao governo está em franca deterioração. Ministro mais próximo de Michel Temer, Henrique Eduardo Alves pediu demissão do cargo de ministro do Turismo no fim da tarde de ontem. Há menos de um ano no comando da pasta, Alves se tornou ministro na “cota pessoal” de Temer em abril de 2015, quando Dilma resolveu agradar ao vice e se indispôs com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB- AL).
Alves assumiu no lugar de Vinícius Lages, afilhado político de Renan. A troca de ministros, à época, foi vista como gesto equivocado de Dilma, que comprava briga com um dos seus principais fiadores no Congresso. Assim que Lages foi demitido, Renan pôs em votação no Senado projeto que tinha forte resistência do Planalto: a mudança de indexador das dívidas dos estados e municípios com a União, que recalculou para menos os débitos.
Antes de entregar a carta de demissão, Alves conversou com Temer. Pesou na decisão a relação com o vice e os 46 anos de filiação ao PMDB. Entre os peemedebistas próximos a Temer, a permanência de Alves vinha causando mal-estar, pela iminência do desembarque. Ontem, na véspera da reunião do Diretório Nacional, Alves decidiu sair.
Na carta entregue à presidente, o peemedebista “coerência ideológica” e diz que o diálogo “infelizmente, se exauriu”.
“Todos sabem que sempre prezei o diálogo permanente. Diálogo este que, lamento admitir, se exauriu. Assim, presidenta Dilma, é a decisão que tomo. Estou certo de que sendo a senhora alguém que preza acima de tudo a coerência ideológica e a lealdade ao seu próprio partido, entenderá a minha decisão”, justifica a demissão.
Henrique Alves afirma, ainda, que a decisão ocorre porque seu partido resolveu seguir outro caminho e que deve ficar do lado de Temer, “companheiro de tantas lutas”: “O momento nacional coloca agora o PMDB, meu partido há 46 anos, diante do desafio maior de escolher o seu caminho sob a presidência do meu companheiro de tantas lutas, Michel Temer”.
A reação do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), ao saber da demissão de Alves do Ministério do Turismo, deu o tom de como o governo atuará para reagrupar a base após o desembarque do PMDB:
— Esse ministério do Henrique Alves vai ser ótimo para redistribuir para quem quer ficar com o governo — afirmou ontem o deputado. (Colaborou Júnia Gama)
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