- Valor Econômico
• BC ganhará foro privilegiado, mas não garante mandato fixo
Considera-se, no governo de Michel Temer, que está chegando a hora de lidar com o tema da autonomia operacional do Banco Central. Pela primeira vez na história recente haveria um consenso entre o Palácio do Planalto e o Ministério da Fazenda, além da própria autoridade monetária, de que a aprovação de uma lei formalizando a autonomia é uma medida que não custa um centavo e pode ter um efeito notável sobre as expectativas dos agentes econômicos.
A proposta deverá ser feita por emenda constitucional (PEC) porque uma das suas finalidades será dar foro privilegiado à diretoria do BC, ao mesmo tempo que retira o status de ministro que é conferido hoje a seu presidente. Foro privilegiado só pode ser concedido por emenda constitucional.
Ainda não há definição sobre se haverá, no texto da PEC, a instituição de mandatos fixos para a diretoria do BC, não coincidentes com o do presidente da República. É certo, porém, que vai contemplar autonomia orçamentária e de uso da taxa básica de juros como instrumento para o cumprimento do regime de meta para a inflação.
Segundo avaliação política do governo, a PEC do Banco Central seria a terceira na ordem de prioridades, precedida da PEC 241, que estabelece um teto para o aumento do gasto público, e a da reforma da previdência social que deve ser enviada no próximo mês ao Congresso.
Demonizado como uma instituição capturada pelos banqueiros e a serviços dos rentistas, o Banco Central e sua eventual autonomia chegou ao paroxismo na campanha eleitoral de Dilma Rousseff em 2014, quando uma das peças de propaganda da candidata do PT dizia que um Banco Central autônomo retiraria a comida da mesa dos cidadãos.
O Banco Central e a sociedade brasileira pagaram caro pela perda de credibilidade ao longo do governo passado e pelo achincalhamento a que foi submetido durante a disputa eleitoral. O custo, nesse caso, vem em forma de descoordenação de expectativas inflacionárias e maior taxa de juros necessária para conter a escalada dos preços.
Fontes muito próximas ao presidente Temer asseguraram que ele não faz qualquer objeção à ideia de autonomia.
Esse é um tema que, vira e mexe, assim como entra, sai, da agenda do governo, e tem sido mais objeto de confusão do que propriamente de discussão. Além das nuvens ideológicas que até agora obscureceram o debate.
Há, tramitando no Congresso, algumas propostas a exemplo da que foi feita em 2003 pelo deputado, hoje presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em co-autoria com o então deputado Roberto Brandt, e a patrocinada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ambas conferem mandatos aos diretores do BC.
O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, já esteve com Maia e recentemente conversou sobre esse assunto com os ministros chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria de Governo, Geddel Vieira.
Do Banco Central saiu uma única proposta até hoje, que foi elaborada pelo ex-presidente do BC Arminio Fraga e entregue a Antonio Palocci, ministro da Fazenda, quando da transição do governo de FHC para Lula. Na época, Ilan participou da confecção da minuta do projeto de lei complementar.
Nessa havia a definição de mandato para a diretoria do Banco Central, com a sua nomeação e destituição tendo que ser aprovada pelo Senado. Hoje só a nomeação é precedida de sabatina e aprovação pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e pelo plenário do Senado.
Autonomia e mandato fixo e não coincidente são premissas para o bom funcionamento do regime de metas para a inflação. É a forma de isolar o Banco Central das pressões políticas que, em geral, se traduzem pela opção por mais inflação em troca de mais crescimento e menos juros no curto prazo.
A PEC, agora, vai tratar da autonomia operacional ou "técnica" como o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, prefere chama-la e deverá consolidar o que já existe de fato, mas não de direito.
Outra questão que se coloca como parte da proposta de autonomia é a limitação para o Banco Central gerar despesas fiscais, seja na sua função de emprestador de última instância ou nas operações do mercado de câmbio. A ideia seria a de estabelecer um limite de perdas que o BC pode ter nas operações socorro ao sistema financeiro ou como carregador de reservas cambiais, acima do qual a instituição teria que ter autorização do Conselho Monetário Nacional (CMN). O limite seria objeto de regulamentação, mas não deveria ultrapassar algo na faixa de 0,2% do PIB ao ano, como chegou a sugerir Arminio em texto posterior à proposta que fez.
Como não é adequado colocar questões dessa natureza na Constituição, elas ficariam para uma futura regulamentação.
Embora não seja parte do núcleo da política fiscal, que hoje demanda soluções urgentes e está na dependência da aprovação da PEC 241, que estabelece teto para o gasto público, a autonomia do Banco Central, conforme a redação da medida, terá implicações importantíssimas para a política macroeconômica futura.
Um Banco Central com autonomia - independente do adjetivo que a acompanhar, se operacional ou técnica - terá ganho de credibilidade. Consequentemente, poderá praticar juros menores para manter a inflação na meta - o que não acontece há anos - e o próprio patamar da inflação pode ser menor para a mesma taxa de juros praticada.
PEC 241
"É a PEC 241 ou o caos", tem alertado o ex-ministro Delfim Netto. Dito de outra forma por ele mesmo: "Ou se aprova a PEC do gasto público ou acabou o governo". Delfim almoçou com o presidente da República, Michel Temer, na sexta feira da semana passada. Da conversa saiu convencido que Temer não será candidato em 2018 e que vai empenhar todos os esforços possíveis para aprovar, até novembro, a PEC que congela a despesa pública em valores reais por até 20 anos. Aprovada ou muito bem encaminhada a PEC, o Banco Central pode começar a cortar a taxa de juros (Selic) que está parada em 14,25% ao ano desde julho de 2015.
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