Derrotado no Rio, Marcelo Freixo (PSOL) avalia que a esquerda vive o pior momento desde a ditadura, crise que, acredita, ajuda a explicar sua derrota, informam Miguel Caballero e Marco Grillo.
Freixo admite ter demorado para reagir aos ataques de Crivella.
Freixo vê pior crise da esquerda e faz autocrítica
• Deputado diz que errou no início do segundo turno e que PSOL precisa chegar à Zona Oeste
Marco Grillo e Miguel Caballero - O Globo
No day after de sua derrota na eleição para prefeito do Rio, Marcelo Freixo (PSOL) citou três principais razões para explicar o resultado. A crise da esquerda no Brasil, que ele classifica como a pior desde a ditadura militar, a incapacidade de o partido penetrar na Zona Oeste e, como autocrítica, afirmou que sua campanha ficou “atordoada” e demorou a reagir aos ataques sofridos no início do segundo turno.
Freixo aproveitou a segunda-feira para descansar da maratona de campanha. Usou bermuda o dia inteiro, o que não fazia desde antes da eleição, e só à tarde saiu de casa. Arrumou estantes e iniciou a revisão de um livro, escrito por Julio Ludemir, que contará dez episódios de sua vida — “não é biografia, sou muito jovem para ter uma”. No fim da tarde, ele se reuniu com sua equipe no QG da campanha, na Glória, para analisar com mais profundidade o mapa de votação pelos bairros da cidade.
— Arrisco dizer que é o pior momento para a esquerda desde a ditadura. Não lembro de uma crise tão grande. A esquerda não deve dizer que a culpa é de outros atores e esquecer a sua responsabilidade. É hora de autocrítica e entender os erros — disse Freixo, em entrevista ao GLOBO. — Todo projeto de esquerda está pagando caro por isso. Há o fim de um ciclo, erros do modelo de governabilidade, erros cometidos principalmente pelo PT. Mas não adianta crucificar o PT. É fundamental que a esquerda não se vitimize.
Às dificuldades nacionais da esquerda, Freixo acrescenta um dado específico do Rio, que se comprovou nas urnas: o PSOL não tem penetração na Zona Oeste, onde perdeu por grande diferença para Crivella.
— É um desafio. É só por causa da milícia? Não é. Fato é que a candidatura do Crivella teve um cunho popular muito forte. Vem da Universal e da Record, que têm penetração grande no setor popular — analisou. — Não adianta querer resolver o distanciamento da Zona Oeste na eleição. É até mais fácil dialogar fora desse período, porque você não está ali pelo interesse imediato, a sua credibilidade aumenta. A gente conseguiu entrar um pouco, mas isso tem de ser permanente. Esse trabalho de base tem que chegar na Zona Oeste. Ainda é fraco, ainda é precário, da esquerda como um todo.
REAÇÃO DEMORADA
Instado a fazer uma autocrítica, Freixo cita a primeira semana do segundo turno como decisiva, diz que faltou maturidade ao PSOL, e que a campanha demorou a atacar Crivella.
— A gente foi surpreendido com os ataques pelo WhatsApp, tipo “ele vai mudar o sexo das crianças, vai liberar droga, acabar com a PM”. Aquilo atingiu a gente. Era uma rede subterrânea, onde não conseguíamos entrar. A gente perdeu uma semana ali, ficamos muito atordoados — reconheceu. — Estava esperando uma crítica política, “ah, é de esquerda, é radical”. Acho que esse foi um erro. Faltou maturidade ou instrumento para responder. Só depois do debate da Band fomos para o ataque.
Freixo rebate outras duas críticas comuns à campanha. O deputado acredita que o discurso na Lapa, após o resultado do primeiro turno, não afastou possíveis eleitores. Na ocasião, ele afirmou que o resultado era uma “resposta do Rio ao partido golpista do PMDB”.
O deputado argumenta que, na sequência da campanha, não tratou mais de impeachment. Ele questiona ainda um possível sectarismo do PSOL.
— Cinco mil pessoas participaram do programa de governo. Isso não é um partido fechado. Tivemos apoio de partidos no segundo turno, como a Rede e o PSB — afirmou, acrescentando que sua campanha se reuniu com setores empresariais, com os quais o partido não tinha relação antes da eleição.
Raro candidato que não teve os serviços de um marqueteiro, Freixo admite que o PSOL é resistente a esta figura, mas lamenta não ter feito mais pesquisas de opinião para ajudar a traçar estratégias.
— Marqueteiro, a gente não gosta, a gente não trabalha assim. Foge muito à nossa natureza de fazer política. A gente tem uma coordenação da campanha coletiva, é a nossa maneira. Vamos bem nos debates, os programas de TV foram muito elogiados, temos boa equipe nas redes, no audiovisual. A gente não é ruim na linguagem — acredita. —Não fizemos nenhuma pesquisa qualitativa. A gente queria, mas é muito caro. Cada uma era quase R$ 100 mil, a mais barata que a gente viu custava R$ 81 mil.
Freixo também fugiu do protocolo na noite de domingo, quando não fez o tradicional telefonema ao adversário reconhecendo o resultado:
— Por que ligaria? Esse é um protocolo muito hipócrita. Eu não ligava antes da eleição para ele, não vou ligar para ele agora e dizer “deixa disso, vamos dar risada”. A campanha dele foi baixa, desonesta. Desejar um bom governo é honesto, eu realmente desejo que ele acerte. Não torço pelo quanto pior, melhor.
Embora diga torcer para o governo do adversário dar certo, Freixo vê poucas chances:
— É difícil. Quando olhei para aquele palanque ... É a velha política, distribuição de cargos. A cada nome de secretário (cogitado), fica pior a situação.
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