• A coincidência da derrocada financeira do Rio de Janeiro com a prisão de Cabral e associados leva à ideia equivocada de que o combate aos corruptos resolve os problemas
Termo usado para designar uma conjunção de fatores cujo desfecho é catastrófico, “tempestade perfeita” entrou nas análises sobre a conjuntura econômica nacional a partir de 2013, quando as perspectivas internas se deterioravam e aumentavam as expectativas no mundo de uma elevação dos juros nos Estados Unidos. Inflação interna, recessão e consequente desemprego seriam turbinados por uma acelerada desvalorização do real, promovida pela corrida de divisas de mercados como o brasileiro em busca de juros menos baixos nos EUA. Em alguma proporção, a tempestade ocorreu.
E o termo volta agora, para ser aplicado à situação do Rio de Janeiro, em que a uma seriíssima crise fiscal se adiciona uma hecatombe política, causada pela desmontagem, a partir da Lava-Jato, do esquema de corrupção que funcionou no estado durante os governos de Sérgio Cabral, inquilino de Bangu 8 desde quinta-feira.
Nos moldes do esquema lulopetista desvendado na Petrobras, Cabral e grupo do seu PMDB ordenharam propinas de empreiteiras, em troca de obras no estado.
As dimensões do escândalo foram ainda ampliadas porque as prisões de Cabral e associados ocorrem enquanto é debatido na Assembleia Legislativa (Alerj) um imprescindível pacote de austeridade, para tornar administrável um quadro em que, como anuncia o governador Luiz Fernando Pezão, apenas sete meses da folha de salários do estado estão garantidos no ano que vem. Sem se aumentar contribuições à previdência fluminense, cortar gastos em geral, conter privilégios de castas da burocracia etc. não se irá muito longe.
A crise fiscal já chicoteia há meses aposentados, pensionistas e servidores públicos em geral e cada vez mais pune a população com uma deficiente prestação de serviços. E tende a piorar. Torna-se, então, fácil para políticos demagogos relacionarem a roubalheira com a falta de dinheiro, uma forma de tirar a importância crucial que têm medidas — tipo a elevação da contribuição previdenciária — para conter a crise. Sequer os números são comparáveis: estima-se em pouco mais de R$ 200 milhões o dinheiro surrupiado por Cabral e companheiros, enquanto o déficit orçamentário está na faixa dos R$ 17 bilhões.
Não se pode menosprezar o efeito deletério da desonestidade nos cofres públicos. Mas, daí a achar que as agruras fiscais da Federação brasileira se explicam só pela roubalheira, é ir muito longe. Deixam-se de lado erros crassos de política econômica e administrativos. No raciocínio inverso, o desequilíbrio estrutural das finanças fluminense, de outros estados e da União seria resolvido à base do encarceramento de corruptos, como dão a entender os que se opõem ao ajuste.
Cada coisa é uma coisa, e a imperiosa punição de ladrões do dinheiro público não substitui medidas técnicas de correção dos desequilíbrios financeiros.
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