-Folha de S. Paulo
Plano de Macri, fazer reforma gradual com ajuda de dívida externa, não deu certo
A Argentina foi ao FMI (Fundo Monetário Internacional) antes de ir para o vinagre. Em vez de pagar para ver se a crise passava, o governo dos vizinhos preferiu se precaver. Pediu logo um dinheiro emprestado ao Fundo.
Além do mais, em outubro de 2019 haverá eleições para presidente e Parlamento. É melhor passar um vexame agora do que quebrar durante a campanha eleitoral.
No essencial, o problema argentino é ter de pedir dinheiro emprestado no exterior a fim de cobrir o buraco nas contas públicas. Isto é, o governo da Argentina faz um monte de dívida externa para cobrir seu excesso de gastos.
Nos últimos dois anos, no governo de Mauricio Macri, quase 70% do déficit foi coberto por endividamento externo. Não dá mais para ser assim. Os donos do dinheiro do mundo, argentinos inclusive, acabaram de avisar que não vão emprestar tanto e que o negócio vai custar mais caro. O governo vai ter de fazer mais arrocho.
A Argentina vai pedir uma linha de crédito de US$ 30 bilhões ao FMI, um cheque especial, dinheiro a ser sacado de acordo com a necessidade. A vantagem desse tipo de acordo é evitar que o Fundo se intrometa demais na política econômica do país. Mas essa linha de crédito, rara, em geral é oferecida para países que costumam ter contas em ordem, mas foram abalados por algum choque.
Esses US$ 30 bilhões cobririam quase todas as necessidades de financiamento do governo até o fim de 2019. Para este ano, na verdade, a situação estava quase resolvida. Viver da mão para boca, porém, é problema, ainda mais quando o dinheiro começa a ficar mais caro e escasso no mundo. Os países mais necessitados, caso da Argentina, apanham primeiro.
O governo argentino, repita-se, depende de financiamento externo para cobrir seu déficit. A dívida pública, em boa parte externa, "dolarizada", cresce ainda mais com a desvalorização do peso, portanto.
Como desgraça pouca é bobagem, neste mês o banco central argentinoelevou a taxa básica de juros de 27,5% ao ano para 40%, outro fator de crescimento extra da dívida.
Indo ao FMI, o governo Macri quer tapar essas sangrias, desvalorização do peso e juros suicidas.
O plano de governo de Macri era reduzir o déficit do governo de modo gradual, enquanto fazia reformas ditas liberais. Trocando em miúdos, limitou o arrocho do gasto público a fim de evitar que o pau quebrasse no país, em geral politicamente inflamável.
O PIB voltara a crescer em 2017. O déficit de transações com o exterior também (o comércio de bens e serviços, ou déficit em conta corrente), chegando a 4,8% do PIB em 2017, nível que em geral é sinal de crise próxima. Para o FMI, o déficit aceitável da Argentina é de 2,5% do PIB.
As importações cresceram. As exportações argentinas, no entanto, caíram calamitosamente desde meados da década passada. Logo, a Argentina não faz dólares por meio do comércio. Além do mais, recebe pouquíssimo investimento externo em empresas e negócios (investimento direto do exterior) e paga juros da sua dívida pública lá fora.
Para piorar, os argentinos não têm bem uma moeda nacional e, sempre que podem, colocam sua poupança financeira em dólares.
A Argentina vivia, portanto, em equilíbrio precaríssimo, vivendo de dívida externa até que pudesse cobrir seus déficits, aos poucos, com cortes paulatinos de gastos e aumento de receita de impostos, derivadas de crescimento maior da economia. Não deu tempo.
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