Francisco Leali | O Globo
BRASÍLIA – A votação na Câmara dos Deputados que resultou na aprovação de um ato que revoga decreto presidencial poderia ser entendida apenas como um aviso ao Planalto. Mas as cenas da tarde de terça-feira parecem-se mais com uma lição de política real. A sessão contém todos os lances de que o Executivo precisará mais do que discurso para obter o referendo do Congresso às suas propostas.
No dia que antecedeu a apresentação de uma proposta de emenda constitucional, partidos simpáticos à nova gestão disseram “não” ao líder do governo.
Foram duas derrotas seguidas. Na primeira, 367 votos contra 57. Na segunda, 325 a 54. Onde estavam os aliados do presidente Jair Bolsonaro nessa hora? Votando contra ele.
Na presidência da sessão, Rodrigo Maia (DEM-RJ), cujo partido ocupa a Casa Civil e tem outros dois representantes no primeiro escalão do governo, interpretou um papel que parecia previamente acertado.
Cena 1: entra na pauta um tema que contraria interesses do Palácio do Planalto. Nenhum dos partidos que querem ser aliados do Executivo se opõe, muito menos o presidente da Câmara.
Cena 2: Derrotado o governo numa primeira rodada de votação, Rodrigo Maia se ausenta. Volta tempos depois. Na sua ausência, o barco seguiu sem solavancos, sem protestos de governistas de raiz ou futuros adesistas.
Cena 3: Maia inicia o processo da segunda rodada de votação, e o líder do governo libera seu bloco. Um dos primeiros a indicar que o partido deveria votar contra o governo é justamente o DEM de Maia.
A proposta de decreto legislativo aprovada revoga texto assinado pelo vice Hamilton Mourão, numa interinidade na Presidência (o assunto ainda vai para o Senado). O texto ampliou a lista de servidores com poderes para classificar informações ultrassecretas e secretas.
Cai o pano e o DEM pede uma reunião com o presidente. Oferece o ombro amigo, desde que tenha mais poder no Executivo. E tenta arrancar do chefe do Executivo o entendimento de que a campanha acabou, como quem murmura a frase “bem-vindo ao deserto do real”.
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