terça-feira, 10 de março de 2020

Bernardo Mello Franco - A novela de Regina Duarte

- O Globo

Regina Duarte assumiu há seis dias e já parece estar na corda bamba. Ontem a atriz foi desautorizada duas vezes pelo governo que passou a integrar

Regina Duarte assumiu há seis dias e já parece estar na corda bamba. No domingo, a atriz disse que uma “facção” quer derrubá-la da Secretaria da Cultura. O desabafo só aumentou a agressividade da ala mais radical do bolsonarismo.

O ideólogo Olavo de Carvalho, guru do presidente, escreveu que Regina “não está boa da cabeça” e “não deve ocupar cargo nenhum”. Em vez de receber solidariedade, a atriz foi desautorizada duas vezes num intervalo de poucas horas.

De manhã, o ministro Luiz Ramos foi às redes para criticar sua entrevista ao “Fantástico”. Disse que o uso do temo “facções” indica divisões “inexistentes e inaceitáveis” no governo. À noite, o Planalto cancelou a nomeação de Maria do Carmo Brant de Carvalho. Ela seria uma das principais integrantes da equipe de Regina.

A assistente social foi nomeada ontem para chefiar a Secretaria da Diversidade Cultural. No fim do dia, o Planalto cancelou o ato em edição extra do “Diário Oficial”. Maria do Carmo havia sido tachada de esquerdista por blogueiros ligados ao governo.

Regina também teve sua autoridade contestada pelo presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. No domingo, ela indicou que pretende se livrar do subordinado. Ontem ele a desafiou publicamente a demiti-lo.

O fogo amigo sugere que Regina foi ingênua ao acreditar que teria carta branca para montar seu time. A atriz também parece ter subestimado as pressões que sofreria no cargo. Em pouco mais de um ano, outros três secretários foram ejetados da mesma cadeira.

O bolsonarismo se alimenta da guerra cultural permanente. Quem ousa resistir ao sectarismo tem poucas chances de sobrevivência. Regina tem se equilibrado na tentativa de agradar os amigos da classe artística sem atiçar os radicais de direita.

No discurso de posse, ela prometeu “pacificação e diálogo permanente”. No “Fantástico”, disse que ninguém vai “fazer filme para agradar a minoria com dinheiro público”. Pelas reações irritadas, o papel duplo não convenceu ninguém. Seguindo este roteiro, a novela arrisca virar uma minissérie.

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