Segundo economistas, parceria entre Executivo e Legislativo para dar andamento às reformas pode reduzir incertezas e atrair investimentos
Cleide Silva, Douglas Gavras e Márcia De Chiara | O Estado de S.Paulo
Medidas que possam reduzir a exposição do Brasil ao caos verificado na segunda-feira, 9, em todo o mundo passam por entendimento entre Executivo e Legislativo para iniciar, de imediato, as reformas urgentes como a administrativa, a tributária e a PEC emergencial, segundo vários economistas ouvidos pelo ‘Estado’.
Mas há também quem defenda a continuidade da redução de juros, liberação de compulsórios e até a suspensão do teto de gastos por dois anos.
“Se tivermos clareza sobre as reformas, como elas vão andar, se virmos um clima de parceria entre Executivo e Congresso em volta de uma agenda que permita reduzir a incerteza doméstica, melhoraria o ambiente de negócios e tornaria o Brasil muito mais interessante do ponto de vista do investimento”, diz Armando Castelar, coordenador da área de Economia Aplicada do Ibre/FGV.
Para José Roberto Mendonça de Barros, economista e sócio da MB Associados, a área de infraestrutura é a que mais precisa de investimentos no momento. “A lei do saneamento, por exemplo, geraria grandes obras públicas e teria efeito social enorme, como a geração de empregos.”
Já Bráulio Borges, pesquisador do Ibre, acredita que a agenda da infraestrutura teria enorme potencial não só para dinamizar a atividade no curto prazo, como aumentar a produtividade brasileira no médio e longo prazo. “Mas essas coisas não saem do papel do dia para a noite.”
De imediato, Borges defende o uso da política monetária para atenuar o impacto do turbilhão externo provocado pelo coronavírus e acentuado pela guerra do petróleo. Ele lembra que, assim como na crise de 2008, hoje o efeito líquido da alta do câmbio e da queda das commodities é desinflacionário. “Por isso há espaço para o Banco Central cortar juros e tentar reativar a economia como já fez no passado.”
Teto de gastos
Sérgio Vale, da MB Associados, também acredita que há espaço para o BC continuar cortando juros, que, para ele, ainda são muito elevados no Brasil na comparação com o resto do mundo. Ele lembra que a regra do teto de gastos impede o aumento dos investimentos públicos e acredita que o mercado faria uma leitura ruim se as regras fossem mudadas, mesma opinião de Borges, para quem não se deve mudar regras “no olho do furacão”.
“Mexer no teto de gastos é suicídio”, concorda Castelar. O professor da Universidade de Brasília, José Luís Oreiro, pensa de forma diferente. “É preciso mudar a política econômica e suspender o teto de gastos por dois anos para aumentar investimentos públicos. Para ele, se o ministro da Economia, Paulo Guedes, não mudar a política econômica, “então que se mude o ministro”.
Para enfrentar o choque externo, Samuel Pessoa, professor da FGV, também defende urgência na aprovação das reformas para arrumar o desequilíbrio fiscal. Isso abriria espaço para uma política fiscal contracíclica, com estímulo à demanda. Ele admite, porém, que o desentendimento entre Executivo e Legislativo impede o processo.
“O governo já estava meio perdido antes da semana trágica”, afirma Mendonça de Barros. O melhor seria o ministro Guedes parar de falar em dólar e se concentrar nas reformas.”
O que fazer para enfrentar a crise?
José Roberto M. de Barros, economista e sócio da MB Associados
‘País precisa de mais investimento’
“A melhor coisa a ser feita é um trabalho construtivo entre Executivo e Legislativo para acelerar a aprovação da PEC emergencial, que significaria inequívoca melhora na questão fiscal. São necessárias medidas que permitam mais investimentos, como a lei do saneamento básico, que geraria obras públicas e teria enorme efeito social. Outro ponto é a reforma administrativa. De resto, é manter a calma. Não podemos controlar o que vem de fora, mas quem opera câmbio é o Banco Central. Não é papel de ministro falar sobre isso.”
Samuel Pessoa, economista e professor da FGV
‘Reformas trariam equilíbrio fiscal’
“A prioridade é aprovar as reformas emergencial e administrativa. O efeito imediato da aprovação seria arrumar o equilíbrio fiscal estrutural. Essa arrumação abriria espaço para uma política fiscal contracíclica, mas só se criarmos instituições que sinalizem esse equilíbrio lá na frente. As dificuldades do Executivo e Legislativo em fazer política dificultam a aprovação de reformas e a construção do estabelecimento de instrumentos para uma política fiscal. Sem isso, há menor capacidade de enfrentar o choque externo.”
Bráulio Borges, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia
‘Há espaço para a política monetária’
“O efeito líquido de tudo isso que está acontecendo é desinflacionário. Por isso, há espaço para a política monetária reagir a isso, mas talvez não seja suficiente, pois a atividade vem decepcionando, mesmo com os juros num patamar bastante baixo. Talvez seja preciso outros estímulos. O governo já fala em mais uma rodada de liberação de FGTS. Liberação de compulsório tem o potencial de ajudar, mas o feito não é garantido. No entanto, mudar a regra do teto no meio desse turbilhão todo pode gerar muito ruído.”
José Luís Oreiro, professor da Universidade de Brasília (UnB)
‘Suspender teto por dois anos’
“É preciso parar as reformas que estão em transição e focar em garantir a segurança da população e compensar os efeitos recessivos. Só ter um remédio para doenças diferentes é coisa de maluco. É preciso mudar a política econômica, suspender o teto de gastos por dois anos para aumentar os investimentos públicos. Se investir em infraestrutura, o efeito aparece em três meses. Dificilmente o ministro da Economia, Paulo Guedes fará isso. Se o ministro não mudar a política econômica, então, que se mude o ministro.”
Armando Castelar, coordenador de Economia Aplicada do Ibre/FGV
‘Mexer no teto de gastos é suicídio’
“O que o governo pode fazer é reduzir a incerteza. Fazer parceria com o Congresso com uma agenda clara para o andamento das reformas. Isso diminuiria a incerteza doméstica e melhoraria o ambiente de negócios. Desta forma, o País ficaria mais interessante para atrair o investimento. Cortar juros, fazer política parafiscal e mexer no teto de gasto vão na direção errada. Mexer no teto de gasto é suicídio, pois vai introduzir incertezas sobre a situação fiscal. É preciso dar uma parada e tirar o Banco Central de cena.”
Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados
‘Governo está de mãos atadas’
“O governo está sem opções, com as mãos atadas, como o resto do mundo. A regra do teto de gastos impede o aumento de investimentos públicos e o mercado faria uma leitura ruim se as regras forem mudadas. O jeito seria continuar cortando juros, que ainda estão elevados no Brasil na comparação com o resto do mundo. O País deve fazer um esforço para que a reforma tributária ande o mais rápido possível, o que sinalizaria uma recuperação mais acelerada, sem jogar fora o esforço fiscal que foi feito até agora.”
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