Depois
de Coaf, Receita e PF, Bolsonaro vai meter a mão na Anvisa por capricho?
Luiz Henrique
Mandetta foi demitido por propor o isolamento
social, Nelson Teich se
demitiu por não engolir a cloroquina, Eduardo Pazuello é humilhado por
tentar viabilizar uma vacina em massa para o País. Estão todos errados e só o
presidente Jair Bolsonaro está
certo? Ou, entre a vida dos brasileiros e suas conveniências políticas, ele
fica com a reeleição?
Já
que os dois médicos se recusaram a fazer o jogo sujo, ele convocou o general da
ativa para bater continência a tudo o que lhe vier na cachola e avisa: “Quem
manda sou eu, não vou abrir mão da minha autoridade”. Pazuello concorda,
pateticamente: “É simples. Um manda, o outro obedece”.
O general diz, o capitão desdiz. E o que o general faz? Abaixa a cabeça e diz que foi “mal interpretado” ao anunciar a compra de 46 milhões de doses da vacina Coronavac assim que obtivesse o registro da Anvisa. Como alguém desmente o que escreveu em ofício e disse em vídeo para mais de 20 governadores? Vergonha alheia. Forças Armadas, Exército e oficiais, o que acham dessa vassalagem inominável?
Ao
desautorizar a aquisição de vacinas anunciada pelo ministro – que passou meses
interino, em plena pandemia –, Bolsonaro falou em “traição” e digitou no
Twitter: “NÃO SERÁ COMPRADA”. No dia seguinte, recorreu ao morde-e-assopra que
usava com Sérgio Moro,
Mandetta e Paulo Guedes:
incorporou o personagem simpaticão e foi visitar o general, que está com covid
e fez papel e cara de bobo ao ser paparicado pelo chefe.
É
nessas horas que a gente vê quem é quem. Bastam uma visitinha e um sorriso
programado para apagar a humilhação? Se o presidente mandar matar, torturar, se
jogar do 20.º andar, arriscar a saúde de 210 milhões de brasileiros, a quem o
general deve lealdade e obediência?
Mas
vamos à vacina, que une Judiciário, Legislativo, governadores, prefeitos,
entidades científicas, médicas, jurídicas. Com mais de 155 mil mortos e 5
milhões de contaminados, ninguém está interessado em briguinhas políticas, o
que se espera do presidente é que tome a decisão certa. E se espera em vão.
As
quatro vacinas em teste no Brasil precisam de duas doses, logo, serão
necessárias de 300 milhões a 400 milhões doses e será preciso somar as vacinas,
porque uma só não dará conta. E dane-se se uma é “do Doria”, outra “do
Bolsonaro”, uma é “da China”, outra “de Oxford”. Aliás, corre nas redes: se
contarem a Bolsonaro que os chineses inventaram a pólvora, será que ele proíbe
as armas no País?
O
presidente indicou e o Senado aprovou nesta semana o novo presidente,
contra-almirante Antonio Barra Torres,
e três dos quatro diretores da Anvisa. E se eles forem como o general Pazuello,
que faz qualquer coisa para agradar ao presidente? Amigo de Bolsonaro e
fotografado com ele numa “manifestação golpista” no início da pandemia, Barra
Torres disse para o governador João Doria e repetiu depois, em
entrevista, que a agência não cederá a pressões políticas e vai ser fiel à
medicina e à ciência.
Que
assim seja, porque se trata de milhares de vidas, da economia e dos empregos e,
se a Anvisa ficar ao sabor da ignorância, dos ciúmes e dos interesses
reeleitorais de Bolsonaro, aí mesmo é que a imagem do Brasil vai para o beleléu,
já atingida por desmatamento, queimadas, boiadas e desmanche do Ibama e do
ICMBio, sem falar no endeusamento de Donald Trump.
Como Bolsonaro não se constrangeu em meter a mão no Coaf e na Receita e está sendo até investigado pelo Supremo por ingerência política na Polícia Federal, é preciso confiar na consciência e na responsabilidade dos indicados para a Anvisa, que têm conhecimento e nomes a zelar. Na dúvida, Bolsonaro se antecipou e avisou que não comprará a vacina “da China” mesmo que a Anvisa aprovar. Aí, gente, só internando...
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