Tudo
é sempre um pouco mais complicado quando se trata de política brasileira. Os
partidos nem sempre são o que parecem, o centrão é de direita, o DEM veio do
PFL, que veio do PDS, que nasceu na Arena, partido da ditadura, mas isso não
quer dizer que seus líderes concordem com a defesa que Bolsonaro faz da mesma
ditadura. O PSD é de Gilberto Kassab, político que se adapta a qualquer
governo, mas o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, a maior vitória do
partido, é crítico do presidente, principalmente da política de combate à
pandemia.
A
política brasileira é toda matizada, confirmando a lendária afirmação de que o
Brasil não é para principiantes. O novelo das tendências políticas é tal que
para entender é preciso puxar fio por fio.
O
DEM tem maiores ambições, segundo aviso do seu presidente, ACM Neto, dado na
entrevista publicada ontem pelo “Valor”. Quer ter um candidato ou estar na
chapa da próxima disputa presidencial. Ele se fortaleceu neste primeiro turno.
Aumentou o número de prefeituras e foi o que mais fez prefeito de capital logo
na primeira rodada, entre elas, Salvador, onde o eleito Bruno Reis teve o maior
percentual de votos e sucede a duas administrações de ACM Neto. Por que esse
capital eleitoral seria posto a serviço de um presidente sem lealdades e com
posições extremistas? Não seria neto de quem é se fizesse essa opção.
Na
primeira República, os partidos eram estaduais. Tem horas que parece que esse
DNA está ainda presente nas agremiações. O mesmo partido tem alianças
diferentes dependendo da unidade da federação. Cada caso tem uma história à
parte. Cada estado tem uma história toda particular de alianças, heranças e
tendências.
O
Acre tem uma história de extremos. Foi o primeiro estado em que o PT foi para
um segundo turno, com Jorge Viana, em 1990. Depois de ser prefeito de Rio
Branco, ele chegou ao governo do estado com a bandeira ambiental. Ficou dois
mandatos. Veio o governo Binho Marques, que não quis concorrer à reeleição,
apesar de 64% de aprovação. Em seguida, veio o criticado governo de Tião Viana.
O PT teve cinco mandatos no governo estadual e quatro na prefeitura, chegou a
eleger três senadores e a maioria da bancada federal. Nesta eleição, não
conseguiu eleger um único vereador na capital.
Em
2018, o Acre deu a maior vitória a Bolsonaro, 82,77% dos votos. Elegeu o
senador Márcio Bittar (MDB), um radical antiambiental. Junto com Flavio
Bolsonaro (Republicanos) propôs o fim de qualquer reserva legal. Nesta eleição,
Rio Branco levou para o segundo turno o pecuarista Tião Bocalom (PP), do mesmo
partido do governador, que por sua vez apoiou a atual prefeita Socorro Neri
(PSB), que está no segundo turno. Apesar da vitória acachapante em 2018 e da
guinada conservadora permanecer em alta, a popularidade do presidente caiu no
Acre. O único candidato que assumiu a defesa de Bolsonaro foi Ruy Duarte (MDB),
que ficou em quarto lugar. O socioambientalismo sobrevive no Vale do Acre, onde
nasceu, com destaque para a reeleição do prefeito de Xapuri.
O
Espírito Santo teve vários governos de esquerda ou centro-esquerda, deu vitória
de 63,19% a Bolsonaro em 2018. Hoje, a taxa de aprovação do presidente é de
apenas 28%. O segundo turno em Vitória será disputado entre João Coser (PT), e
Delegado Lorenzo Pazolini (Republicanos). Apesar do partido de Pazolini, quem
teve o apoio de Bolsonaro lá foi o Capitão Assumção, um dos líderes do motim da
Polícia Militar.
Qualquer
estado que se olhe tem particularidades e nuances inesperadas. No Rio, o PSOL
amargou um 6º lugar na disputa para a prefeitura, mas fez o vereador mais
votado, Tarcísio Motta, e uma bancada de sete vereadores, tão grande quanto a
do DEM e a do Republicanos que disputam o segundo turno. Em São Paulo, PT e
PSDB fizeram a maior bancada, ambos com oito vereadores. Mas o PT ficou em 6º
na disputa pela prefeitura. O PSOL, que foi para o 2º turno, fez a segunda
maior, empatado com o DEM, que nem candidato majoritário teve.
O mesmo centrão que esteve nos governos de Fernando Henrique, Lula, Dilma e Temer está hoje com Bolsonaro, mas pode não estar. Segundo a definição de um político experiente: “O centrão troca de camisa quando sente o cheiro de mudança. Num dia era ‘presidenta’ Dilma, no outro votava pelo impeachment.” A política é assim complicada no Brasil.
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