Embora com tom mais moderado, Guilherme Boulos repete o nefasto e equivocado discurso populista
Os
debates eleitorais têm muito a melhorar. Candidatos da oposição muitas vezes
constroem a imagem de que é fácil resolver os problemas e que, se nada foi
feito antes, foi por descaso ou desonestidade. A simplificação excessiva, como
na campanha de Bolsonaro em 2018, atrapalha a decisão consciente e o
amadurecimento do eleitor.
O
discurso fácil e eloquente dá voto, pois segmentos da sociedade continuam em
busca de “salvadores da pátria”. Porém, cedo ou tarde, chega a fatura, como na
decepção de eleitores com o presidente.
É
necessário ir além da superficialidade e afastar promessas descabidas, pois
enfrentar os desafios do desenvolvimento requer maturidade política.
Os
candidatos à reeleição, por sua vez, falham ao não explicitar problemas e
diagnósticos, talvez por temerem críticas. Ao final, há uma cumplicidade
perversa entre contendores no debate eleitoral, ao evitarem temas
polêmicos.
A
campanha para a eleição da Prefeitura de São Paulo não foge à regra.
Mal
se discute, por exemplo, o grave desequilíbrio da previdência municipal. Em
2019, o rombo foi de R$5,4 bilhões, o que equivaleu a 16% da arrecadação
tributária. O déficit atuarial estava em quase R$163 bilhões.
Depois
da desistência de Fernando
Haddad e o insucesso de João Doria,
a reforma da Previdência foi aprovada no fim de 2018. A pressão do
funcionalismo foi enorme e houve greve no início de 2019, data escolhida a dedo
para coincidir com o calendário escolar, segundo os próprios sindicalistas.
A
reforma, porém, foi tímida, prevendo praticamente apenas o aumento da alíquota
de contribuição dos servidores de 11% para 14% e a previdência complementar
para entrantes com benefício acima do teto do INSS.
Não
foi alterada a idade mínima de aposentadoria, diferentemente da reforma
federal, que, diga-se de passagem, foi atacada por Guilherme
Boulos, candidato do PSOL à
Prefeitura de São Paulo. Agora, ele defende mais contratações para aumentar a
arrecadação previdenciária do município. Argumento incompreensível.
O
jovem político reproduz o discurso da velha esquerda que não acredita em
restrição orçamentária e acha que tudo se resolve com mais recursos. Nada se
ouve sobre melhorar a gestão nas diversas áreas. A lista de promessas de
campanha é inexequível, pela falta de recursos e por contemplar medidas
tecnicamente equivocadas.
Para
cobrar a dívida ativa, em boa medida irrecuperável neste País de crises
frequentes, Boulos promete contratar mais procuradores. Para reduzir a
população de rua, propõe usar a rede hoteleira e contratar mais agentes. Para a
saúde, mais médicos. E por aí vai.
Promete
uma “renda cidadã” paulistana, uma política onerosa e mais adequada para
a União, e defende o que chama de economia solidária – por
exemplo, a compra de alimentos de pequenos produtores no cinturão verde, fora
de São Paulo, para prover escolas. No entanto, em uma grande
metrópole, ganhos de escala são necessários para garantir a efetividade das
políticas públicas e, ao mesmo tempo, evitar despesas em demasia.
Para
financiar seus programas, o candidato diz contar com a recuperação da dívida
ativa e com a suposta sobra de caixa – um recurso já comprometido e exigência
da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ele confunde fluxo com estoque
(fluxo de despesa permanente pago com estoque finito de recursos), erro básico,
que, de quebra, fere a LRF.
Faltam
bons diagnósticos sobre os problemas da cidade, as prioridades e a realidade
fiscal.
O
próximo prefeito terá muitas outras missões, como povoar e adensar os bairros
centrais com infraestrutura urbana, o que reduziria tempo no transporte,
pressionaria menos o preço da terra – tema caro ao Boulos – e ajudaria a
preservar o meio ambiente, em meio ao aumento de loteamentos ilegais.
Oxigenar
o debate público, como fazem alguns candidatos “nanicos”, é saudável. O
crescimento de Boulos exige, porém, maior responsabilidade nas propostas.
Embora com tom mais moderado, ele repete o nefasto e equivocado discurso
populista.
*Consultora e doutora em economia pela USP
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