Animação
da esquerda alcança apenas lateralmente os petistas
Há
momentos na história dos partidos políticos em que eles corrigem sua rota ou
correm o risco de perder densidade e estatura, virar poeira e sumir. Quase
aconteceu com o DEM, que por pouco não desapareceu entre 2006 e 2012. Deve
ocorrer muito brevemente com o PSL. E pode se dar também com o PT, se os sinais
deixados nas urnas pelo eleitor não forem bem entendidos. O sinal mais claro
foi o de São Paulo. Aquela terça parte dos paulistanos que, por três vezes, ajudou
a eleger prefeitos da sigla mostrou no domingo que vota na esquerda, não
necessariamente no PT.
Imaginar
que São Paulo embarcaria na canoa do enrolado Jilmar Tatto apenas porque ele
foi apontado pelo partido e ungido por Lula foi um equívoco do tamanho da
soberba do PT. E, em política, arrogância é inimiga do sucesso. Votaram em
Tatto os militantes orgânicos, os engessados e os desavisados. Revoaram para o
PSOL de Guilherme Boulos todos os demais que, somados aos primeiros, totalizam
os cerca de 30% que pareciam cativos do Partido dos Trabalhadores e que, se
soube agora, não são.
É verdade que a esquerda sai das eleições municipais mais animada do que saiu da eleição presidencial de 2018. Embora tenha ido ao segundo turno com Fernando Haddad, o PT liderou a maior derrota política da esquerda desde 2002.
O
problema agora é que animação da esquerda alcança apenas lateralmente os
petistas. Candidatos seus foram eleitos em 179 das 5.570 cidades brasileiras e
estão no segundo turno em outras 15, entre elas Recife e Vitória. É muito
pouco. Esse resultado é 30% pior do que o de 2016, quando o partido imaginava
estar no fundo do poço com o escândalo da Petrobras e o impeachment da
ex-presidente Dilma Rousseff.
O
desfecho do domingo passado poderia ter sido outro se o PT soubesse conciliar e
estivesse no segundo turno em São Paulo. Emprestar apoio no segundo turno não é
a mesma coisa que estar no segundo turno. Claro que Tatto, conhecido por suas
ações heterodoxas na região mais pobre da cidade e denunciado por se envolver
com o PCC, não poderia ser o candidato. Se o partido não iria mesmo conseguir
emplacar nas prévias um nome sólido e confiável como o ex-ministro Alexandre
Padilha, deveria ter recuado em favor de Boulos. Como o diretório de Porto
Alegre fez em benefício de Manuela d’Ávila (PCdoB), indicando o ex-ministro
Miguel Rossetto para vice, um nome muito mais forte e íntegro que o do
candidato paulistano.
No
Rio, onde o PT sempre foi muito mais coadjuvante que protagonista, se deu coisa
parecida. Ao insistir em candidatura própria, de Benedita Silva, impediu que a
esquerda, com o PDT de Martha Rocha, tentasse desalojar Marcelo Crivella da
disputa. Talvez nem mesmo com um empurrão a pedetista chegasse ao segundo
turno, tamanha sua falta de carisma, graça e conteúdo, mas seria um sinal de
maturidade e uma tentativa de construir uma alternativa à esquerda na cidade.
Pode-se dizer que, em 2016, o partido tentou, ao indicar o vice de Jandira
Feghali (PCdoB). Embora, naquele caso, fosse apenas um jogo do faz de conta,
porque o correto teria sido apoiar Marcelo Freixo (PSOL).
Como
o Brasil de 13,5 milhões de miseráveis precisa de uma esquerda forte,
competitiva e honesta em 2022, o PT tem que entender o que acaba de ocorrer. Já
que ignorou todos os avisos anteriores, esta pode ser sua última chance. O que
aconteceu nesta eleição é que o centro saiu fortalecido. Desnecessário descer a
detalhes, os mapas eleitorais e os analistas que me precederam já esmiuçaram
isso. Mantida a altivez do PT e seu distanciamento do resto do espectro de
esquerda, a eleição presidencial pode acabar sendo decidida por um candidato de
centro, de centro-direita ou de centro-esquerda, contra o de extrema-direita
Jair Bolsonaro.
É justo cobrar do PSOL, do PCdoB, do PSB, do PDT e da Rede, entre outros, a consolidação de um caminho à esquerda viável em 2022. Mas cabe ao PT tomar a iniciativa. Ele é o maior partido do agrupamento e, exatamente por isso, o único que pode oferecer precedência.
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