Isso
não significa que não haja mais risco à democracia brasileira
Pela
primeira vez na história da República brasileira, os
chefes das Forças Armadas renunciaram coletivamente em protesto contra
a tentativa do presidente da República de utilizá-las contra a democracia. As
Forças Armadas informaram ao Brasil na semana passada que o presidente da
República é golpista.
Isso
não quer dizer que Bolsonaro pretendesse dar um golpe de Estado na semana
passada. O que fez foi remover militares legalistas que poderiam se opor, tanto
a um golpe "old school" com tanques na rua, como à corrosão
progressiva da democracia brasileira que está em curso desde 2018.
Além
de golpe, Bolsonaro quer dos militares demonstrações de fidelidade à sua pessoa
(e não à pátria ou à República), tuítes golpistas como os de Villas Bôas e a
possibilidade de ameaçar Congresso e Supremo com gestos inconstitucionais dos
militares.
Mas Bolsonaro perdeu esse round.
Os
novos comandantes, ao que parece, têm
as mesmas posições dos que saíram. Não só isso, o novo comandante do
Exército, general , era o responsável pela área de saúde do Exército. Poucos
dias antes da crise militar, deu entrevista declarando que aplicou no Exército
as determinações da Organização Mundial da Saúde. Bolsonaro se opõe às
determinações da OMS.
Além
disso, no dia seguinte à crise militar, o líder do governo na Câmara, Major
Vitor Hugo, apresentou um projeto de emenda constitucional que
permitiria a Bolsonaro decretar estado de mobilização nacional para combater a
pandemia e, com isso, assumir o controle das PMs estaduais.
Derrotado
no Exército na segunda-feira (29), na terça (30) Bolsonaro tentou formar sua
milícia golpista com as polícias. O projeto, entretanto, foi derrubado no
colégio de líderes e nem sequer foi colocado em votação.
Enfim,
foi uma semana em que Bolsonaro tentou radicalizar para mostrar força e
fracassou.
Isso
quer dizer que não há mais risco para a democracia brasileira? De jeito nenhum.
Enquanto Bolsonaro for presidente, haverá novos rounds contra as instituições.
O
presidente não teve coragem para brigar com os militares nomeando comandantes
golpistas em violação do critério de antiguidade, mas pode vir a fazê-lo no
futuro. O risco de motins policiais continua alto, e a ameaça
de motim na Bahia no mesmo dia da crise militar parece uma
coincidência estranha.
De
qualquer forma, suspeito que mesmo os golpistas dentro das Forças Armadas
tenham suas dúvidas quanto à conveniência de um golpe em favor de Bolsonaro no
momento atual. O número de mortos da pandemia disparou, a economia permanece
travada e a popularidade do governo caiu. Em um trecho pouco comentado das
memórias de Villas Bôas, o general lembra do caso da Turquia, em que um golpe
de Estado fracassado causou expurgos e prisões no Exército. Golpes de Estado
também têm seus riscos para quem os tenta.
Para
além desse tipo de especulação, uma coisa é indiscutível: a reação do mundo
político brasileiro à crise militar não foi a que se veria em um país
democrático normal. Em qualquer democracia funcional, os oficiais
demissionários teriam sido convocados pelo Congresso para prestar
esclarecimentos.
Mas não aconteceu nada. Como das outras vezes. As instituições continuam preferindo não falar abertamente sobre o golpismo de Bolsonaro, porque falar disso seria obrigar-se a tomar providências.
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