segunda-feira, 5 de abril de 2021

Catarina Rochamonte - Um estorvo no Planalto

- Folha de S. Paulo

Azevedo saiu por não aceitar que o Exército fosse transformado em milícia. Não existe isso de 'meu Exército'

Respeitar a autonomia das instituições de Estado é dever do governante democrático, coisa que Bolsonaro não entende. Em meio à aceleração assustadora de mortes diárias por Covid, o presidente achou de aumentar o tumulto com uma reforma ministerial de corte fisiológico e intenção autoritária, tentando subordinar as Forças Armadas aos seus caprichos de ocasião.

Nesse intento, por ora, fracassou, uma vez que os líderes militares reagiram com altivez e dignidade, abrindo mão dos cargos para manter as Forças Armadas comprometidas com a democracia e guiadas pela Constituição, como afirmado na nota do general Fernando Azevedo e Silva, exonerado do cargo de ministro da Defesa.

Mais uma vez, os arroubos autocráticos de Bolsonaro levaram à queda de um ministro que tentava salvaguardar as instituições: Sergio Moro saiu por não aceitar a interferência na Polícia Federal; Azevedo saiu por não aceitar que o Exército brasileiro fosse transformado em milícia. Não existe isso de "meu Exército", como quer Bolsonaro. O único "exército" desse tipo com o qual ele pode contar é o de seus fanáticos, que, aliás, vai minguando.

No momento, Bolsonaro depende mais do centrão, que nada tem de fanático, sendo apenas oportunista. Daí a Secretaria de Governo, ambicionada "chave de cofre", ter sido entregue à deputada Flávia Arruda, do PL, por recomendação de Arthur Lira e, principalmente, de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, notório articulador do mensalão, preso por corrupção e réu por peculato e fraude em licitação. Deputada de primeiro mandato, Flávia, que terá a missão de negociar cargos e verbas, é casada com o ex-governador José Roberto Arruda, duas vezes preso por corrupção.

Não bastasse isso, um preposto de Bolsonaro na Câmara tentou emplacar o projeto de Mobilização Nacional, dando ao presidente poderes excepcionais. O golpe sanitário não vingou. Bolsonaro não lidera como presidente nem consegue ser ditador; resta como um estorvo.

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