Folha de S. Paulo
Reeleição pode ser ameaçada por falta de
chuva, juros no EUA e inflação
O maior adversário de Jair Bolsonaro em
2022 é, óbvio, Lula da Silva.
Quem ou o quê mais? Difícil imaginar políticos ou movimentos políticos e
sociais organizados que ameacem o projeto de autocrata. O que pode dificultar a
reeleição são entidades abstratas, nebulosas, voláteis ou, até agora, informes
politicamente: mumunhas do PIB, inflação, fome, racionamento, política
monetária americana, por exemplo.
A fim de lidar com alguns desses riscos, Bolsonaro se agita para aprontar um pacote de grande, diverso, de demagogias mais ou menos pontuais e assumiu que não faz mais nada a não ser campanha.
Quem não é Lula, Bolsonaro e desgosta das
alternativas, a direita mais amena, ainda tenta inventar um Jânio BolsoCollor
limpinho, uma cepa de
Luciano Huck, uma criação midiática qualquer, um raio
sensacionalista no céu azul que hipnotize o eleitorado.
É assim que a direita desesperada ganha
eleição no Brasil, mesmo nos brasis muito diferentes entre si dos anos 1960,
1990 e 2018. "Se queres um monumento", considerem o que aconteceu
depois de cada uma dessas maracutaias político-midiáticas.
Não, Fernando Henrique Cardoso não é de
direita, menos ainda essa aí.
Voltando à vaca fria, se não atolada no
brejo ou morta, quais são outros adversários de Bolsonaro no horizonte?
Por mais que a economia recupere o terreno
perdido, volte a 2019 no início de 2021 e daí avance um pouco, ainda terá
perdas para recuperar de 2015-16. O trabalho será insuficiente e mal pago, se
não modificado de modo estrutural. Os danos da
inflação ainda serão grandes —a "mudança de preços
relativos", comida cara demais, vai ficar aí por um bom tempo. Parte
grande da população sentirá alívio, outro tanto estará entre o sofrimento e a
fome, dor que ainda não é tratada de modo politicamente organizado (assim como
o luto do morticínio da Covid).
Bolsonaro vai tentar comer esses mingaus
podres pelas bordas, com mexidas no
Bolsa Família, subsídios para comida, favores com impostos, o "Minha
Casa Militar" etc. um pouco de favor para cada um, pois
não há dinheiro. Se aloprar demais na demagogia, pode dar um tiro no pé
arrumando um salseiro com seus amigos de "o mercado".
Por falar em carestia, pode ser que essa
inflação muito além da conta leve a Selic
a nível muito além do esperado, solapando a recuperação de 2022.
Pode haver racionamento
de eletricidade em 2022. Isto é, redução obrigatória de consumo,
pois outros tipos de racionamento já começaram, como a retenção de água nas
hidrelétricas e o aumento da conta de luz, ou estão sendo tentados, como o
remanejamento de horários de consumo. A depender da chuva que vai cair de
novembro a abril do ano que vem, não haverá o que fazer.
Um troço etéreo, mas sério, é uma
antecipação tumultuada da mudança da política monetária americana. Em algum
momento até 2023, o banco central dos EUA (Fed) vai parar de despejar dinheiro
na economia, de subsidiar taxas de juros para governo e setor privado —na
verdade, vai começar a enxugar essa dinheirama.
Isso pode acontecer de maneira tranquila
(não costuma ser), dar um sururu razoável (como em 2013, o que ajudou a
derrubar a economia daqui) ou até em tumulto grande.
Visão alternativa e organizada de futuro, que chegue à massa das pessoas, não há. Lula é ele mesmo, o símbolo, e articulações políticas, que sozinhas não ganham eleição, vide 2018 ou 1989. A "terceira via" é uma barata tonta à espera de um milagre midiático. A eleição está quase a depender dos deuses da chuva.
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