Inflação, risco fiscal e reformas são outros pontos de atenção, alertam
Paula Soprana / Folha de S.
Paulo
SÃO PAULO - O crescimento
econômico no Brasil após a crise sanitária de 2020 deve se sustentar no curto
prazo, mas seu desempenho dependerá diretamente da geração de emprego, da
pressão inflacionária, do risco fiscal e da manutenção das reformas, avaliaram
economistas nesta quarta-feira (21) em webinar
da Folha e do Instituto Brasileiro
de Economia da Fundação Getulio Vargas.
Após o PIB
(Produto Interno Bruto) favorável do primeiro trimestre, que zerou
as perdas da pandemia, a perspectiva se mantém otimista, com previsão de
crescimento próximo a 5% no ano, segundo Silvia Matos, pesquisadora do
Ibre/FGV.
Para a economista, o desemprego impede uma
projeção mais otimista para o desempenho econômico. A ampliação do Bolsa
Família, prometida pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido), não será
suficiente para compensar as perdas do mercado de trabalho na crise de Covid-19.
"A taxa de desemprego deve ficar ainda
alta, apesar de a gente observar uma melhora neste ano e no ano que vem. A
geração de emprego ainda é um desafio porque muitas pessoas ficaram de fora do
mercado de trabalho", afirma.
O risco fiscal aparece como mais um
obstáculo diante do limite imposto pelo teto de gastos e da necessidade de
aumento da despesa pública para a recuperação. Esse desafio não se limita ao
Brasil e vem atrelado ao risco de inflação, um fator que dificulta em especial
a retomada dos países
emergentes, avaliam os economistas.
Um cenário de inflação preocupa mais do que
um de baixo crescimento, afirma José Márcio Camargo, professor da PUC-Rio e
economista-chefe da Genial Investimentos. Ele diz que a alta dos preços era
óbvia, apesar de não foi antecipada por economistas, e que deve perdurar.
Parte da pressão inflacionária é atribuída
às políticas fiscais de transferência de renda adotadas nos países, como o
auxílio emergencial no Brasil. Com a paralisação da atividade econômica no
segundo trimestre do ano passado e a consequente onda de demissões e falências,
governos estimularam a economia com transferência de renda, impulsionando o
consumo.
"A demanda volta rápido. O problema é que as empresas têm que refazer o processo produtivo, recontratar os trabalhadores, buscar novas fontes de matéria-prima, novos fornecedores, e isso demora. Parte da pressão inflacionária é essa e ainda vai durar", diz Camargo.
Lívio Ribeiro, pesquisador associado do
Ibre/FGV, afirma que o choque de inflação vem em ondas, começando pelo segmento
de alimentos e terminando no setor de serviços, que começa a ser impactado. Os
mais pobres são os que mais sentiram o aumento de preços, dado o peso de comida
e energia em sua cesta de consumo.
Para o economista, o mundo pós-Covid vai
exigir programas de transferência
de renda para os mais pobres. Com capacidade de fazer políticas fiscais
robustas, os países ricos devem se recuperar com rapidez superior aos
emergentes, que devem crescer mais rápido do que os países pobres.
"O choque na queda foi sincronizado
entre economias globais. Todo mundo caiu junto. O início da volta foi meio
sincronizado, com a China na frente, mas com o passar do tempo, começa a haver
uma diferenciação ligada à capacidade de apoio fiscal e de controle
sanitário", afirma Ribeiro.
Outro ponto destacado pelos economistas no
debate foi a necessidade de manutenção da agenda de reformas.
Para Silvia Matos, da FGV, o governo
federal está enfraquecido em meio à polarização política e não deveria propor
novas reformas nesse momento.
Ribeiro, também da FGV, diz estar cético
sobre a capacidade de a gestão atual completar as reformas propostas
—tributária e administrativa. "A gente não precisa chegar ao fim do
processo agora, mas colocar a bola em campo é importante."
Camargo afirmou que "qualquer hora é
hora de fazer reforma". "Você passa décadas sem que nada aconteça.
Começamos a discutir reformas da Previdência e trabalhista na década de 1990.
Nada acontecia e de repente em cinco anos temos um conjunto de reformas que
eram discutidas há décadas", afirmou, referindo-se ao período iniciado
após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
O economista diz que as reformas são
sintomas concretos de que o Brasil está voltando a se tornar atraente ao
investidor. Ele elogia, principalmente, o teto de gastos, que em sua avaliação
começou a mudar a cultura orçamentária do país.
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