O Estado de S. Paulo
O anúncio presidencial da reforma
ministerial veio acompanhado justamente da boa nova do desbloqueio
orçamentário. Não é pura coincidência
A arrecadação do governo com impostos e
contribuições federais tem feito milagres em Brasília.
É um dos assuntos mais comentados nas rodas brasilienses e razão apontada a
toda hora quando se quer negociar apoio político a uma ou outra medida no Congresso.
Já são R$ 200 bilhões a mais de receitas
projetadas para o ano, como antecipou o próprio ministro Paulo Guedes,
pouco depois de o presidente Jair
Bolsonaro confirmar que fará uma reforma ministerial para
reforçar o apoio político no Senado.
Em junho, a alta acima da inflação chegou a quase 50%.
No estilo Bolsonaro de falar, o presidente
contou que estava “até preocupado positivamente” porque a arrecadação subiu
“assustadoramente” e iria desbloquear todos os recursos previstos no orçamento
dos ministérios.
O anúncio presidencial da reforma ministerial veio acompanhado justamente da boa nova do desbloqueio orçamentário. Não é pura coincidência. Mas recado mesmo do presidente para o seu público político: olhem, o caixa está cheio!
É com esse cacife econômico na mão que o
presidente Bolsonaro passou a contar para conter uma debandada da sua base no
Senado, onde a CPI da Covid vem conseguindo minar a sua popularidade
entre os antigos apoiadores e alimentar o pedido de impeachment.
Após sucessivas tentativas do Centrão de
fatiar a Economia, Guedes aceitou sem reclamar a divisão do seu
superministério na aposta de que a dupla do Partido
Progressistas – o senador Ciro Nogueira (que
vai para a Casa Civil) e o presidente da Câmara, Arthur Lira –
vai conseguir formar um trincheira em defesa do avanço da votação da agenda
econômica, sobretudo, o projeto de reforma do Imposto de
Renda e o pacote de estímulo ao emprego.
Se na Câmara as votações de projetos estão
andando sob a mão de ferro de Lira, quando eles chegam ao Senado o clima é
outro. O ambiente hostil e a fragilidade política do governo ficam mais
escancarados e as perspectivas de avanços na pauta são menores.
Guedes trabalha agora para conter o avanço
do Centrão sobre outras áreas do seu ministério. Não quer abrir mão de
Planejamento e de Indústria e Comércio Exterior, áreas que estão sendo
cobiçadas também por outros partidos aliados. Se vai conseguir, são outros
quinhentos. Terá poucos dias para administrar as perdas.
O ministro também se movimenta ainda para
manter o seu secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco,
no Ministério do Emprego e Previdência, que será criado para acomodar o
ministro Onyx Lorenzoni, como revelou o Estadão.
É o time de Bianco que está desenhando o
novo pacote de estímulo de emprego com a criação do Bônus de Inclusão Produtivo (BIP), que tem enfrentado
percalços com a resistência do Sistema S em
financiar o benefício, como defende a equipe econômica.
O pacotão do emprego com o BIP e outros
benefícios é um dos principais ativos que o governo quer lançar no ano
eleitoral de 2022. Ele pode garantir que jovens de baixa renda e trabalhadores
informais recebam um benefício de qualificação profissional de R$ 550 para
incentivar a contratação e mitigar os efeitos do impacto da pandemia da covid-19 no
mercado de trabalho. Benefício com dinheiro direto na mão do eleitor em ano de
eleição, justamente um dos motivos das resistências ao projeto.
Se Bianco sair, seus principais auxiliares
vão com ele e o projeto pode demorar mais tempo até Onyx e seu time de apoio
técnico tomarem pé das coisas no novo ministério, principalmente se os projetos
não forem convergentes.
Os especialistas na área fiscal vão dizer
que a arrecadação mais alta não resolve o problema da restrição do teto de
gastos, que dá limite ao crescimento das despesas. Mas, além do teto estar com
mais folga no ano que vem, as movimentações dos últimos meses com o lançamento
do projeto de reforma do Imposto de
Renda têm mostrado que a estratégia de política fiscal é outra:
adotar uma política fiscal expansionista via o lado das receitas com menor
tributação, já que o teto cria obstáculos para aumentar os gastos.
Tem muita gente que já entrou nessa onda. Tanto é que o relator da reforma do Imposto de Renda, Celso Sabino, propôs uma desoneração agressiva da tributação das empresas com a aposta de que a arrecadação vai bombar ainda mais com o crescimento acelerado e reduzir o déficit fiscal. Filme, aliás, já conhecido. Estranho é que muitos economistas do mercado que há pouco falavam em trajetória explosiva da dívida estão, desta vez, em silêncio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário