Valor Econômico
Política beneficiou todos os estratos de
renda, diz estudo do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da UFMG
O auxílio emergencial não só evitou que o
Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro tivesse uma queda adicional de 2,4
pontos porcentuais no ano passado (a retração foi de 4,1%), como deve impedir
quase 6% de perdas acumuladas para a soma das riquezas produzidas pelo país até
2040. Os cálculos são do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar)
da UFMG, em estudo obtido pelo Valor.
“A retração da economia sem o auxílio seria
de 6,52% no PIB em 2020.... Até 2040, os efeitos da ausência do auxílio
gerariam um desvio acumulado negativo de 5,84%”, diz o trabalho.
O programa de R$ 291 bilhões em 2020 impediu também uma queda adicional de 5,5 pontos no consumo das famílias naquele ano e de 10,4% até 2040. “Para o investimento, sem o auxílio, essa variável desviaria negativamente 4,07% da sua taxa de crescimento observada em 2020 (-0,8%). Em 2040, os efeitos acumulados de sua ausência gerariam um desvio negativo acumulado de 11,3%.”
A principal política de combate aos efeitos
da pandemia ajudou não só as famílias da base da distribuição, mas também os
mais abastados, segundo o texto. “No longo prazo (2040), a perda de bem-estar
total [sem o auxílio] se acumularia em R$ 756 bilhões. Assim, os resultados
sugerem que a política teve importante efeito na mitigação da queda de bem-estar
das famílias”, diz.
A professora Débora Freire, autora do
material com outros quatro pesquisadores, explicou à coluna que os efeitos de
longo prazo ocorrem porque a política evitou alguns processos de desmobilização
de capital (reversão de investimentos) das empresas e alguns efeitos negativos
mais duradouros sobre o mercado de trabalho.
Para ela, isso mostra a importância de um
programa de transferência de renda ser parte do cardápio de política fiscal
anticíclica (de enfrentamento a crises). “É um elemento que não se usava antes,
incentivar o consumo das famílias mais pobres, resguardando a população mais
atingida pelas crises, o que amortece impacto social dessas crises”, disse.
Segundo a economista, isso não significa
abandonar outras alternativas de ação e tampouco referendar um programa liberal
de redução do papel do Estado em áreas como educação, saúde e investimentos.
Porém, aponta, deixa clara a eficácia da transferência direta de renda, não só
como política social, mas também para reativar o setor produtivo, via canal do
consumo.
Débora destaca ainda que é preciso avançar
em melhorias administrativas no Cadastro Único, para que, em novas crises,
consiga-se rapidamente expandir as transferências - e também desinflá-las
depois. “O sistema de proteção social pode ter efeitos de mitigação nas crises
mais relevantes que programas setoriais”, salientou.
Se era intuitivo o sucesso do auxílio
emergencial, o estudo traduziu claramente isso em números e será uma importante
referência para o debate sobre como agir em crises futuras.
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A Comissão Especial da Câmara aprovou a
última das várias versões do deputado Arthur Maia (DEM-BA) para a reforma
administrativa. Responsável pela Proposta de Emenda Constitucional (PEC), o
Ministério da Economia elencou e divulgou uma série de avanços que viu no
texto. Mas, à direita e à esquerda, a matéria tem sido alvo de críticas, seja
por não afetar os servidores atuais, seja por diminuir direitos dos futuros
servidores.
Para uma fonte do governo, a reforma que
avançou não é nem a revolução que o relator aponta nem a tragédia apontada por
críticos. A visão é que, em mais de duas décadas, nada foi feito e agora ao
menos algumas bombas futuras estão sendo desarmadas. Deve-se permitir, por
exemplo, a demissão de servidores que, contratados após a reforma, fiquem em
funções que se tornem obsoletas (hoje gasta-se R$ 8,2 bilhões por ano com
pessoas nessas condições). Já as contratações temporárias permitirão ao governo
agir por empreitadas em diversas áreas, nos moldes dos censos do IBGE.
Embora ataque alguns privilégios, como
férias acima de 30 dias, uma lacuna reconhecida dentro e fora do governo é a
manutenção dessa e outras benesses para magistrados e procuradores. Há ações
para se fechar essa brecha no plenário da casa, mas o presidente da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), tem jogado contra. Ele alega ter parecer jurídico dizendo
que mudança desse tipo só se poderia fazer por iniciativa do Judiciário.
Trata-se de uma interpretação que é
controversa, comenta o interlocutor do governo. Apesar de o Executivo entender
que não caberia a ele propor medidas para outros Poderes, o Legislativo se
incluiu na reforma e, para essa fonte, a soberania dos plenários do Congresso como
legislador permitiria a inclusão da Justiça.
A leitura de parte do governo é que vale a
pena tentar fazer essa mudança. Não faz sentido que uma reforma que ataca
benefícios só para futuros servidores não inclua os magistrados e procuradores
e pegaria mal a Justiça agir em causa própria e derrubar.
Ex-secretário de Recursos Humanos nos
governos do PT e diretor do projeto Reconta Aí, Sergio Machado é crítico da
reforma. Para ele, o texto tem visão fiscalista e favorece muito as
contratações temporárias, com prejuízos à produtividade e ao bom funcionamento
da máquina pública.
Ele defende regulamentar a avaliação dos
servidores, incluindo da Justiça, mas aponta que isso precisa ser feito de
forma a garantir que não haja perseguições políticas.
Machado considera que o ideal é a Justiça
fazer parte, caso avance a reforma. “O Judiciário tem que ter estabilidade
porque sofre pressão. Mas magistrados precisam ser tratados iguais aos demais
servidores, eu me filio a essa visão republicana”, disse.
Deixar o Judiciário de fora da reforma é
injustificável. Pilar da democracia, a Justiça tem sido atacada de forma
indevida por bolsonaristas. Mas seu papel fundamental não torna seus
integrantes membros de uma casta a quem todos os privilégios são devidos pela
sociedade.
Seria de bom tom que a própria Justiça se
antecipasse e mandasse sua proposta de fim de privilégios, alinhando-se ao
processo de tentar modernizar o setor público brasileiro.
O presidente do STF, Luiz Fux, gosta de se
mostrar preocupado com a as contas públicas. Seria uma ótima chance de tornar
discurso em prática enfrentando os problemas de sua própria corporação, que
naturalmente tem apego aos seus privilégios.
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