domingo, 12 de setembro de 2021

Merval Pereira - PF no rastro de Zé Trovão

O Globo

Zé Trovão, quem diria, tornou-se o símbolo da rendição de Bolsonaro, o que dá bem a dimensão de chanchada da crise política que desencadeou sem ter a menor condição de vencer.  Seguindo os passos de seu chefe, pediu perdão pelo Telegram, disse que nunca desejou o que ameaçou fazer, e espera em vão no México o habeas-corpus que lhe prometeram. Fachin já derrubou o primeiro, e o segundo terá o mesmo destino. Zé Trovão vai ser preso a qualquer momento, está sendo rastreado pela Polícia Federal, que o localizou agora na Cidade do México, já tendo passado pelo Panamá, Cancún e Guadalajara.

As últimas medidas para o pedido de extradição já estão sendo providenciadas, e a Polícia Federal sabe que seu dinheiro está acabando. Ao mesmo tempo, os financiadores desse turismo político de Zé Trovão estão sendo investigados, assim como os proprietários dos caminhões que bloquearam as estradas no dia seguinte ao discurso golpista do presidente Bolsonaro.

Assim como caminhoneiros acreditaram na balela de que o Estado de Sítio havia sido decretado, e postaram vídeos chorando de alegria, também Bolsonaro acreditou mesmo que poderia emparedar o Supremo Tribunal Federal (STF) em decorrência das manifestações de 7 de setembro, embora a volta do avião presidencial tenha sido em clima de enterro, na definição de um passageiro.


Havia no ar o sentimento de que o presidente, não cumprindo o que prometera - moderar-se no palavreado -, provocaria consequências políticas e jurídicas. Na reunião do Conselho de Governo, no dia seguinte, quando exibiu, como se vitorioso fosse, as fotos das manifestações, Bolsonaro tentou levar adiante uma proposta do ministro Ônix Lorenzoni de que se encontrasse uma saída jurídica para que o ministério da Justiça determinasse à Polícia Federal que não cumprisse ordens vindas do ministro Alexandre de Moraes.

Ninguém respondeu, mas todos sabiam que, embora o presidente não possa ser preso no exercício do mandato, eles poderiam ser se  emitissem um decreto desse tipo. Além de ser um crime de responsabilidade flagrante. O assunto morreu na hora, e o golpe que o presidente ainda tentava manter em pé foi para o ralo. A partir daí, Bolsonaro teve noite de insônia, e apelou para o ex-presidente Michel Temer para negociar a rendição às instituições democráticas.

As manobras por baixo dos panos que estão sendo alardeadas por blogueiros e jornalistas bolsonaristas não passam de miragem, igual ao Estado de Sítio que não foi decretado. Os inquéritos sobre fake news e atos antidemocráticos no STF continuam a todo vapor, ganhando novas informações a partir das investigações sobre o 7 de setembro, e a Polícia Federal continua ouvindo pessoas envolvidas.   

O documento de recuo dos ataques feitos ao STF, escrita pelo ex-presidente Michel Temer, é fruto dessa solidão em que Bolsonaro se encontra, mas foi também uma cartada que não lhe deixou saída.  Ele não mudou da água para o vinho de uma hora para outra, e, portanto, não creio que tenha capacidade de continuar nessa senda de acordos, mediação e distensão entre os poderes. A vida toda viveu de embates e de tensão, não vai mudar agora.

Mas a carta foi seu último passo. Se retratou por escrito, e quando tiver uma recaída autoritária não haverá mais onde se esconder. Entrou num beco sem saída, porque, se voltar a atacar o STF, ou o ameaçar com golpe, chegará ao fim do caminho, que é o impeachment. Ao mesmo tempo, se continuasse moderado,  perderia grande parte de seu eleitorado, pelo menos do grupo que estava nas ruas no 7 de setembro. A rendição dele foi tão vergonhosa, tão humilhante, que não conseguirá ser um interlocutor válido. Para recuperar o prestígio entre os seus, terá que radicalizar ainda mais.

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