Folha de S. Paulo
Redes sociais não são um serviço público,
mas uma relação entre particulares
Vamos admitir, só para efeitos de
argumentação, que Jair
Bolsonaro e seus acólitos estejam genuinamente interessados na
liberdade. Será que, neste caso, a medida
provisória que proíbe empresas que administram redes sociais de
vetar mensagens e banir usuários se justifica? Penso que não.
Os bolsonaristas se valem de uma visão bem interesseira de liberdade quando reclamam para si o direito de postar o que desejarem, mas não reconhecem que as empresas também devem ter a liberdade de escolher o que circulará em suas páginas. A fundamentação aqui pode ser tanto mercadista como filosófica.
No primeiro caso, o administrador pode
argumentar que, se sua rede for povoada por ogros que afugentam anunciantes e
usuários capazes de manejar talheres, ele perderá dinheiro, o que o frustra a
razão de ser da empresa, que é gerar lucros. Pode também dizer que, ao excluir
um usuário, ele não viola sua liberdade de expressão, já que esse indivíduo
segue livre para transmitir suas ideias por outros meios.
Liberdade de expressão não é direito a
megafone, e redes sociais não são um serviço público, mas uma relação entre
particulares regida pelas regras contratuais com as quais o usuário concorda ao
abrir sua conta.
É no plano filosófico que as coisas ficam
mais interessantes. O liberalismo valoriza a liberdade devido a um saudável
ceticismo. Não sabemos de antemão o que é melhor para a sociedade e temos
certeza de que os objetivos mudam ao longo do caminho. Não há linha de chegada.
Nesse contexto, que não é dos mais auspiciosos, o melhor que podemos fazer é
deixar que todos persigam seus interesses e defendam suas ideias, torcendo para
que a resultante seja virtuosa. Quando aceitamos que o debate deve ser travado
na arena da racionalidade, a tendência é que os melhores argumentos prevaleçam.
O problema hoje é que alguns questionam a
própria ideia de que as discussões devem ser racionais.
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