domingo, 12 de setembro de 2021

Bernardo Mello Franco - A ponte de Lira

O Globo

O homem do botão vermelho não está interessado em apertá-lo. Na semana em que Jair Bolsonaro fez um ensaio aberto do golpe, Arthur Lira voltou a simular normalidade. O presidente da Câmara passou o 7 de Setembro entocado em Alagoas. De volta a Brasília, deixou claro que os 130 pedidos de impeachment continuarão na gaveta.

Na quarta-feira, o deputado fez um pronunciamento anódino sobre a crise. Reclamou de “bravatas em redes sociais”, mas fingiu não ter ouvido as ameaças da véspera. Em outra passagem, ele elogiou “todos os brasileiros que foram às ruas de modo pacífico”. Sobre as tentativas de invasão do Supremo Tribunal Federal, preferiu silenciar.

Bolsonaro ainda não havia ressuscitado Michel Temer quando Lira prometeu agir como uma “ponte de pacificação entre Judiciário e Executivo”. “A Câmara dos Deputados está aberta a conversas e negociações”, disse. De negociações ele entende. A questão é compreender seus objetivos.

O chefe do Centrão é um colaboracionista convicto. Fará vista grossa aos crimes de Bolsonaro enquanto puder extrair ganhos para seu grupo político. No arranjo atual, o deputado exerce um poder inédito sobre o Orçamento. Instalou uma aliada no quarto andar do Planalto e comanda a distribuição de cargos e emendas.

Lira considera que tem mais a ganhar do que a perder com a permanência do capitão. Se a popularidade do governo continuar baixa, melhor ainda. O cenário de um Bolsonaro isolado e dependente do Centrão é o ideal para o projeto de pilhagem. Pelo menos até o início da campanha de 2022.

Na quinta, o presidente da Câmara renovou sua cumplicidade com o golpismo. “Ninguém é obrigado a cumprir decisão inconstitucional”, afirmou. No palanque da Avenida Paulista, o capitão havia cometido mais um crime de responsabilidade ao dizer que descumpriria decisões do Supremo. A declaração de Lira soou como uma anistia instantânea. Sua “ponte de pacificação” é uma pinguela para a impunidade.

Heleno, o historiador

Para os anais da avacalhação da TV Brasil: no domingo passado, a emissora pública dedicou um programa inteiro às opiniões do general Augusto Heleno sobre o Dia da Independência.

Entre platitudes e patriotadas, o ministro informou que “os símbolos nacionais são um grande sustentáculo do nosso espírito de brasilidade” e que “nós temos que agradecer ao português a colonização do nosso país”.

O entrevistador exaltou a “carreira brilhante” do general. Depois estendeu os elogios ao capitão. “O senhor considera que essa é uma marca do presidente Jair Bolsonaro, resgatar os símbolos nacionais?”, perguntou, sem corar.

No fim do programa, Heleno contou que desfila no 7 de Setembro desde os 13 anos, sempre “com muita emoção”. “Nosso país é privilegiado”, concluiu.

Nem sempre, general.

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