O Estado de S. Paulo
Mundo quer poucas coisas do Brasil. A mais
importante talvez seja o fim do desmatamento
O festival de Sundance, principal mostra do
cinema independente americano, exibiu nesta semana o documentário The Territory. O filme narra a saga
dos índios jupaús para expulsar invasores de suas terras. A produção é do
nova-iorquino Darren
Aronofsky, que se consagrou ao dirigir filmes como Cisne Negro e Réquiem Para Um Sonho. Uma das
personagens do documentário é Neide
Suruí, mãe de Txai Suruí, a
brasileira que discursou na abertura da COP de Glasgow.
Em 15 de fevereiro, a nova exposição do fotógrafo Sebastião Salgado chega a São Paulo, depois de passar por Londres, Roma e Paris. Impressionam os registros de populações indígenas, com retratos belíssimos. A exposição vai muito além da fotografia. É praticamente um espetáculo multimídia, que incorpora a música de Villa-Lobos e Philip Glass e depoimentos de líderes de nações.
Londres, Roma, Paris, Glasgow, São Paulo –
e Park City, no Utah, cidade que abriga Sundance. Darren Aronofsky, Philip
Glass, Sebastião Salgado. O mundo quer poucas coisas do Brasil. Talvez a mais
importante delas – nossa obrigação – seja o fim do desmatamento na Amazônia.
Sem a floresta, será impossível cumprir as metas climáticas que permitirão a
continuidade da vida no planeta.
Para além da arte, há também ação
internacional, em geral conjugada com movimentos brasileiros. Um exemplo
recente envolve os próprios jupaús retratados em The Territory. Uma ação conjunta
entre o WWF, uma das principais organizações ambientalistas do mundo, fundada
na Inglaterra, e a ONG brasileira Kanindé, dirigida por Neide Suruí, está
trazendo tecnologia às populações indígenas.
“Os estudos mostram que os pontos da
floresta onde há menor devastação – 1,6% – são aqueles ocupados por povos
indígenas”, diz Neide Suruí, entrevistada no minipodcast da semana. O WWF e a
Kanindé treinaram os jupaús no uso de drones, aparelhos de GPS e equipamentos
fotográficos. O objetivo é que, com a ajuda da tecnologia, os jupaús
identifiquem os que praticam crimes ambientais, documentem as infrações e os
levem à Justiça. O treinamento incluiu aulas sobre a questão legal, e a ideia é
que se alastre por várias nações indígenas.
A exposição internacional e multimídia de
Sebastião Salgado, o filme de Sundance e a aliança entre os povos indígenas e o
WWF mostram que a Amazônia é, cada vez mais, uma causa internacional. É bom que
assim seja. Há quem chame o fenômeno, pejorativamente, de “globalismo”. Dados a
magnitude da ameaça climática e os números trágicos do desmatamento nos últimos
anos, a palavra correta seria outra: “emergência”.
*ESCRITOR, PROFESSOR DA FAAP E
DOUTORANDO EM CIÊNCIA POLÍTICA NA UNIVERSIDADE DE LISBOA
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