No artigo "Reforma
trabalhista é injustamente atacada" (9/1), publicado nesta Folha, Michel Temer afirma
que "a campanha eleitoral não pode pautar-se pelo desapego à
verdade". Parece-nos contraditória essa preocupação com a verdade em um
artigo recheado de mentiras.
Em primeiro lugar, não é verdade que o
projeto da reforma
trabalhista resultou de um "intenso diálogo entre as forças
produtivas da nação: empregados e empregadores". As centrais
sindicais propuseram ao então ministro do Trabalho que
fosse criada uma mesa de diálogo social tripartite para tratar da meia dúzia de
propostas sobre negociação coletiva que o governo nos apresentava, o que,
evidentemente, o governo não criou. Conversa não é diálogo social tripartite.
Assim mesmo, fizemos propostas para o projeto que o Executivo encaminharia ao
Congresso. Propostas que não foram incorporadas.
O relator
do projeto na Câmara, deputado Rogério Marinho
(PSDB-RN), usou a iniciativa do governo para produzir o projeto da mais
ampla mudança trabalhista e sindical da legislação laboral. Mais de três
centenas de mudanças, desconhecidas, foram aprovadas em poucos dias sem nenhum
debate. A nova legislação traduziu na íntegra as propostas patronais.
Por isso, em segundo lugar, é uma grande
mentira que nenhum direito trabalhista foi atingido. A reforma autorizou
estender as jornadas e criou até contrato com jornada de zero hora sem salário
(o intermitente);
facilitou e incentivou a contratação com menos direitos; liberou o trabalho
de mulheres grávidas em ambientes considerados insalubres; desobrigou o
pagamento do piso ou salário mínimo na remuneração por produção; autorizou a
homologação sem a assistência sindical, sendo que a maior parte das ações na
Justiça são justamente questionando as verbas
trabalhistas; eliminou a gratuidade
da Justiça do Trabalho e obrigou o trabalhador, no caso de perda da
ação, arcar com as custas do processo; determinou que acordos coletivos podem
prevalecer sobre a legislação, determinou o fim da ultratividade das cláusulas
de negociações coletivas; e alijou os sindicatos da proteção dos trabalhadores,
entre outras medidas nefastas.
Nada disso foi apresentado ou tratado com os representantes sindicais. Pelo contrário: desde o advento da reforma, fazemos reiteradas denúncias contra ela. E não fomos apenas nós, sindicalistas, que nos indignamos com as descaradas distorções da reforma. Ela também foi, e continua sendo, muito criticada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e por entidades de classe.
Em terceiro lugar, diferentemente do que
afirma Michel Temer, desde o advento da reforma o Brasil vive em uma
progressiva escalada de desemprego,
de trabalhos precários e de falta de fiscalização, além de um assombroso
rebaixamento da proteção laboral e social e aumento da miséria.
Durante os governos de Michel Temer (2016 a
2018) e de Jair
Bolsonaro (desde 2019), as taxas de desemprego bateram recordes,
atingindo 12,7% em 2017, 12,2% em 2018, 11,9% em 2019, 13,5% em 2020 e 12,6% em
2021, segundo o IBGE (em 2014, o índice era de 4,8%). No período, o número de
trabalhadores sem emprego formal (informais, desempregados e desalentados), ou
seja, desamparados do artigo 7° da Constituição Federal, saltou de 52,3 milhões
de pessoas para 61,3 milhões de brasileiros. Culminando com o desequilíbrio da
Previdência, o que mais tarde foi utilizado para a aprovação da reforma
previdenciária.
Em quarto lugar é mentira que
"promulgada a reforma trabalhista não houve nenhuma greve de
trabalhadores". Logo após a reforma, em 2018 o Dieese registrou 1.453
greves, sendo que 82% delas eram pela manutenção e contra o descumprimento de
direitos.
Em quinto lugar, soa até estranha a
insistência de Temer em relacionar a reforma, que foi na verdade um golpe de
destruição de direitos laborais, sociais e sindicais, à ideia
de modernização. Isso é um grande desapego à verdade. Se a ideia fosse
modernizar o país, primeiro deveria ser resultado do diálogo social tripartite
que tratasse de uma agenda transparente e pública; segundo, fortalecer a
negociação e suas instituições e instrumentos; terceiro, valorizar os
sindicatos como sujeitos coletivos de representação; e, quarto, ser uma mudança
correlacionada com um projeto de desenvolvimento produtivo para gerar empregos
de qualidade, crescimento dos salários, fortalecimento da demanda que sustenta
o crescimento econômico.
Por fim o ex-presidente deixa claro que não
entende o papel das entidades sindicais, quando ao final do seu artigo insinua
que o trabalhador é contra o empregador. Uma grande falácia. A chamada
"reforma trabalhista", além de tudo o que já foi dito pretendeu, por
meio de um "jabuti", enfraquecer a negociação coletiva através da
asfixia financeira das entidades sindicais, já que, ao criar a cortina de
fumaça da extinção da
contribuição sindical, aprovou dezenas de prejuízos nas relações de
trabalho.
Em 2022 queremos que o processo eleitoral debata
projetos para o país, para uma nação soberana e que é capaz de enfrentar seus
problemas e de superar desafios. Como centrais sindicais, apostamos na
mobilização social, no diálogo social e na negociação tripartite para pactuar
compromissos entre todos. Lutamos para que a construção do nosso futuro não se
paute em golpes e mentiras.
Sérgio Nobre
Presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores)
Miguel Torres
Presidente da Força Sindical
Ricardo Patah
Presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores)
Adilson Araújo
Presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil)
Osvaldo Augusto de Barros
Presidente da NCST (Nova Central Sindical de Trabalhadores)
Antonio Neto
Presidente da CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros)
Edson Carneiro Índio
Secretário-geral da Intersindical (Central da Classe Trabalhadora)
José Gozze
Presidente da Pública, Central do Servidor
Nenhum comentário:
Postar um comentário