Folha de S. Paulo
Não dá para considerar que Barra Torres e
Bolsonaro estão em campos opostos
Alcançou grande repercussão a
carta do diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, cobrando de
Bolsonaro uma retratação diante de suspeitas infundadas a respeito de decisões
da agência sobre vacinas. Barra Torres vem se afastando do presidente, mas daí
a considerar que estão em campos opostos vai uma longa distância.
O comando da agência é uma posição estratégica para o agronegócio, esteio do atual governo. Pela Anvisa passam as análises de todos os agrotóxicos usados no Brasil. Vejamos o exemplo do paraquate, associado à incidência da doença de Parkinson em trabalhadores que o manipulam.
O processo que levou ao banimento do veneno
começara em 2017. Em setembro de 2020, ele foi, de fato, proibido, mas, dias
depois, a Anvisa aprovou o uso para quem tivesse estoques do produto. Um doce
para quem adivinhar quem propôs o relaxamento da norma, que agradou em cheio ao
agronegócio.
Agora que Bolsonaro derrete nas pesquisas,
outros tomam atitudes que contrariam o chefe. O comandante do Exército, Paulo
Sérgio de Oliveira, determinou
a vacinação contra a Covid para que militares retornem ao trabalho presencial.
E proibiu que divulguem notícias falsas em redes sociais. Oliveira foi quem
poupou o general Pazuello de punição quando este participou de um ato com
Bolsonaro, em evidente transgressão disciplinar.
Outro exemplo é o ex-ministro da Defesa,
Fernando Azevedo e Silva, que toma ares de democrata ao assumir cargo no TSE. É
o mesmo que celebra o golpe de 1964 e que jogou dinheiro público no lixo
ao autorizar
a produção de cloroquina no laboratório do Exército.
São movimentos oportunistas, típico
"reposicionamento de marca" de uma parcela dos militares. Bolsonaro
não serve mais como instrumento de seu projeto de poder e, ao que parece, eles
irão buscar alternativas. Isso não os torna menos golpistas nem anula o fato,
negativo em todos os sentidos, de que estão fazendo política quando deveriam
estar nos quartéis.
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