terça-feira, 26 de abril de 2022

Joel Pinheiro da Fonseca: Com Musk, o que será do Twitter?

Folha de S. Paulo  

Não sabemos se a rede vai melhorar ou piorar; não custa nada pagar para ver

Tem gente preocupada com a compra do Twitter por Elon Musk, o empresário mais rico do mundo. Muitos já anunciaram sua saída da plataforma. Mas justo agora que a festa vai começar?

O receio é que Musk libere a manifestação de toda e qualquer opinião na rede —inclusive nazismo, racismo, negacionismo. E talvez até, horror dos horrores, permita a volta de Donald Trump. Já imaginou se o Twitter virar uma rede tóxica, cheia de ódio, na qual é impossível discutir civilizadamente? Se isso te causa receio, você provavelmente não é usuário, pois já é exatamente assim.

O Twitter reúne o maior número de intelectuais, jornalistas e acadêmicos. Geopolítica do Leste europeu, história medieval, arte africana, biologia molecular; há especialistas em todos esses temas para te informar e até trocar ideias. É maravilhoso. Ao mesmo tempo, é disparado a rede social mais tóxica e desagradável.

É impossível ter uma conversa ou mesmo partilhar alguma experiência do dia a dia sem ser acossado por uma legião de mal-educados, interpretando suas palavras da pior maneira possível, ostentando uma indignação constante para ganhar alguns seguidores às suas custas. Deboche, xingamento, maledicências; o ruído é constante. Linchamentos virtuais e cancelamentos são parte do que deixa o Twitter tão inóspito à discussão de ideias.

Dá para piorar? Sempre dá. Talvez Musk só intensifique esses problemas, tornando o Twitter completamente insuportável. Se sobrar apenas a briga de gangues enraivecidas, perderá membros. É um processo já em andamento. No início de abril, o New York Times mudou sua política no Twitter, instruindo seus jornalistas que fiquem menos tempo na rede, citando inclusive os frequentes ataques e assédios.
Eu acredito que banir de uma rede opiniões extremistas e gravemente ofensivas —como racismo e nazismo— seja uma boa política, assim como informações falsas que coloquem a vida humana em risco.

Não sei, contudo, se as restrições atuais, que Musk quer liberalizar, têm tido sucesso em reduzir extremismo e negacionismo na rede. Parece-me que não. E como usuário, as interações tóxicas, a má-fé generalizada e os ataques pessoais são muito mais prejudiciais à livre discussão do que erros e acertos em limitar ou não certas opiniões extremistas.
Esse problema é agravado por contas inautênticas que inflam as militâncias e estão ali só para ofender. "Se nosso lance pelo Twitter for bem sucedido, vamos acabar com os spam bots [contas automatizadas] ou morrer tentando! E autenticar todos os humanos reais."

Foi o que Musk prometeu. Saber que do outro lado da tela há uma pessoa real e não um robô ou um militante que controla centenas de contas espúrias seria um grande progresso.
Hoje é comum um perfil ser banido sem ter a menor ideia do porquê e sem poder recorrer. E os algoritmos que nos oferecem conteúdos seguem uma verdadeira caixa preta. Musk diz que vai aumentar a transparência. Não se fará grande diferença, mas mal não fará.
Na minha rede ideal, a limitação seria menos das opiniões e mais da conduta: xingamentos, ataques pessoais, grosserias, tudo isso seria banido. Não tenho os bilhões para realizar esse sonho. O que se considera aqui é uma rede com mais liberdade de opinião, inclusive para o mal, mas também com mais transparência na moderação e menos perfis espúrios.

Se essa for a troca, estou dentro. Não sabemos se, com Musk, o Twitter vai melhorar ou piorar. Não custa nada pagar para ver. Não delete sua conta ainda.

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